Amílcar Cabral
A arma da teoria

Carlos Comitini


Capítulo III - Assassinato de Amílcar Cabral


capa

O despacho da agência francesa de notícias AFP dizia, às 17 horas do dia 21 de janeiro de 1973:

21.1.

BULETIN ASSASSINAT CABRAL

M. SEKOU TOURE, PRESIDENT DE LA REPUBLIQUE DE GUINEE A ANNONCE CET APRES MIDI QUE M. AMÍLCAR CABRAL, SECRETAIRE GENERAL DU PARTI AFRICAIN DE L'INDEPENDANCE POUR LA GUINEE BISSAO ET LES ILES DU CAP VERT (PAIGC) "A ETE LACHEMENT ET HORRIBLEMENT ASSASSINE HIER, SAMEDI, A 22.30, DEVANT SA PROPRE MAISON, PAR LES MAINS EMPOISONNEES DE L'IMPERIALISME ET DU COLONIALISME PORTUGUAIS
FIN AFP

Sábado, 20 de janeiro, às 20 horas, o PAIGC tem uma reunião com uma delegação da FRELIMO (Frente de Libertação de Moçambique) dirigida pelo presidente deste movimento, Samora Machel. O motivo do encontro foi intercambiar pontos de vista sobre a forma de coordenar o acionar comum contra o colonialismo português.

Após a reunião, Amílcar Cabral segue para uma recepção na embaixada da Polônia. As 22 horas e 15 minutos, deixa o lugar e dirige-se a seu domicílio, situado a 4 km da embaixada, chegando aí às 22.30 hs. Tudo está em calma dentro da casa. Ana, a esposa do líder, encontra-se na sala com seus filhos. O Secretário-Geral do PAIGC estaciona sua viatura. No momento de entrar na casa é assaltado por um grupo de nacionalistas. Amílcar luta desesperadamente até que é assassinado por Inocêncio Kani(1) Seu adjunto, Aristides Pereira, e outros quatro que o acompanhavam são amarrados e transferidos a bordo de uma lancha.

Consumado o crime, Inocêncio Kani liga por telefone ao embaixador de Cuba, Oscar Oramos Oliva, informando-o que seu amigo Amílcar teve um problema e solicitando-lhe que o assista. A casa de Oliva situava-se a 300 metros de onde estava se consumando o assassinato e, como este tinha ouvido a detonação de disparos, comunica-se, urgentemente, com o Presidente da República da Guiné, Sekou Touré.

Este, por sua vez, entra em contato telefônico com a direção do Porto e dá a ordem de interditar todos os navios, e nesse momento foi informado de que duas lanchas do PAIGC tinham recebido autorização para deixar o Porto, em horas da manhã.

Destes mesmos veículos desembarcariam logo em Conakry os assassinos de Amílcar e os combatentes do PAIGC, sequestrados por eles.

OS ASSASSINOS

Os criminosos acabaram com a vida de Amílcar, mas horas após ter sido consumado o bárbaro assassinato foram capturados. Um dos depoimentos mais importantes foi feito pelo organizador do atentado, Ioda Nagbogna, conhecido pelo codinome de Batia.

Este confessou que as autoridades portuguesas tinham-lhe prometido: "Portugal estava prestes a dar aos negros da Guiné-Bissau a independência, com a condição de que: o PAIGC seja exterminado; todos os caboverdeanos sejam excluídos de todo movimento nacionalista pois Portugal pretende conservar as ilhas de Cabo Verde, que constituem, para ele e seus aliados, uma base estratégica de importância capital". Os guineenses de Bissau deveriam desprender-se de todos os caboverdeanos pois Portugal “constituiria um governo” nas ilhas de Cabo Verde e as suas forças militares estacionadas aí dariam toda cooperação "aos negros da Guiné-Bissau para assegurar-lhes a proteção".

Outro, entre os detidos, Lansana Bang, declarou, inclusive, que "os imperialistas preparavam um plano de agressão contra a República de Guiné, Tanzânia e Zâmbia". Dentro desse esquema eles deviam fomentar desordens dentro dos países citados a favor da ação subversiva e tinham que infiltrar-se no PAIGC, FRELIMO e MPLA.

Tudo isto para quê? Os colonialistas poderiam assassinar Amílcar Cabral ou Eduardo Mondlane, mas nunca conseguiriam acabar com os povos de Moçambique, Angola, São Tomé e Príncipe, Cabo Verde e Guiné-Bissau; povos em cujas veias corre o sangue que antes de mais nada já tinha ganho a liberdade. E a prova disso é o seguinte:


Notas de rodapé:

(1) I. Kani tinha sido comandante da marinha do PAIGC, afastado do cargo por faltas graves. (retornar ao texto)

Inclusão: 08/05/2020