O Proletariado Luta, a Burguesia Conclui uma Aliança com o Governo

J. V. Stálin

17 de Março de 1907


Primeira Edição: “Dro” (“O Tempo), n.° 6. 17 de março de 1907.
Fonte: J.V. Stálin – Obras – 2º vol., pág: 30-34, Editorial Vitória, 1952 – traduzida da 2ª edição italiana G. V. Stalin - "Opere Complete", vol. 2 - Edizioni Rinascita, Roma, 1951.
Tradução: Editorial Vitória
Transcrição: Partido Comunista Revolucionário
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Fernando A. S. Araújo
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capa

“Diferentemente da burguesia francesa de 1789, a burguesia prussiana... caíra ao nível de uma espécie de casta... desde o início era propensa à traição ao povo e para o compromisso com o representante coroado da velha sociedade”.

Assim escrevia Carlos Marx a propósito dos liberais prussianos.

E, de fato, mal a revolução se havia desenvolvido seriamente e já os liberais alemães entravam numa transação com o “poder supremo”. E bem depressa concluíam essa transação e, então, juntamente com o governo, mobilizavam-se contra os operários e os camponeses. É notável o modo como C. Marx desmascarou com palavras cáusticas, e acertando no alvo, essa duplicidade dos liberais :

“Sem fé em si própria, sem fé no povo, raivosa das camadas superiores, trêmula frente às camadas inferiores, egoísta para com umas e outras e consciente do próprio egoísmo, revolucionária com os conservadores, conservadora com os revolucionários, desconfiada das próprias palavras de ordem,... medrosa mas aproveitadora do furacão mundial — privada de qualquer energia, completa e vulgarmente plagiária, sem nenhuma originalidade, original em sua vulgaridade — mercadora de seus próprios desejos, sem iniciativa,... sem vocação histórica universal, exatamente como um velho amaldiçoado... sem olhos, sem orelhas, sem dentes, sem nada, assim se encontrou no leme do estado prussiano a burguesia prussiana depois da revolução de março” (vide A Nova Gazeta Renana)(1).

Entre nós, no curso da revolução russa, acontece algo de semelhante.

O fato é que também a nossa burguesia distingue-se da burguesia francesa de 1789. A nossa burguesia liberal, mais rápida e claramente ainda que a burguesia alemã, declarou que “está disposta a entrar em acordo com o poder supremo” contra os operários e os camponeses. O partido da burguesia liberal, os chamados cadetes, há muito tempo começaram, atrás das costas do povo, a efetuar negociações secretas com Stolípin. Que objetivo perseguem essas negociações, que é que têm para discutir os cadetes com o ministro “dos processos sumários”, se na realidade eles não traem os interesses do povo? A esses respeito, não há muito os jornais franceses e ingleses escreveram que o governo e os cadetes estão concertando uma aliança para sufocar a revolução. As condições dessa aliança secreta são as seguintes: os cadetes devem renunciar às reivindicações que lançam como partido de oposição; em compensação, o governo dará aos cadetes algum posto ministerial. Os cadetes ofenderam-se; isso não é verdade, dizem. Mas com efeito descobriu-se que essa, ao que se verifica, é a verdade; com efeito, descobriu-se que os cadetes concluíram uma aliança com as direitas e com o governo.

Que significam as últimas votações à Duma, senão que os cadetes concluíram uma aliança com o governo? Recordai-vos dos fatos. Os social-democratas apresentam a proposta de criar uma comissão de assistência aos camponeses atingidos pela penúria. Querem eles que do trabalho de socorro aos famintos, além dos deputados e dos burocratas, ocupe-se o próprio povo e que este desmascare os “feitos heroicos” dos Gurko-Lidval(2). Tudo isso está bem, é desejável porque reforça os liames dos deputados com o povo, dá um caráter consciente ao descontentamento surdo do povo. É claro que quem quer que servisse realmente aos interesses do povo teria infalivelmente apoiado a proposta dos social-democratas, como meio útil ao povo. E então, que fizeram os cadetes, apoiaram talvez os social-democratas? Não! Negaram-se a examinar, unânimes, juntamente com os outubristas(3) e as centúrias negras, a proposta dos social-democratas. — A aplicação de sua proposta suscitaria um movimento popular, por isso é prejudicial — respondeu aos social-democratas um chefe dos cadetes, Essen (vide Párus (4), n.° 24). — Estou inteiramente de acordo convosco, senhores cadetes, vós tendes razão — assim Stolípin deu aos cadetes o reconhecimento que lhes cabia (ibidem). Resultado : somente os social-revolucionários, os social-populistas e a maioria dos trudovikí apoiaram os social-democratas.

A Duma dividiu-se assim em dois campos: o campo dos inimigos do movimento popular e o campo dos que apoiam o movimento popular. Entre os primeiros: as centúrias negras, os outubristas, Stolípin, os cadetes e outros. Entre os segundos': os social-democratas, os social-revolucionários, os social-populistas, a maioria dos trudovikí e outros.

Que significa isso senão que os cadetes concertaram uma aliança com o governo?

Como se vê, justificou-se a tática dos bolcheviques, que semeia a desconfiança contra os cadetes, traidores do povo, e convida à luta contra eles.

Mas não basta. O fato é que os boatos lembrados, espalhados nos jornais franceses e ingleses, têm plena confirmação. Os jornais da capital, nos últimos dias, comunicam de “fonte segura” que a transação entre os cadetes e o governo já se efetuou. E, vejam só as condições dessa transação, ao que se verifica, são ilustradas em todos os mínimos pormenores. É verdade que os cadetes o negam, porém se trata de farisaísmo e nada mais da parte deles. Escutai:

“De fonte bastante segura o Sevódnia(5) informa que o discurso pronunciado ontem por Stolípin na Duma de Estado não foi absolutamente uma surpresa para os cadetes e os outubristas. Tinha havido a esses respeito negociações preliminares durante um dia inteiro, entre o presidente do conselho Kutler e... e Fiódorov, o qual representava o centro da direita. O acordo decisivo entre essas personalidades realizou-se na redação do Slovo(6), aonde se preparava para ir também o conde Witte... Nas suas linhas gerais, o acordo reduz-se a isto

  1. — os cadetes rompem abertamente todos os laços com os partidos de esquerda e tomarão na Duma uma posição estritamente centrista;
  2. — renunciam a uma parte do seu programa agrário, tornando-o mais próximo ao programa dos outubristas;
  3. — temporariamente não insistem na igualdade de direitos entre as nacionalidades;
  4. — apoiam o empréstimo externo.

Em troca, promete-se aos cadetes:

  1. — imediata legalização do partido cadete;
  2. — o oferecimento das pastas ministeriais da redistribuição fundiária e da agricultura, da instrução pública, da indústria e comércio e da justiça;
  3. — anistia parcial;
  4. — apoio ao projeto de lei cadete sobre a abolição dos “tribunais de campo” (vide Párus, n.° 25).

Assim estão as coisas.

Enquanto o povo luta, enquanto os operários e os camponeses derramam seu sangue para derrubar a reação, os cadetes concluem uma aliança com essa mesma reação para sufocar a revolução popular!

Eis o que são os cadetes!

Eis, ao que se verifica, a razão pela qual querem “salvaguardar” a Duma!

Eis por que não apoiaram o projeto dos social-democratas no sentido de criar uma comissão de assistência aos atingidos pela penúria!

Assim cai a tese dos mencheviques sobre o democratismo dos cadetes.

Assim cai a tática menchevique do apoio aos cadetes: depois de tudo quanto aconteceu, apoiar os cadetes significa apoiar o governo!

É justificada a opinião dos bolcheviques sobre a necessidade, num momento grave, de apoiar somente os representantes conscientes dos camponeses, como, por exemplo, os social-revolucionários e outros.

É claro que deveremos também apoiá-los contra os cadetes.

Ou talvez pensem os mencheviques apoiar também no futuro os cadetes?

Artigo não assinado.


Notas de rodapé:

(1) Do artigo Die Bourgeoisie und die Kontrerevolution, aparecido em 15 de dezembro de 1848 na Neue Rheinische Zeitung (Gesamtausgabe, I, 7, pág. 495). A Neue Rheinische Zeitung (Nova Gazeta Renana) publicou-se em Colônia de 1.° de junho de 1848 a 19 de maio de 1849. O jornal era dirigido por Marx e Engels. (retornar ao texto)

(2) Gurko, subsecretário do interior, esteve implicado, com o fornecedor Lidval, nas malversações e especulações efetuadas por ocasião do abastecimento de trigo aos governos afetados pela penúria. O sensacional processo a que deu lugar essa ruidosa negociata, não teve, para o alto funcionário tzarista, outra consequência senão o afastamento do posto. (retornar ao texto)

(3) Membros da “União do 17 de outubro”, constituída em novembro de 1905, em seguida ao manifesto imperial que anunciava a convocação da Duma. A “União”, que apoiava o regime de Stolípin, representava os interesses dos grandes ca­pitalistas e do latifúndio. (retornar ao texto)

(4) Párus (A vela), diário, órgão dos cadetes que se publicou em Moscou, em 1907. (retornar ao texto)

(5) Sevódnia (Hoje), vespertino burguês, de tipo escandaloso; publicou-se em Petersburgo de 1906 a 1908. (retornar ao texto)

(6) Slovo (A palavra), jornal diário que iniciou as suas publicações em dezembro de 1904. De outubro de 1905 a julho de 1906 foi o órgão do partido dos outubristas. (retornar ao texto)

Transcrição
pcr
Inclusão 11/10/2019