A Luta de Classes

J. V. Stálin

14 de Novembro de 1906


Primeira Edição: "Kavkazki Kabótchi Listok" (Folha Operária do Cáucaso), n.° 1, 20 de novembro de 1905. Artigo não assinado.
Fonte: J.V. Stálin – Obras – 1º vol., pg. 182 a 184. Editorial Vitória, 1954 – traduzida da edição italiana da Obras Completas de Stálin publicada pela Edizioni Rinascita, Roma, 1949.
Tradução: Editorial Vitória
Transcrição: Partido Comunista Revolucionário
HTML:
Fernando A. S. Araújo.
Direitos de Reprodução: A cópia ou distribuição deste documento é livre e indefinidamente garantida nos termos da GNU Free Documentation License.

Do jornal "Akliali Droeba" (Tempos Novos)[N88], n.° 1. 14 de novembro de 1906.
Assinado: Ko...

A união da burguesia pode ser abalada somente, pela união do proletariado.
Carlos Marx

capa

A vida moderna é extraordinariamente complexa! É todo um mosaico de classes e grupos diferentes: grande, média e pequena burguesia; grandes, médios e pequenos senhores feudais; aprendizes, serventes e operários qualificados de fábrica e oficina; alto, médio e baixo clero; alta, média e pequena burocracia; intelectuais de vários gêneros e outros grupos semelhantes: eis o quadro variegado que apresenta a nossa vida!

Mas também é claro que quanto mais a vida se desenvolve, tanto mais evidentes se afirmam, nessa vida complexa, duas tendências fundamentais, tanto mais nitidamente essa vida complexa divide-se em dois campos opostos: o campo dos capitalistas e o campo dos proletários. As greves econômicas de janeiro (1905) mostraram claramente que a Rússia se divide efetivamente em dois campos. As greves de novembro em Petersburgo (1905) e as greves de junho-julho em toda a Rússia (1906) fizeram chocar-se uns contra os outros os líderes de um e do outro campo, e com isso revelaram até o fundo as atuais contradições de classe. A partir de então o campo dos capitalistas não dorme, realizam-se sem descanso nesse campo preparativos febris: criam-se uniões locais de capitalistas, as uniões locais unem-se em uniões regionais, as uniões regionais em uniões russas, fundam-se caixas  e órgãos  de  imprensa, convocam-se congressos e convênios de capitalistas de toda a Rússia.

Os capitalistas organizam-se assim em classe à parte com o objetivo de frear o proletariado.

Por outro lado, não dorme tampouco o campo dos proletários. Também aqui se fazem preparativos febris para a luta iminente. Não obstante as perseguições da reação, fundam-se também aqui os sindicatos locais, estes se unem em uniões regionais, fundam-se caixas sindicais, desenvolve-se a imprensa sindical, convocam-se congressos e convenções dos sindicatos operários de toda a Rússia...

Como se vê, também os proletários se organizam em classe à parte, com o objetivo de frear a exploração.

Houve um tempo em que "o silêncio e a calma" reinavam na vida. Então não se viam sequer essas classes com suas organizações de classe. Compreende-se que também então havia luta, mas essa luta possuia um caráter local e não geral de classe: os capitalistas não possuíam as suas uniões e cada um deles era obrigado a submeter os "seus" operários com suas próprias forças. Tampouco os operários possuíam essas uniões e por conseguinte os operários de cada estabelecimento eram obrigados a contar com suas próprias forças. É verdade que as organizações social-democratas locais exerciam a direção da luta econômica dos operários, mas todos convirão em que essa direção era débil e intermitente: as organizações social-democratas encontravam dificuldade para desenvolver até mesmo os assuntos do Partido.

As greves econômicas de janeiro assinalaram, porém, uma virada. Os capitalistas puseram-se a agir e começaram a organizar uniões locais. As ligas de capitalistas de Petersburgo, Moscou, Varsóvia, Riga e de outras cidades, surgiram em seguida às greves de janeiro. No que se refere aos capitalistas da indústria do petróleo, do manganês, do carvão e do açúcar, estes transformaram suas velhas e "pacíficas" uniões, em uniões de "luta" e começaram a reforçar suas posições. Todavia, os capitalistas não se contentaram com isso. Decidiram constituir uma união para toda a Rússia e em março de 1905, por iniciativa de Morozov, reuniram-se num congresso geral em Moscou. Esse foi o primeiro congresso dos capitalistas de toda a Rússia. No congresso concluiram um acordo com base no qual obrigaram-se a não fazer concessões aos operários sem acordo recíproco e, em caso "extremo'', a proclamar o lockout(1). Desde esse momento começa uma luta feroz dos capitalistas contra os proletários. Desde esse momento começa um período de grandes lockouts na Rússia. Para uma luta séria era necessária uma união séria; e eis que os capitalistas decidiram reunir-se mais uma vez para criar uma união mais estreita. Assim, em Moscou, três meses após o primeiro congresso (em julho de 1905), foi convocado o segundo congresso dos capitalistas de toda a Rússia. Neste, confirmaram mais uma vez as resoluções do primeiro congresso, reconheceram mais uma vez a necessidade dos lockouts e elegeram um comitê, que devia elaborar os estatutos e preparar a convocação de um novo congresso. Nesse ínterim, as resoluções do primeiro congresso eram postas em prática. Os fatos demonstraram que os capitalistas aplicam com grande precisão essas resoluções. Se vos lembrardes dos lockouts proclamados pelos capitalistas em Riga, Varsóvia, Odessa, Moscou e em outras grandes cidades, se vos lembrardes das jornadas de novembro em Petersburgo, quando setenta e dois capitalistas ameaçaram com um lockout feroz duzentos mil operários de Petersburgo. compreendereis facilmente que  força poderosa representa a união russa dos capitalistas e com quanta exatidão aplicam eles as decisões de sua união. Em seguida, após o segundo congresso,  os capitalistas organizaram ainda um outro congresso (em janeiro de 1906) e enfim, em abril deste ano, já se realizou o congresso constitutivo da organização dos capitalistas de toda a Rússia, no qual foi aprovado um estatuto único e eleito um bureau central. Segundo as informações dos jornais, esse estatuto já foi aprovado pelo governo.

Não há dúvida, por isso, de que a burguesia da Rússia já se organizou em classe à parte, de que possui suas organizações locais, regionais e central, podendo mobilizar, segundo um plano único, os capitalistas de toda a Rússia.

A diminuição do salário, o prolongamento da jornada de trabalho, o debilitamento do proletariado e a destruição de suas organizações: eis o objetivo da união geral dos capitalistas.

No mesmo período, crescia e desenvolvia-se o movimento sindical dos operários. As greves econômicas de janeiro (1905) exerceram também aqui sua influência. O movimento tomou um caráter de massa, suas exigências estenderam-se e com o passar do tempo tornou-se claro que os organismos social-democratas não podiam dirigir, ao mesmo tempo, o trabalho partidário e o trabalho sindical. Era necessária uma certa divisão do trabalho entre o Partido e os sindicatos. Era necessário que os organismos partidários dirigissem o trabalho partidário e os sindicatos dirigissem o trabalho sindical. E assim teve início a organização dos sindicatos em Moscou, Petersburgo, Varsóvia, Riga, Khárkov, Tíflis: por toda a parte fundavam-se sindicatos. É verdade que a reação criava empecilhos a essa atividade, mas, não obstante, as exigências do movimento prevaleciam e os sindicatos se multiplicavam. Logo, aos sindicatos locais seguiram-se os sindicatos provinciais e por fim chegou-se, em setembro do ano passado, à convocação da conferência dos sindicatos de toda a Rússia. Foi a primeira conferência dos sindicatos operários. O resultado dessa conferência foi, entre outras coisas, que ela pôs em contato entre si os sindicatos das várias cidades e elegeu por fim um bureau central que devia preparar a convocação do congresso geral dos sindicatos. Chegaram as jornadas de outubro e os sindicatos redobraram seus efetivos. Os sindicatos locais e, por fim, os provinciais, desenvolviam-se dia a dia. É verdade que a "derrota de dezembro" retardou sensivelmente a obra de criação dos sindicatos, mas em seguida o movimento sindical refez-se de novo e as coisas puseram-se no bom caminho, tanto assim que em fevereiro deste ano foi convocada a segunda conferência dos sindicatos, muito mais numerosa e completa que a primeira conferência. A conferência reconheceu a necessidade de centros locais, regionais e de um centro russo, elegeu a "comissão organizadora" para a convocação do próximo congresso russo e aprovou resoluções adequadas sobre as questões urgentes do movimento sindical.

Não há dúvida, por isso, de que, não obstante a sanha da reação, também o proletariado se organiza em classe à parte, reforça sem descanso suas organizações sindicais, locais, provinciais e central, e sem descanso esforça-se por unir contra os capitalistas seus inúmeros irmãos.

O aumento dos salários, a redução da jornada de trabalho, a melhoria das condições de trabalho, a atenuação da exploração e a destruição das uniões dos capitalistas: esse é o objetivo dos sindicatos operários.

Assim, a sociedade moderna se divide em dois grandes campos, cada um dos quais se organiza em classe à parte; a luta de classes que lavra entre elas se aprofunda e intensifica-se dia a dia e em torno desses dois campos reúnem-se todos os outros grupos.

Marx dizia que toda luta de classes é uma luta política. Isso significa que se hoje os proletários e os capitalistas travam entre si uma luta econômica, amanhã serão obrigados também a travar a luta política e a defender assim com uma luta dupla seus interesses de classe. Os capitalistas têm os seus interesses particulares de corporação. Suas organizações econômicas existem precisamente para salvaguardar esses interesses. Mas além dos interesses particulares de corporação eles têm também interesses gerais de classe, que consistem no fortalecimento do capitalismo. E, justamente por causa desses interesses gerais, têm necessidade da luta política e de um partido político. Os capitalistas da Rússia resolveram muito simplesmente esse problema: constataram que o único partido que "direta e intrepidamente" defende seus interesses é o Partido dos Outubristas, e por isso decidiram agrupar-se em torno desse Partido e submeter-se à sua direção ideológica. A partir de então os capitalistas movem a sua luta política sob a direção ideológica desse Partido; com seu apoio exercem influência sobre o governo atual (que dissolve os sindicatos operários e, ao inverso, apressa-se em reconhecer as uniões dos capitalistas), levam seus candidatos à Duma, etc, etc.

Assim, luta econômica mediante as uniões, luta geral política sob a direção ideológica do Partido dos Outubristas: eis que forma assume hoje a luta de classe da grande burguesia.

Por outro lado, fenômenos idênticos notam-se hoje também no movimento de classe do proletariado. Para a defesa dos interesses de corporação dos proletários, criam-se os sindicatos, que lutam pelo aumento dos salários e pela redução da jornada de trabalho, etc. Mas, além dos interesses de corporação, os proletários têm também interesses gerais de classe, que consistem na revolução socialista e na instauração do socialismo. É impossível realizar a revolução socialista enquanto o proletariado não conquistar o domínio político como classe unida e indivisível. De modo que também para o proletariado são indispensáveis a luta política e o partido, político, que exercerá a direção ideológica do seu movimento político. Certamente, os sindicatos operários são, na sua maioria, sem partido e neutros. Mas, isso apenas significa que só são independentes de partido no campo financeiro e orgânico; isto é, eles têm caixas próprias, têm órgãos de direção próprios, realizam congressos próprios e formalmente não são obrigadas a submeter-se às decisões dos partidos políticos. No que se refere, porém, à dependência ideológica dos sindicatos, em relação a este ou àquele partido político, essa dependência deve existir sem reservas e não pode deixar de existir, mesmo porque, além de tudo o mais, nos sindicatos entram membros de diversos partidos, que mevitàvelrnente para ali levarão suas convicções políticas. É claro que se o proletariado não pode abster-se da luta política, não pode tampouco abster-se da direção ideológica deste ou daquele partido político. Ao contrário, deve ele mesmo procurar o partido que dignamente guiará seus sindicatos à "terra prometida", ao socialismo. Mas o proletariado deve estar em guarda e agir com cautela. Deve examinar atentamente a bagagem ideológica dos partidos políticos e aceitar livremente a direção ideológica daquele partido que defender corajosa e coerentemente os seus interesses de classe, que sustentar bem alta a bandeira vermelha do proletariado e o conduzir ousadamente ao poder político, à revolução socialista.

Essa função foi até agora preenchida pelo Partido Operário Social-Democrata da Rússia e por conseguinte cabe aos sindicatos reconhecer sua direção ideológica.

Como se sabe, justamente isso é o que acontece na realidade.

Assim, batalhas econômicas com o auxílio dos sindicatos; ataques políticos sob a direção ideológica da social-democracia: eis a forma que tomou hoje a luta de classe do proletariado.

Não há dúvida de que a luta de classes lavrará cada vez mais violenta. Constitui tarefa do proletariado introduzir na sua luta um sistema e o espírito de organização. Para fazer isso, porém, é necessário reforçar os sindicatos e uni-los entre si. Nesse sentido, um grande serviço poderia prestar o congresso dos sindicatos de toda a Rússia. Não nos é necessário hoje um "congresso operário sem partido", mas um congresso de sindicatos operários, para que o proletariado se organize em classe unida e indivisível. O proletariado deve ao mesmo tempo esforçar-se para consolidar e fortalecer por todos os meios o partido que exercer a direção ideológica e política da sua luta de classe.


Notas de rodapé:

(1) "Lockout" é a greve dos patrões: os patrões fecham intencionalmente as fábricas para quebrar a resistência dos operários e sufocar as suas reivindicações. (retornar ao texto)

Notas de fim de tomo:

[N88] Akhali Droeba (Tempos Novos), diário sindical legal; publicou-se semanalmente em língua georgiana, em Tíflis, de 14 de novembro de 1906 a 8 de janeiro de 1907. O jornal estava sob a direção de Stálin, Tskhakaia e Davitachvili. Foi suspenso por determinação do governador de Tíflis. (retornar ao texto)

pcr
Inclusão 31/12/2010