Elementos para a História do Movimento Operário Português

Francisco Martins Rodrigues


Primeira Edição: [Nota do autor em 2008] Este caderno contém uma reprodução integral e sem alterações de uns apontamentos feitos na cadeia de Caxias, no final dos anos 60, sob o título "Elementos para a história do movimento operário e do movimento comunista em Portugal". Passados para o exterior, foram reproduzidos em duplicador (antes do 25 de Abril, ao que se supõe) pelas edições José Gregório, e circularam desde então nos meios marxistas-leninistas. A sua intenção era servir fins didácticos, para dar noções elementares aos militantes jovens. Usados nas cadeias em cursos de formação dos presos. foram também estudados nos grupos marxistas-leninistas depois do 25 de Abril. Com naturais deficiências por terem sido feitos de memória, sem recurso a materiais de consulta, as informações que contêm são no entanto correctas no essencial. A sua leitura tem actualmente um interesse sobretudo histórico.

Fonte: Página Vermelha

Transcrição e HTML: Fernando A. S. Araújo.

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Elementos de História do Movimento Operário Português e do Partido Comunista

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Com o desenvolvimento do modo de produção capitalista em Portugal, surgiu e desenvolveu-se o proletariado, classe produtora que está reduzida a vender a sua força de trabalho como uma mercadoria. O proletariado é arrastado pela sua natureza de classe a tornar-se a força motriz da revolução socialista, derrubando a burguesia e exercendo a ditadura sobre ela, por meio de seu instrumento político, o Partido Comunista.

Os comunistas não podem pretender conduzir o proletariado à revolução e à conquista do poder se não conhecerem a sua história e a experiência por ele acumulada.

A história do movimento operário português pode dividir-se em seis períodos:

  1. formação do proletariado (1860-1910);
  2. a experiência anarquista (1910-1926);
  3. a resistência antifascista (1926-1940);
  4. o movimento da guerra e o seu declínio (1940-1955);
  5. a nova estrutura de proletariado e a degeneração reformista do Partido (1955-1966);
  6. o ressurgimento da corrente comunista; algumas lições do nosso movimento operário.

I - Formação do Proletariado - (1860-1910)

1 - Cerca de 1860, começa a desenhar-se, ao lado do artesanato tradicional, uma produção capitalista moderna. A partir de 1880, acentua-se o crescimento da burguesia industrial e surge uma classe operária nos setores dos têxteis, conservas, vidros, tabacos, transportes. Até ao fim do século, continua a crescer o proletariado fabril, que contudo não passava a casa das dezenas de milhar e se resumia às duas zonas industriais de Lisboa e Porto, isoladas num país camponês atrasado e dependente do imperialismo estrangeiro. O proletariado português era muito mais fraco que o dos países capitalistas avançados.

2 - A grande massa do proletariado, arrebanhada nos campos, vivia numa miséria e numa ignorância enormes, não tinha consciência dos seus interesses de classe, nem formas de defesa. Os patrões, como não encontravam uma resistência organizada, exploravam sem limites: jornadas de 12 a 14 horas, trabalho infantil, disciplina severa, castigos constantes, nenhuns cuidados com a segurança e a higiene. Nas “ilhas” e “pátios” operários grassava a tuberculose.

3 - De forma espaçada e irregular, o proletariado começa a resistir à exploração capitalista. Como os sindicatos não eram autorizados, formam-se as associações de socorros mútuos, onde os operários aprendem a organizar-se: em Lisboa distingue-se a Sociedade Promotora dos Melhoramentos das Classes Laboriosas. Estas associações tinham um caráter não-político e eram muitas vezes tuteladas por elementos burgueses (o general Sousa Brandão); mas nelas o proletariado começava a tomar consciência dos seus direitos.

4 - Já desde 1880 se registavam greves, apesar de proibidas. Nos anos de 1871-72 deram-se greves de certa importância (a “Pavorosa”) e há choques com a política. O motivo das greves era em geral a luta por maiores salários e contra os castigos. Começa a distinguir-se no proletariado de Lisboa os tipógrafos, os metalúrgicos, os portuários e os tabaqueiros pela sua combatividade. No Porto, o ambiente era de muito maior atraso e desorganização e raramente se davam greves.

Até ao fim do século o movimento grevista tende a crescer lentamente. Ao entrar no séc. XX, as greves eram já mais amplas e estendiam-se por vezes a ramos inteiros de indústria, mas dificilmente triunfavam; os operários não dispunham ainda de meios adequados de organização; além disso, os patrões respondiam à greve com o “lockout” (encerramento das fábricas) e a polícia intervinha com violência contra os grevistas.

Uma das maiores greves deste período é a dos operários de conservas de Setúbal e Algarve, em 1902-03(?)[sic], contra a mecanização da indústria, que provocava despedimentos em massa; há manifestações e choques com a tropa, provocando mortos.

5 - A acção de defesa económica faz surgir uma vanguarda do proletariado que compreende que a solução dos problemas da classe está na luta política. Em 1871, sob o efeito da agitação causada pela Comuna de Paris, o movimento operário dá um passo em frente: funda-se a associação “Fraternidade Operária” que começa a publicar o jornal “Pensamento Social” e que estabelece contacto com a AIT (Associação Internacional dos Trabalhadores). A “Fraternidade Operária”, que se manteve pouco tempo, era animada por elementos não-proletários, como José Fontana (empregado) e os intelectuais Antero, Oliveira Martins etc.; isto mostra, apesar dos progressos do movimento, a falta de independência política do proletariado.

6 - As ideias políticas que então dominavam os operários avançados de Lisboa (no Porto, o movimento operário quase não existia) eram as ideias de Proudhom e Bakunine apesar de já ter passado meio século sobre a publicação do “Manifesto Comunista” (1848). O proletariado português, muito recente, meio camponês e em grande parte artesanal, não tinha ainda uma experiência que lhe permitisse assimilar a teoria marxista da revolução; tal como aconteceu na segunda metade do séc. XIX com a classe operária da Rússia, Itália, Sul da França e Espanha os operários portugueses não estavam ideologicamente amadurecidos para o marxismo e eram influenciados pelo anarquismo.

7 - Depois de 1870, começa a debater-se a necessidade dum partido operário, mas a massa dos operários ativistas, dominados pelo anarquismo, via com desconfiança qualquer intervenção organizada na política. O partido socialista, criado em 1875, não tinha uma base proletária, era um pequeno partido de reformas, que acabou por se aproximar da monarquia e tornar-se reacionário.

8 - À medida que aumenta a propaganda republicana, surge uma forte corrente no proletariado avançado contra a formação dum partido operário pelo apoio ao partido republicano. Depois do Ultimato e das manifestações contra a Inglaterra e durante os 20 anos de luta pela República (19 - )[sic], os operários mais politizados enfileiraram no movimento republicano. O movimento operário legal (associações culturais, recreativas e de socorros mútuos, como a “Voz do Operário”, do .......... dos tabacos) é aproveitado para a propaganda da República. Muitos operários entram nas associações secretas (como a “Carbonária”) e participam em atentados e assaltos contra o poder monárquico. Quando da ditadura de João Franco (1908), os trabalhadores participam em violentas manifestações, de que resultam mortos. Finalmente, no 5 de Outubro de 1910, os operários tomam as armas, ao lado dos marinheiros e soldados, seguindo os políticos republicanos. Um episódio bem conhecido é o dos trabalhadores armados guardarem os bancos durante a revolução, a fim de garantirem a nova ordem estabelecida pela burguesia.

9 - Características deste período — O proletariado nasce e vai crescendo muito lentamente. No começo do séc. XX, as famílias operárias representam uns 8 a 10% da população. Grande parte do proletariado é de tipo artesanal, são raras as grandes fábricas.

Uma parte apreciável do proletariado de Lisboa começa a entrar na luta económica e a recorrer à greve com certa frequência. Contudo, a sua consciência política está ainda em embrião, e o proletariado é um apêndice da burguesia progressista, cuja direção política aceita. O proletariado não atingiu ainda a maioridade como classe.

II - A Experiência do Anarquismo (1960-1926)

1 — A República é a 2ª etapa da revolução burguesa em Portugal. A nova burguesia comercial - industrial e colonialista que crescia desde 1880 entra em choque com a burguesia intermédia (importadores-exportadores agentes do imperialismo inglês) e com a nobreza latifundiária que controlavam a marcha do capitalismo.

Depois de tomar o poder do Estado a burguesia amolda as instituições à medida dos seus interesses. O regime de democracia burguesa que triunfa em 1910 é o mais associado aos interesses do capitalismo numa fase de crescimento e de livre concorrência.

2 — O proletariado tem uma grande evolução no período da democracia burguesa e perde as ilusões que tinham posto nos dirigentes republicanos. As promessas demagógicas de melhor nível de vida para os trabalhadores (o “bacalhau a pataco”) não são cumpridas e o patronato não afrouxa a exploração. Quanto à “igualdade social” prometida pelos chefes republicanos, manifesta-se só em benefício da burguesia, que elimina os privilégios da nobreza e domina duramente a classe operária; apenas dois meses depois de 5 de Outubro já o governo republicano reprime uma greve em Lisboa por meio da polícia.

3 — A grande conquista conseguida pelo movimento operário sob a República é o direito de criar os seus sindicatos. A partir de 1910, os diversos setores operários, começam a criar os seus sindicados, num movimento que se estende a todo o país e em breve envolve dezenas de milhares de trabalhadores. A classe operária crescia, embora lentamente, desenvolviam-se as indústrias da cortiça, da alimentação, exploração mineira, transportes; no Sul, começa a formar-se um mercado proletário rural.

Com a fundação da UON (União Operária Nacional), em 1913, o movimento sindical ativa-se. Realizam-se assembleias e congressos dos vários ramos da indústria e congressos sindicais (Torres Novas, Coimbra, Covilhã, etc.) onde é discutida a situação da classe operária e a tática da luta económica. Os operários agrícolas criam também os seus sindicatos rurais. O proletariado ganha novos hábitos de organização e uma consciência nacional dos seus interesses económicos.

4 — A burguesia republicana, que durante a propaganda contra a monarquia, prometera o direito à greve, tentou depois negar essa conquista aos operários: o Congresso da República, reunido pela primeira vez em 1911, recusa-se por grande maioria a inscrever na Constituição o direito à greve (o Congresso tinha 2 deputados operários num total de 220 deputados); em 1912 é publicada uma lei reconhecendo o direito à greve mas pondo-lhe grandes restrições (proibia a greve ao pessoal do Estado; e a qualquer outros trabalhadores, “no caso de afectar a economia nacional”).

Mas o movimento operário, em ofensiva, obrigou a reconhecer o seu direito à greve. O movimento grevista atravessa uma fase brilhante e torna-se a principal forma de luta proletária contra a exploração, contribuindo para unir e educar a proletariado. As greves tornam-se regulares e chama à luta grandes massas trabalhadoras que até aí tinham estado adormecidas, sobretudo no Norte. Destacam-se pela sua combatividade os corticeiros, marítimos, vidreiros, trabalhadores rurais. Apoiadas na organização sindical, as greves começam a registar uma percentagem apreciável de vitórias.

5 — A greve geral de 1912 teve grande importância na união do proletariado. A greve iniciou-se entre os operários agrícolas do Alto Alentejo, que reclamavam maiores jornas. Reprimida pelas autoridades locais, ao serviço dos agrários, a greve alastrou-se a Évora (construção civil, empregados). A autoridade encerrou o sindicato de Évora e então a central sindical, em Lisboa, proclamou a greve geral de solidariedade; a greve não foi nacional, mas paralisou Lisboa e a Outra Banda.

A polícia reagiu assaltando a Casa Sindical onde estavam reunidos centenas de grevistas e prendendo-os a bordo de navios de guerra. No Montijo, os operários, atacados pela polícia, matam o administrador do conselho. Em Almada, onde a tropa proclama o estado de sítio, os grevistas incendeiam fábricas e assaltam quintas para arranjar comidas. Por fim, o governo recua, solta os operários presos e faz concessões. Esta greve vitoriosa teve grande influência no crescimento do movimento grevista nos anos seguintes.

8. A partir de 1916, com a entrada de Portugal na guerra mundial imperialista, para servir os interesses colonialistas da burguesia e o imperialismo inglês, a luta de classes do proletariado torna-se mais aguda e mais politizada. Os operários sindicalistas desenvolvem uma campanha de agitação contra a guerra, com comícios à porta dos quartéis, mostrando que os argumentos do governo da “defesa da civilização” mascaravam os apetites imperialistas da burguesia.

Em 1917, o movimento operário é reforçado com a criação da CGT (Confederação Geral do Trabalho) que substitui a UON. A CGT era uma verdadeira direção central dos sindicatos, que torna possível uma maior coordenação destes. O jornal da CGT “A Batalha” une e consciencializa dezenas de milhares de operários.

7. Entretanto, crescia a agitação política. Em Dezembro de 1917, é instaurada a ditadura de Sidónio Pais, contando com a neutralidade dos sindicatos, que se deixaram iludir com as promessas de abandonar a guerra imperialista e de estabilizar a situação económica. Quando Sidónio se define como um ditador fascista e começa a fazer prisões de milhares de trabalhadores, a CGT organiza uma campanha e decreta greve geral sobre a palavra de ordem “Fora o Sidónio”. A greve é desbaratada pela polícia mas um mês depois o ditador é morto a tiro num atentado (Dez. 1918). Em 1919, os trabalhadores pegam em armas para esmagar a revolta monárquica (escalada de Monsanto), vencendo a indecisão das autoridades.

Espalhava-se a agitação e o entusiasmo causados pela grande revolução russa, que mostrava na prática a possibilidade de derrubar a burguesia e estabelecer um governo dos trabalhadores. Os sindicatos aprovam resoluções recusando-se a carregar material contra a Rússia Bolchevista.

Todos estes acontecimentos elevam a consciência do proletariado e chamam-no a intervir na luta política. Devido a isso, ativa-se a luta de tendências no movimento operário.

8 — As ideias que inspiravam os sindicatos, a CGT e todos os operários avançados, eram as ideias anarquistas. O socialismo-reformista desacreditara-se já antes de 1910 com uma linha de colaboração com a burguesia. O marxismo continuou a ser ignorado até muito tarde.

A corrente anarco-sindicalista, que orientava a CGT, era própria dum proletariado jovem e inexperiente na luta de classes. Esta corrente acreditava no derrubamento da burguesia por meio da greve geral e de ações terroristas desorganizadas, e punha portanto a sua esperança no movimento sindical e grevista. Como desconhecia a necessidade duma ditadura do proletariado prolongada para a construção do socialismo, não compreendia a necessidade duma direção política proletária centralizada, dum Estado-maior proletário (o Partido Comunista), resistia à disciplina de classe, não enquadrava as ações técnicas num plano estratégico para a conquista do poder.

Apesar da vitalidade da CGT, que chegou a agrupar mais de 100 mil trabalhadores cerca de 1922, o movimento era enfraquecido pela falta duma plataforma política clara, os dirigentes sindicais cediam à demagogia e punham os interesses económicos de cada setor profissional à frente dos interesses gerais da classe; desgastavam-se energias sem um plano de batalha preciso e os trabalhadores iam-se cansando.

9 — Em 1921, é fundado em Lisboa o Partido Comunista. A revolução russa popularizara o nome de Lenine, mas continuava-se a conhecer muito pouco do marxismo: circulava o “Manifesto Comunista” e algumas edições resumidas do “Capital” e pouco mais. Em 1920, criara-se a “Federação Maximalista”, que teve curta duração.

Nos anos 1921-26 o novo partido luta para definir a sua linha e criar uma estrutura orgânica. O Partido tinha uma base operária restrita, em certos setores de Lisboa, de Almada e do Alentejo; reunia também intelectuais e empregados; a sua base proletária era muito reduzida em face da CGT. Em 1924 e 1926, o Partido realiza dois congressos que, contudo, não conseguem definir uma linha política geral e onde se dão confusas lutas de prestígio entre diversos militantes. Publica-se com irregularidade o órgão do Partido, o “Proletário”.

Com ajuda da Internacional, o Partido forma alguns quadros que iam estudar à União Soviética. Define também alguns princípios de tática comunista: em 1926, o 2º congresso lança um apelo para a unidade operária em face das ameaças fascistas (este apelo é rejeitado pelos anarquistas, que tinham tomado atitude violentamente sectária contra os comunistas, a quem acusavam de dividir o movimento operário); defende a necessidade de aproveitar o parlamento burguês para fazer ouvir aí a voz da classe operária; opõe-se ao terrorismo anarquista, mas a sua contribuição principal para o movimento operário é fazer compreender a necessidade da direção política do Partido e duma rigorosa disciplina da classe frente ao inimigo.

Nesta primeira fase da vida do Partido faz-se sentir bastante a falta de quadros comunistas capazes; travam-se lutas pessoais e não há uma noção política diária, séria; o Partido desacredita-se em discussões de cafés. Carlos Rates (militante sindicalista bastante conhecido, que aderira ao Partido) é eleito secretário-geral, com o apoio dos delegados da Internacional, mas pouco tempo depois troca o Partido por um bom emprego. O Partido atravessa uma séria crise a partir de 1926.

10. Depois de 1919, a luta de classes continua a agudizar-se. O proletariado consegue em 1919 uma vitória com a lei das 8 horas de trabalho, mas a carestia e a especulação agravam as suas condições de vida. O movimento sindical continua a alargar-se ao lado dos sindicatos da CGT, surgem os sindicatos controlados pelos comunistas e filiados na ISV (Internacional Sindical Vermelha). O movimento das massas empolga muitos milhares de trabalhadores. O movimento grevista vai também em aumento: greve dos mineiros de Aljustrel durante 8 meses; greve dos ferroviários, que paralisam a rede nacional; greve dos marítimos; etc. Dão-se no Alentejo, em Lisboa e no Algarve grandes comícios e marchas da fome, com bandeiras pretas; o movimento estende-se ao Porto, com o grande comício de 20 mil trabalhadores no Monte Aventino. Com bastante frequência, trabalhadores armados assaltam estabelecimentos para arranjar comida. Em 1923, trabalhadores rurais da região de Odemira ocupam terras dos latifundiários; o governo reprime severamente o movimento e vários camponeses são deportados para África.

11. A burguesia começa a organizar-se melhor para lutar contra o movimento operário. Os patrões combinam-se para não ceder às greves e aplicam o “lockout”; em Lisboa forma-se uma associação “amarela” paga pelos industriais, para furar greves, aterrorizar os operários e provocar distúrbios (o chefe desta associação é apunhalado por um operário). Latifundiários e grandes comerciantes criam em 1925 um novo partido ultrarreacionário, a União dos Interesses Económicos. O chefe da União Liberal, Cunha Leal, pede no parlamento a pena de morte para os bombistas. O governo endurece a repressão contra o movimento operário. Em 1923 (?)[sic], como os ferroviários em greve ameaçassem sabotar as vias como protesto contra o fato de os comboios circularem conduzidos pela tropa, o governo manda atrelar vagões com grevistas na frente dos comboios.

Os atos terroristas amiúdam-se. Há atentados a tiro e à bomba contra grandes capitalistas, como Alfredo da Silva, da CUF. Surge a organização “Legião Vermelha” que pretendia opor o terrorismo operário ao terrorismo burguês. Mas a maior parte destes atos, sem uma direção centralizada, não têm uma orientação política correta e ainda agravam mais as dificuldades do movimento operário, como o lançamento duma bomba num cortejo comemorativo do dia de Camões, que mata várias pessoas.

Depois de uma malograda tentativa do governo por um partido radical burguês, a “Esquerda Democrática”, de J. Domingues dos Santos, em 1924, apoiando-se nos trabalhadores, os grupos da burguesia dominante começam a preparar ativamente o golpe fascista.

12 — Características deste período — É um dos períodos mais ricos da experiência para o movimento operário, sobretudo na atividade sindical e grevista, que traz à luta de classes centenas de milhares de trabalhadores. O proletariado aprende a organizar-se e a lutar unido pelas suas reivindicações económicas. Liberta-se também da tutela ideológica burguesa e compreende que é preciso intervir na luta política. Contudo, esta consciência de classes é ainda muito imperfeita devido às noções anarquistas predominantes. O Partido Comunista está ainda muito longe de se poder tornar o Estado-maior do proletariado. A confusão e a desmoralização alastram no proletariado, que não vê um objetivo preciso na sua luta nem uma direção digna de confiança.

III - A Resistência Anti-Fascista (1926-1940)

1 — A instauração da ditadura fascista em 1926 abre a terceira etapa da revolução burguesa em Portugal. A concentração da riqueza conseguida com a exploração colonial e com os negócios da guerra, a necessidade de reprimir o movimento operário que se tornava ameaçador, a situação financeira desastrosa, levam o núcleo mais poderoso da burguesia a remodelar de novo as instituições e a caminhar para o fascismo. A democracia burguesa que desempenhara um papel positivo, estava ultrapassada e começava a ser um estorvo ao crescimento do capitalismo.

2 — Devido à crise interna do movimento operário, não há praticamente resistência organizada contra a ditadura militar. Os chefes sindicalistas, com o seu habitual oportunismo, acreditavam que os militares pudessem melhorar a situação. O 2º Congresso do Partido Comunista, reunido precisamente em 28 de Maio, lança um apelo para a Frente única contra a ditadura, mas o Partido não tinha força para por esse apelo na prática. A massa proletária, cansada e confundida, não reage inicialmente à ditadura. Gomes da Costa faz o seu passeio militar de Braga a Lisboa sem a menor dificuldade.

Entretanto, menos de um ano depois, quando o caráter da ditadura se define, muitos operários da vanguarda de Lisboa tomam as armas em apoio dum golpe preparado por políticos republicanos: é o 7 de Fevereiro de 1927 de que resultam dezenas de mortos em combate ou fuzilados após ele, sobretudo operários, soldados e marinheiros. Nas forças reacionárias que esmagam a revolta destaca-se o tenente Botelho Moniz.

3 — O movimento de massas reduz-se após a instauração da ditadura. Os sindicatos levam uma vida semiclandestina: a CGT, incapaz de se adaptar à ilegalidade, esborora-se. Mas a corrente comunista, baseada no Partido, consegue reorganizar-se a partir de 1929, sob a direção de Bento Gonçalves.

Bento Gonçalves, operário do Arsenal, de 27 anos (nasc. 1920), sindicalista entusiasta, visitara a URSS por ocasião do 10º aniversário da Revolução e voltara disposto a trabalhar pela reorganização do Partido que então estava desorganizado, sem imprensa, contando ao todo 30 militantes e 2 células. Por iniciativa de B. Gonçalves, reúne-se uma Conferência que elege nova direção e enceta um sério trabalho de ligação à classe operária (1929). Esta Conferência marca verdadeiramente o começo duma atividade política e comunista em Portugal. O Partido estende a sua organização clandestina na região de Lisboa, Marinha Grande, Alentejo. Forma-se um Secretariado, composto de Bento Gonçalves e José de Sousa, conhecido dirigente sindical, Joaquim Pires Jorge, que participara no 7 de Fevereiro e sofrera dois anos de prisão em Angra, entra também para o Partido. Em 1931, começa a publicar-se o “Avante”, novo órgão do Partido, que substitui o “Proletário”.

4 - Com a repressão fascista, a vanguarda proletária tende a ficar isolada das grandes massas, que se esquivavam à luta. Apesar disso os sindicatos mantinham-se (os de orientação comunista, controlados pela CIS — Comissão Inter Sindical, dirigida por José de Sousa); a CGT perdia forças pouco a pouco. O Partido começa a conduzir lutas de massa do proletariado, a ser reconhecido como o seu dirigente: greve do pessoal dos transportes marítimos (1930); greve dos vidreiros da Marinha Grande, que se torna um baluarte comunista; manifestações contra o desemprego em Lisboa, Almada, Algarve, comícios-relâmpago do 1º de Maio etc. As experiências da ação proletária neste período foram mais tarde analisadas no Tarrafal por Bento Gonçalves.

5 — Em Julho de 1932, Salazar que era ministro das Finanças, tem a chefia do governo. A ditadura toma novo impulso contra o movimento operário: “plebiscito” da nova Constituição (todas as abstenções foram tomadas como votos a favor), promulgação do Estatuto do Trabalho Nacional (Set. 1933), criando os “Sindicatos nacionais”, grémios e corporações. O ETN estabelecia que os sindicatos livres seriam encerrados e que os seus bens reverteriam para os “Sindicatos nacionais”. Era um golpe fortíssimo da burguesia contra as liberdades conquistadas em meio século de luta do movimento operário. A camada mais ativa do proletariado mostrava-se disposta a resistir e a defender os sindicatos.

Perante a hesitação da direção do Partido sobre o caminho a seguir, é decidido um apelo à greve, que certos setores operários tendem a transformar numa ação armada. O movimento, desencadeado em 18 de Janeiro de 1934, é rapidamente sufocado pela repressão. Há esboços de greve e atentados à bomba em Coimbra, Lisboa, Silves; na Marinha Grande, os operários armados apossam-se da vila, elegem um soviete e hasteiam a bandeira vermelha, mas a vila é tomada de assalto por forças do exército; destacam-se no movimento da Marinha Grande, Manuel Esteves de Carvalho (morre um ano depois, tuberculoso); António Guerra, José Gregório e outros. São feitas muitas prisões.

6 — A derrota do 18 de janeiro não quebra a agitação da vanguarda operária, que continuava a procurar, de forma anárquica, o caminho da luta armada contra a ditadura, esgotando-se em revoltas locais.

O aparelho repressivo fascista vai-se estruturando. A nova polícia política, a PVDE, dirigida por Catela, começa a distinguir-se pelos espancamentos e torturas. O militante Manuel Vieira Tomé, um ferroviário é assassinado em 1934. Após o começo da guerra de Espanha, surge a Legião e a Mocidade, milícias fascistas; a política cria uma rede de bufaria nas fábricas, Salazar apoia a campanha militar de Franco, exaltando o fascismo e o nazismo.

7 — Em 1935, durante um comício-relâmpago em Alcântara, o militante comunista Manuel dos Santos mata um polícia a tiro (Manuel dos Santos passou 10 anos na Penitenciária, de onde se evadiu, para morrer pouco tempo depois tuberculoso).

Em Agosto de 1936, no ambiente de agitação causado pelo começo da guerra de Espanha, dá-se a revolta na Armada. Os marinheiros amotinam-se, prendem os oficiais e apossam-se de dois navios, mas são bombardeados ao tentar sair a barra e rendem-se. Esta revolta fora preparada pela ORA (Organização Revolucionária da Armada) e pelo seu jornal “Marinheiro Vermelho”, de que circulavam centenas de exemplares. Na criação da ORA distinguiu-se Manuel Guedes, militante comunista (existia também a ORE, no Exército).

Ainda um reflexo desta corrente é o atentado contra Salazar organizado por um grupo de trabalhadores anarquistas.

8 — A ilegalização dos sindicatos e o fracasso das ações armadas provocam uma aguda luta de tendências no movimento operário e no interior do Partido. Os elementos sindicalistas agrupados na CIS e dirigidos por José de Sousa lançam-se no movimento sindical clandestino, contra a opinião da maioria da direção do Partido.

A princípio, conseguem alguns resultados; no período de 1934/36, dezenas de sindicatos esquivam-se à ordem de dissolução, conservam-se semi-legalmente e fazem sair mais de uma dezena de jornais sindicais clandestinos (dos ferroviários, dos metalúrgicos etc.). Esta corrente era a que estava mais próxima da corrente anarquista; era também a que concebia a resistência ao fascismo por meio de revoltas armadas e atentados.

Bento Gonçalves, à frente da maioria do Partido, pronuncia-se pela penetração nos “sindicatos nacionais”, criticava o movimento sindical clandestino, mostrando que tinha cada vez menos influência de massas, condenava as aventuras armadas (classificou o 18 de Janeiro como “mais uma Anarqueirada”) e defendia uma tática defensiva: Frente única com a pequena burguesia republicana, aproximação das massas proletárias por meio da luta económica e aproveitamento das organizações legais.

No 7º Congresso da Internacional (onde Bento Gonçalves foi em 1935, chegando a delegação do P.C. Português), Dimitrov apresentou um informe indicando a necessidade duma política de Frente Popular para deter o avanço das ditaduras fascistas. Foi essa orientação que Bento Gonçalves trouxe para Portugal e que foi adotada pelo Partido.

A experiência posterior mostrou que esta tática, tal como foi aplicada em Portugal, abriu o caminho das tendências pacifistas e oportunistas da direita dentro do Partido. Se, em vez de se travar a vanguarda proletária, se tivesse canalizado o seu espírito de luta para ações táticas de combate (que ao contrário das revoltas locais, poderiam ter êxito), poderia ter-se conjugado a noção pacífica com a ação armada e impulsionado a resistência antifascista.

Ao mesmo tempo que condenava as aventuras armadas, o Partido começou a afastar-se da perspectiva da conquista do poder e a decair no oportunismo.

9 — O período de 1936-40 é aquele em que o movimento de massas atinge o seu ponto mais baixo, devido à derrota das ações armadas, à dispersão da vanguarda proletária pelas prisões, pela deportação e pelo exílio, e também a uma certa estabilidade do nível de vida das massas trabalhadoras, que haviam sentido durante a crise de desemprego, de 1930-33.

É de referir que bastantes trabalhadores comunistas e anarquistas combateram em Espanha contra o fascismo e alguns lá deram a vida. Estiveram nesta época em Espanha Manuel Guedes, J. Pires Jorge (preso pelos franquistas e entregue ao governo português, cumpriu três anos em Angra) e Álvaro Cunhal.

Os sucessivos golpes no Secretariado (foram presos Francisco Miguel, ao regressar da União Soviética, Alberto Araújo e outros) acabaram por desorganizar a direção do Partido. Em 1939 a direção do Partido composta por elementos que não tinham a confiança do proletariado, muitos deles intelectuais sem experiência nem capacidade política; deram-se casos graves de infiltração de provocadores e aventureiros no aparelho clandestino do Partido. A direção não orienta a luta prática, envolve-se em discussões e intrigas. O nível político da imprensa baixa. O Partido tende a transformar-se num agrupamento radical pequeno-burguês sem verdadeiro cunho proletário revolucionário. Por fim, a Internacional corta as relações com o P. C. Português, por a direção deste não lhe merecer confiança. 1939 é um dos pontos mais baixos do movimento operário português.

10 — Características deste período — O movimento operário é surpreendido pela reação fascista da burguesia no momento em que a corrente anarquista entrava em declínio e quando a corrente comunista ainda não ganhara raízes nem amadurecimento ideologicamente. A resistência ao fascismo trava-se sob uma aguda luta de tendências no interior do proletariado. Sob a repressão cada vez mais apertada da polícia, a vanguarda do proletariado desgasta as energias em ações desencontradas, sem uma linha comum, oscilando do aventureirismo ao oportunismo de direita, e quebrando os laços com as largas massas.

Depois de, sob a direção de Bento Gonçalves, ter formado um núcleo militante (J. Gregório, Pires Jorge, Fogaça, Cunhal) o Partido mergulha numa grave crise.

IV — O Movimento da Guerra e o seu Declínio (1940-55)

1 — A partir de 1940, sob o impulso da guerra mundial, a economia anima-se devido à exportação (minério, conservas, têxteis, alimentos, produtos coloniais, manufaturas diversas). A classe operária começa a crescer nas regiões de Lisboa e Porto, muitos milhares de camponeses pobres entram nas fábricas.

A exploração capitalista acentua-se brutalmente: intensificação do ritmo de trabalho, horas extraordinárias obrigatórias, carestia, especulação, racionamento. A partir de 1941, o movimento da massa do proletariado entra em impetuosa ascensão (primeiro no campo económico, também depois no político), envolvendo centenas de milhares de trabalhadores que até aí tinham estado à margem da luta de classe. Este ascenso, que está ligado à reorganização do Partido, marca um período importante no movimento operário português.

2 — O movimento grevista de 1942-47 é uma das experiências mais brilhantes do movimento operário, que educa e une grandes massas proletárias, mostrando-lhes a ligação entre os capitalistas e o aparelho de Estado: as greves formam e revelam militantes operários, como Alfredo Dinis (Alex), morto pela polícia em Julho 45.

As principais greves deste período são:

  1. greve de 20 mil operários de Lisboa, em Nov. 1942, semi-espontânea, que colhe o governo de surpresa e obtém uma vitória parcial;
  2. greve de 50 mil operários da região de Lisboa e Almada, acompanhada por S. João da Ladeira, inteiramente organizada pelo Partido (Julho de 1943); uma das maiores greves registadas em Portugal; manifestações e choques com a polícia; o governo encerra as fábricas, faz centenas de prisões, controla a readmissão do pessoal, a greve é derrotada;
  3. greve da zona de Alhandra, apoiada pelos operários agrícolas da região de Lisboa, com comícios, forte repressão (Maio de 1944);
  4. greves no Alentejo e Ribatejo pelas ceifas, envolvendo dezenas de milhares de operários agrícolas, geralmente vitoriosas (1944/45-46?)[sic];
  5. greve dos tecelões da Covilhã, em Janeiro de 1946, com manifestações, forte repressão, derrotada;
  6. greve dos mineiros de S. Pedro da Cova (1946);
  7. greve do estaleiro naval de Lisboa, que não se consegue fazer alastrar ao resto da cidade, dezenas de operários deportados para Tarrafal (Abril 1947).

3. Estimulados pelo movimento grevista e nele apoiados, grossos contingentes proletários atiram-se à luta económica, aproveitando todos os meios legais; a tendência para persistente de boicotar os “Sindicatos nacionais” inverte-se e, desde 1941, desenha-se um grande movimento de massa para a penetração nos sindicatos-fantoches, em seguimento das consignas do Partido; os êxitos conseguidos em poucos anos permitem que em 1940 e 1943 se trave uma luta generalizada pela conquista das direções dos SN e pela expulsão dos rafeiros do patronato nelas instalados; dezenas de direções sindicais ficam sob controle dos trabalhadores, embora por pouco tempo.

Generaliza-se também por esta altura a formação de comissões de fábrica semilegais (“comissões de unidade”) que servem de apoio orgânico às petições, concentrações e paralisações contra a exploração.

4 — A amnistia dos Centenários, em 1940, trouxe do Tarrafal e de Angra militantes destacados, como Júlio Fogaça, Sérgio Vilarigues, Pedro Soares, Américo de Sousa, Pires Jorge, que se juntam a José Gregório e outros entretanto soltos por terem cumprido as suas penas, como M. Guedes e A. Cunhal, e ainda os novos militantes operários surgidos nas organizações locais, como António Dias Lourenço, lançando-se à reorganização do Partido e criando um novo Comité Central.

Nos anos 1940-41 a nova e a velha direção do Partido, cada uma publicando o seu “Avante”, disputam o controle da organização e a influência sobre a classe operária, mas em breve o grupo pequeno-burguês de Cansado Gonçalves e Velez Grilo se desarticula e o Partido fica reunificado.

No curto espaço de três anos (1940-43) o Partido é reconstituído em moldes leninistas: a direção coletiva, disciplina firme, rigor conspirativo, corpo de militantes profissionais que as alarga progressivamente. Apesar de alguns golpes da polícia (prisões de Fogaça, P. Soares, Pires Jorge), o aparelho clandestino ganha estabilidade e continuidade, permitindo um largo trabalho de agitação e propaganda. Existem bastantes militantes de origem burguesa (Cunhal, Fogaça, Soares, Cândida Ventura, etc.) mas que adquirem o estilo proletário de disciplina, firmeza e realização prática. O Secretariado é constituído por Manuel Guedes, José Gregório e Álvaro Cunhal (que estivera no Congresso da Juventude Comunista em Moscovo, tivera um porte exemplar quando preso, e sobretudo se destacava rapidamente pela sua capacidade política).

O “Avante” sai com regularidade, popularizando a linha do Partido, noticiando as vitórias do exército vermelho da URSS contra o nazismo, divulgando as experiências da secção operária nas várias regiões do país. O “Militante”, criado em 1935, começa pela primeira vez a ser auxiliar do trabalho de organização.

5 — A reorganização do Partido culmina no 1º Congresso ilegal (1943) que é verdadeiramente o primeiro congresso desde a fundação do Partido. Cunhal apresenta o informe político, Guedes e Gregório apresentam informes sobre organização e defesa conspiratória.

O informe político estuda as experiências do movimento de massas e sobretudo da greve de Julho de 1943, defendendo a formação duma Frente Única Operária através da ação de massas; passa em revista as forças aliadas do proletariado (chamando a atenção para a ausência de mobilização do campesinato e dos povos coloniais) e formula propostas à burguesia democrática para uma Frente comum contra a ditadura (base para o programa de um governo democrático de Unidade nacional). O Congresso lança um apelo aos operários e camponeses para que desenvolvam a ação de massas contra a ditadura.

No seguimento do Congresso, o Partido obtém duas vitórias importantes: a criação do MUNAF — Movimento de Unidade Nacional Antifascista (Dez. 1943), organização clandestina onde colabora com os grupos da burguesia liberal; e o lançamento dos GAC (Grupos Antifascistas de Combate), em princípios de 1944, que representam a primeira tentativa do Partido para organizar a ação tática armada contra a ditadura.

Após o 1º Congresso, os efetivos e a influência política do Partido crescem rapidamente nos dois anos seguintes: o Partido funde-se com a vanguarda proletária e caminha à sua frente; ao mesmo tempo, consegue atrair ao Conselho Nacional do MUNAF praticamente todos os pequenos agrupamentos republicanos, socialistas etc.

No conjunto, pode dizer-se que o 1º Congresso ilegal definiu uma linha correta para a ação tática; o seu erro foi ter descurado completamente a perspectiva estratégica da revolução (Cunhal refere-se-lhe de passagem como uma revolução “nacional democrática, primeira etapa da revolução democrática burguesa”); por isso, o Congresso não se demora no estudo do caminho da insurreição armada e da conquista do poder.

6. Entretanto, no Tarrafal (onde as febres e os maus tratos mataram mais de 30 militantes, entre eles o pintor Alfredo Caldeira, do C. C. do Partido, António Guerra, operário da Marinha Grande, Mário Castelhano, anarquista, secretário da CGT, e o próprio Bento Gonçalves, em 1942) prosseguia o debate acerca da linha do Partido em foco a seriedade do trabalho de massa realizado em 1929-35, em contraste com o aventureirismo das ações armadas. Porém, no decurso deste debate, as suas ideias aproximam-se cada vez mais da direita e vem a cair num oportunismo extremo, ao formular a proposta para uma “política nova”, que consistia no apoio tático dos comunistas ao governo de Salazar, no caso de a independência nacional ser ameaçada por um ataque alemão.

As posições de Bento Gonçalves no Tarrafal (assim como, de resto, também a sua defesa perante o Tribunal de Angra) mostram que ele nunca superou inteiramente a mentalidade sindicalista e “economista” da primeira fase da sua atividade e parece nunca ter encarado a tomada do poder como um objetivo político concreto. Militante operário abnegado, organizador do Partido Comunista, Bento Gonçalves deixou contudo em germe as tendências que mais tarde levariam à degeneração do Partido: limitação da iniciativa do proletariado ao terreno económico, pacifismo, oportunismo da direita.

7 — Após a morte de Bento Gonçalves, a OCPT (Organização Comunista Prisional do Tarrafal) é dominada por uma corrente ultradireitista animada pelo principal discípulo de Bento, o antigo estudante Júlio Fogaça, que é apoiado por João Rodrigues, Pedro Soares, Alberto Araújo (?)[sic] e mesmo por militantes operários como Manuel Rodrigues da Silva e Francisco Miguel. Em 1944, o OCPT, em cartas dirigidas ao C. C. do Partido, acusa-o de falta de maleabilidade perante a crise da ditadura provocada pela derrota do fascismo na guerra. Tirando argumento da transição na Itália (onde os reacionários formaram um governo republicano e procuraram entender-se com os exércitos anglo-americanos, o OCPT propunha que o Partido adotasse uma “política de transição”: não a (...)ar[sic] inutilmente o espantalho da revolução, retirar a foice e o martelo do “Avante”, dedicar todos os esforços à Unidade antifascista, entrar em conversações com os políticos burgueses, animar o golpe militar — em resumo, facilitar uma “saída doce” não revolucionária. A “política de transição” não era já simplesmente oportunista — ela tendia a liquidar o Partido como força política independente e a entregar o movimento operário ao controle da burguesia democrática. Como veremos, teve repercussões na linha posterior do Partido.

8 — Ao terminar a guerra, sob a influência da derrota do nazismo e das vitórias históricas da URSS, o movimento operário e o movimento da burguesia liberal conjugam-se num vasto movimento nacional antifascista. As manifestações do fim da guerra, a petição nacional contra o Tarrafal, a reclamação de Eleições livres, somando-se ao movimento grevista, obrigam a ditadura, momentaneamente isolada no plano externo a pôr-se na defensiva: Salazar promete eleições livres, tolera a constituição legal do MUD (Movimento de Unidade Democrática), dá uma amnistia.

Após a formação do MUD em Out. 1945, o movimento democrático nas cidades toma um caráter de massa. As comissões do MUD e do MUD Juvenil (fund. Julho 1946) organizam legalmente a propaganda contra a ditadura, atraindo à ação antifascista grandes massas de empregados, operários, estudantes, elementos da pequena burguesia urbana. Pela primeira vez, a oposição à ditadura manifesta-se numa poderosa Frente Popular Única (de que contudo está ausente o campesinato).

9 — O Partido Comunista recolhia o prestígio da sua campanha em defesa da classe operária e em apoio da URSS. Há um largo movimento de adesão ao Partido entre as massas trabalhadores nas cidades e a intelectualidade. A organização alarga-se nas zonas tradicionais (Lisboa, Outra Banda, Alentejo) e estende-se a regiões novas: Algarve, Oeste, Ninho. A separação do “Avante” acentua-se.

Do Tarrafal regressam em 1945 Militão Ribeiro, Fr. Miguel, Manuel Rodrigues da Silva, J. Fogaça, P. Soares, João Rodrigues, Alberto Araújo e outros, o que permite reforçar o aparelho clandestino do Partido. Militão Ribeiro, antigo operário têxtil, que no Brasil se distinguira como militante comunista e que no Tarrafal não alinhara na corrente de “transição”, é chamado ao Secretariado. Cria-se uma Comissão Política do C. C. (pouco depois dissolvida) com Cunhal, Gregório, Alfredo Dinis, Vilarigues, Pires Jorge, Man. Rodrigues e Manuel Domingues.

O Partido sofre alguns golpes da polícia, que contudo não o afetam gravemente: prisão de Maria Machado numa tipografia clandestina, em 1945; prisões de Fr. Miguel (1947) e Guilherme Carvalho (1948). Militantes comunistas assassinados pela polícia, como Alfredo Dinis, operário, dirigente das greves de Lisboa, Germano Vidigal, trabalhador Alentejano (1944?)[sic], Ferreira Marquês, empregado de Lisboa (1942?)[sic], o médico Ferreira Soares (1943), tornam maior o prestígio do Partido entre o proletariado e as massas populares. O Partido vive o período de maior influência política da sua história.

10 — Em 1946, o Partido reúne o seu 2º Congresso ilegal. Álvaro Cunhal apresenta os dois informes principais: política e de organização.

O informe político “O caminho para o derrubamento do fascismo”, indica ao Partido a necessidade de multiplicar as ações do proletariado industrial e rural, para tornar possível o levantamento nacional antifascista, cujas características contudo não define. No que se refere à política de alianças, o informe dedica grande atenção ao movimento democrático burguês e ao MUD, descurando o problema da mobilização das massas camponesas semiproletárias, que continuavam à margem na luta de classes.

O informe ataca com vigor a ineficácia das tendências putchistas e legalistas da burguesia liberal, assim como a plataforma de “transição” proposta pela OCPT e as tendências “terroristas” surgidas no Partido e no proletariado. A sua linha geral (depois desenvolvida nos informes de Cunhal às reuniões do C. C., de Outubro de 1946 e Junho 1947) consiste em ...... [sic] do Partido sobre a Unidade de todos os antifascistas. A Unidade é a garantia da vitória, a divisão seria a derrota. “A[quilo] que nos separa nada é comparado com o que nos une”. Calado por esta concepção, Cunhal é naturalmente levado a velar a contradição entre o proletariado e a burguesia liberal no movimento antifascista. A luta pelo derrubamento do fascismo não é vista como uma tarefa revolucionária de classes do proletariado, apoiando-se fundamentalmente no campesinato, trabalhador e na luta de libertação das colónias e aproveitando a aliança instável da burguesia liberal: é uma luta de “todos os portugueses honrados” (de onde as massas camponesas estão ausentes) e em que compete a todos darem provas de tolerância.

11 — Esta linha política leva a uma atitude nova perante o movimento de massas: ele deve ser suficientemente forte para estimular e pressionar a burguesia liberal, mas não tão forte que a assuste e a afaste da luta. Isto reflete-se em diversas posições e resoluções saídas do 2º Congresso ilegal:

  1. dissolução das GACs que não chegam a atuar;
  2. abandono da “linguagem demasiado de classe” do período de 1941-44;
  3. dissolução da Juventude Comunista, substituída pelo MUD Juvenil;
  4. necessidade de canalizar o movimento operário para formar exclusivamente pacíficas [sic] (Guedes dedica um informe à atividade nos sindicatos-fantoches);
  5. esforço para “satisfazer os anseios da pequena burguesia”, exigindo que os comités do Partido “se interessem pelos problemas do comércio e da indústria das suas localidades”;
  6. concessões aos políticos liberais a fim de manter a Unidade permitindo-lhes apossar-se da direção do MUD, que se transformam em seu partido político.

12 — O informe de organização expõe os princípios de centralismo democrático, até aí mal conhecidos e mal aplicados no Partido. Ao mesmo tempo, dentro das concepções da linha geral da Unidade, lança a palavra de ordem para “um grande Partido nacional” capaz de exprimir as reivindicações não só ao proletariado como das restantes camadas anti-salazaristas. Esbate-se a noção de Partido Comunista como o Estado-maior do proletariado para a revolução, abrem-se as portas do Partido a grande número de elementos pequeno-burgueses e de setores atrasados do proletariado. A vigilância de classe afrouxa, o cunho proletário revolucionário das fileiras do Partido compromete-se, muitos operários avançados começam a tomar em relação ao Partido uma posição de apoio com reservas. Assim se explica que, no período 1945-49, apesar do ascenso do movimento de massas e dos sucessos orgânicos do Partido, o número de militantes operários formados é mínimo: a organização operária de Lisboa entra em declínio, primeiro lento, depois acelerado.

13 — Em resumo: o 2º Congresso ilegal, um dos mais importantes na vida do Partido, representa uma viragem oportunista, sob a direção de Álvaro Cunhal, anulando as tendências positivas do 1º Congresso. Embora rejeitando a linha liquidacionista da “transição”, o Congresso orientou o Partido e o movimento operário no sentido de graves compromissos com a burguesia liberal. A partir do 2º Congresso, acentuam-se os dois pontos fracos do movimento democrático do fim da guerra:

  1. as massas trabalhadoras servem as diretivas moderadas e “ordeiras” da Unidade (Eleições livres, Amnistia, abolição da Censura) e não apresentam nas ruas as suas próprias reivindicações revolucionárias (fim da carestia, liquidação da PIDE, demissão do governo, expropriação dos ricos, expulsão dos imperialistas estrangeiros, liberdade para as colónias);
  2. o campesinato mantém-se adormecido e à margem da luta política, privando o proletariado do seu único aliado seguro.

14 — A partir de 1947, o movimento de massas entra no refluxo. Depois da greve de Abril, o movimento grevista interrompe-as. Em 48, registam-se ainda êxitos nas “eleições sindicais” mas a situação geral é de recuo e os contingentes operários envolvidos na ação económica e política diminuem de mês para mês. Entre as causas deste refluxo podemos apontar:

  1. melhorarem ligeiramente as condições de vida dos trabalhadores, pois o movimento grevista obrigou a acabar com o racionamento e a afrouxar a carestia (campanha da “vida barata”, 1947);
  2. o movimento político (prisões em massa, perseguições aos grevistas, inscritos nas “listas negras” da polícia e dos patrões);
  3. as massas trabalhadoras foram para o movimento democrático iludidas acerca da burguesia liberal e confiaram no apoio da Inglaterra e EUA, começando a perder as ilusões a partir de 1947;
  4. após a greve de Julho 1943 e as manifestações que a acompanharam, quando a vanguarda operária começou a voltar-se para a violência, o Partido não a orientou nessa via (dissolução dos GACs e campanha contra o “terrorismo”) e insistiu pela repetição anual das greves, apesar da experiência mostrar que a arma da greve não podia ser usada sob o fascismo do mesmo modo que sob a democracia burguesa;
  5. desligação entre o Partido e vanguarda operária, que pressente o oportunismo da linha da Unidade.

15 — Depois do fugaz ascenso de 1945-46, o movimento democrático, em vez de se orientar no caminho dos choques armados e da luta pelo poder, desagrega-se e entra em declínio. Os representantes da burguesia liberal que dirigem o MUD são obrigados a abandonar as ilusões na ação legal e nas eleições; perante a onda de repressão de princípios de 1947 (demissões de professores e funcionários, incidentes na Universidade, prisões, desarticulação do MUD e MUD Juvenil), os políticos liberais lançam-se no golpe militar (Abril 1947); após o fracasso deste, começam a intrigar nas altas esferas para tentar desagregar o regime, e a hostilizar o Partido e o movimento operário. A apresentação da candidatura do general Norton de Matos à presidência da República faz-se já em plena crise da Unidade, com o MUNAF praticamente inexistente e em aguda luta no interior do MUC.

16 — A noção de que o proletariado e o Partido estão a ser utilizados pela burguesia liberal faz surgir no C. C. uma corrente que se esforça por retificar os erros principais da linha da Unidade.

O “Avante” critica em 1943 os “falsos democratas” e alerta os trabalhadores contra as manobras deste; o Partido tenta disputar muito tarde a direção do MUD e da candidatura aos liberais; são expulsos elementos titistas e socialdemocratas que formavam a extrema-direita do Partido (Piteira Santos, Mário Soares, António de Sousa etc.). Por fim, na reunião do C. C., de Janeiro de 1949, Militão Ribeiro critica, embora de modo indireto, a linha da Unidade: o movimento democrático deve seguir uma orientação proletária revolucionária, no interesse de todo o povo, e não uma orientação oportunista, favorável à burguesia pequena e média; os comunistas não têm que se prosternar diante dos democratas burgueses mas impulsionar sem limites o movimento de massas. O informe de Militão Ribeiro inicia o período em que a direção do Partido procura retificar a linha oportunista do 2° Congresso ilegal.

17 — O ano de 1949 é um ano difícil para o movimento operário português. O movimento democrático unitário, em que se tinham posto tantas esperanças, vem a morrer com a desistência da candidatura Norton de Matos; o governo procede tranquilamente à burla eleitoral perante o desinteresse das massas. Logo em seguida, a PIDE aplica um tremendo golpe ao Partido, prendendo A. Cunhal e Militão Ribeiro, membros do Secretariado, e assaltando uma tipografia. O movimento de massas chega a um dos seus pontos mais baixos; apatia, incerteza, desmoralização. A unidade rompe-se, o MUD desaparece, os políticos liberais, os socialdemocratas e Norton de Matos passam-se para o anticomunismo. 1949 é também o ano em que Portugal entra no bloco da NATO, consagrando a reabilitação de Salazar perante o bando imperialista americano-inglês. Tudo isto impõe uma revisão à linha geral do Partido elaborada pelo 2º Congresso ilegal. É a tarefa em que se vai lançar o Secretariado, agora encabeçado por José Gregório.

18 — A primeira tarefa do Secretariado, contudo, é deter a ofensiva policial que ameaça destruir o Partido. Dezenas de militantes clandestinos são engolidos pela repressão nos anos 1949-50; além de A. Cunhal e Militão Ribeiro (este morre na Penitenciária no ano seguinte) Man. Rodrigues da Silva, António Dias Lourenço, José Moreira (assassinado na sede da PIDE), José Magro, Joaquim Campino, José Maria do Rosário, Sofia Ferreira, José Martins etc. Organizações regionais inteiras são destroçadas, no Minho, Algarve, Alentejo, Lisboa, Oeste. Muitos elementos que tinham vindo ao Partido na fase de ascenso político, por oportunismo, lançam-se na debandada, aterrados pela repressão; certos militantes responsáveis, ao serem presos, passam-se para o inimigo, como Mário Mesquita, Mendonça etc. Um membro do C. C. Manuel Domingues, suspeito de espionagem e provocação, é expulso do Partido (aparece morto em seguida).

O Secretariado defendeu o Partido, limpou a organização de elementos inseguros ou incapazes que tinham sido admitidos em período de Unidade e em 1951 acabou por suster a ofensiva da polícia. O Partido agora muito reduzido em efetivos e circunscrito à Margem Sul do Tejo, a certas zonas do Alentejo e à região de Lisboa (onde a organização agrária é quase inconsistente), está em condições de retomar a reação.

19 — O Comité Central do Partido está reduzido a 5 elementos: José Gregório, “Alberto”, J. Pires Jorge (“Gomes”, Manuel Guedes (“Santos”, Júlio Fogaça (“Ramiro”), Sérgio Vilarigues (“Amílcar”) e um membro suplente, Octávio Pato (“Melo”), empregado, que passara à clandestinidade no fim da guerra. Um outro membro suplente do C. C., o escritor Pereira Gomes morre na clandestinidade em 1950. Do antigo aparelho clandestino restavam Américo Sousa, Pedro Soares, João Rodrigues, Cândida Ventura, Manuel da Silva, a que se juntam militantes de formação mais recente, como os operários Mário Serra, J. Gomes dos Santos, José Vitorino, os estudantes Blanqui Teixeira, Alexandre Castanheira, Carlos Costa etc. A direção do Partido perde entretanto L. Guedes, preso em 1952.

A necessidade de garantir a unidade do Partido num período difícil e de manter uma elevada vigilância conspiratória e política levam a uma forte centralização do controle e da iniciativa nas mãos do Secretariado. Essa centralização evitou a destruição do Partido; mas, tendo levado por vezes longe demais a depuração do Partido, tendo sufocado a luta de ideias nos organismos partidários, tendo criado um clima dogmático, o Secretariado veio a entravar a recuperação política do Partido e o seu amadurecimento ideológico no período 1951-55.

20 — A experiência que o Partido recolhera da linha da Unidade, coincidindo com a intensificação da luta contra o reformismo e o oportunismo da direita do movimento comunista internacional a partir de 1948 (resolução do Cominform contra o titismo), levam o Secretariado a conduzir, sob a direção de J. Gregório e pela primeira vez na vida do Partido, uma campanha sistemática contra as tendências direitistas.

Em 1951 o Secretariado retoma a crítica contra a plataforma de “transição” insistindo no caráter liquidador dessa corrente e exigindo de J. Fogaça, João Rodrigues e outros, novas autocríticas, que são tornadas públicas. Em 1953, é expulso Gilberto de Oliveira, por defender posições direitistas. Em 1954, a 5ª Reunião ampliada do Comité Central destroça uma fração direitista que se começara a formar no C. C. em torno de J. Rodrigues, com o apoio de Cândida Ventura e “Montes”, e cujo objetivo era dissolver o MND (Movimento Nacional Democrático, criado por iniciativa do Partido em 1951) e restabelecer a linha da Unidade. J. Rodrigues é expulso do Partido.

Esta vigilância contra a direita foi contudo comprometida pelo chamamento ao Secretariado de J. Fogaça em 1952, apesar de este ter demonstrado pela sua autocrítica que não superara as ideias ultra-oportunistas: fustigando a sua “presunção” e “desconhecimento das condições objetivas”, Fogaça em momento nenhum admitiu claramente que o fundo da “política de transição” era entregar o movimento operário e o Partido ao controle político da burguesia liberal. A integração de Fogaça no Secretariado veio a ter consequências graves para o Partido.

21 — Na consolidação ideológica do Partido nesta fase desempenharam importante papel as reuniões ampliadas do C. C. A principal é a 5ª Reunião ampliada, em 1954, que aprova o primeiro Projeto Programa do Partido: este projeto, que nunca chegou a transformar-se em programa devido à nova viragem política do Partido em 1955-56, tem uma grande importância: nele o Partido alerta as massas trabalhadoras contra a burguesia liberal, e liga a perspectiva da insurreição popular armada ao estabelecimento da democracia popular, com expropriação do capital financeiro e dos imperialistas. Reforma agrária, independência para as colónias etc. Ao mesmo tempo a 5ª Reunião ampliada atende às necessidades táticas, propondo uma plataforma de Unidade, em que define as condições em que está disposta a colaborar com os agrupamentos liberais.

No conjunto, as reuniões ampliadas do C. C. lançaram as bases para sanear ideologicamente o Partido. As suas falhas principais foram:

  1. não ter feito uma crítica sistemática e aberta ao desvio oportunista da Unidade;
  2. não ter chamado o trabalho camponês ao lugar lhe cabia na atividade do Partido;
  3. não ter tratado o emprego da ação armada para a preparação da insurreição;
  4. não ter fundamentado a definição da revolução democrática popular numa análise da luta de classe no país.

Por essas falhas puderam voltar a infiltrar-se na direção do Partido as tendências direitistas.

Um Secretariado desenvolveu ainda neste período um esforço para a elevação ideológica do Partido, que contrasta com o praticismo anterior. Contribuiu também para coesionar ideologicamente o Partido a defesa de Álvaro Cunhal perante o tribunal fascista, exaltando o caráter nacional e popular do Partido em confronto com a política de traição da camarilha governante.

22 — O Partido lutava com grandes dificuldades para restabelecer a sua ligação com o proletariado: muitos operários [haviam] perdido a confiança na natureza de classes e nos objetivos do Partido; o movimento de massas atravessava um período de fraca produtividade: o esforço para transformar os “sindicatos nacionais” em órgãos legais da classe operária fora varrido pela onda de prisões, demissões e suborno de dirigentes, que levou a perder as posições conquistadas em 1946-48; por outro lado, o aparelho de vigilância da PIDE nas fábricas tornava-se mais eficaz.

Apesar disso, o Partido esforça-se por conduzir as reivindicações diárias do proletariado, criando lentamente novos focos de organização operária, sobretudo na Outra Banda. No Alentejo, onde o movimento económico do proletariado rural conhece um ascenso, o Partido populariza de novo “O Camponês”, alarga a organização, forma militantes e obtém êxitos políticos, conduzindo as greves das ceifas em 1952, 1953, 1954 (assassinato de Catarina Eufémia).

O Partido restabelece também algumas organizações de empregados e intelectuais; aproveitando o MUD juvenil, recomeça a formação de jovens comunistas, que fora abandonada pelo 2º Congresso ilegal. Mas, a não ser nalgumas zonas do Alentejo, não consegue voltar a estabelecer uma sólida ligação entre o aparelho clandestino e a base proletária. Em Lisboa, centro proletário de largas tradições, as células do Partido nas fábricas ou não existem ou são pequeníssimos núcleos isolados da massa. Em Almada, Barreiro, Marinha Grande, Covilhã, existem células operárias, mas em geral de fraca vitalidade. O definhamento do Partido como organização operária, a mudança da sua natureza de classe, prossegue lentamente.

23. O aspecto mais saliente na retificação empreendida pelo Secretariado consiste em ter procurado chamar as massas populares a uma atividade política independente da burguesia liberal, impulsionando para isso a criação de organizações progressistas livres da influência de políticos liberais: o MND (Movimento Nacional Democrático) e o Mov. Defesa da Paz, além do MUD juvenil.

A movimentação popular contra as burlas eleitorais de 1951 (a candidatura de Rui Luis Gomes) e de Outubro de 1953 (“eleições de deputados”) com uma participação de massas reduzida, faz-se em conflito aberto com os políticos liberais, que tentavam de novo servir-se do Partido e das massas para a sua política de pressão sobre a ditadura.

No apoio à campanha mundial contra a agressão americana na Coreia, contra as armas atómicas e contra o imperialismo americano, o Partido consegue certos êxitos, sobretudo na mobilização da juventude. Por fim, em 1954, quando se intensifica a luta pela libertação de Goa, o Partido e o MUD tomam uma posição internacionalista.

24 — As dificuldades políticas deste período, caracterizado pela pausa no movimento de massas (e pelo clima internacional de guerra fria) acentuam-se por a direção do Partido ter cometido alguns sérios erros:

  1. atacava os políticos liberais como cúmplices do fascismo e do imperialismo, em vez de mostrar que a sua duplicidade refletia as contradições próprias do capital não-monopolista; com este género de ataques o Partido incapacitou-se para aproveitar as tendências positivas da corrente liberal e neutralizar as suas tendências negativas;
  2. pretendia impor ao governo a legalidade do MND, MUDJ e MNDP, sem deixar uma base de massas que o torna-se possível: daí o declínio dessas organizações, varridas por ondas de prisões, tendendo a encontrar-se no sectarismo, estrangulados por uma legalidade que não podem impor;
  3. pretendeu conduzir a campanha pela Paz à base de recolhas de assinaturas, moções públicas etc. como nos países de democracia burguesa, facilitando a repressão e provocando o retraimento dos partidários da Paz;
  4. comprometeu as posições do Partido em diversas associações de massas, por pretender forçar os limites da legalidade, sem existir um movimento de massa em que se apoiar.

25 — CARACTERÍSTICAS DESTE PERÍODO. O desenvolvimento do capitalismo durante a guerra origina um acentuado crescimento do proletariado fabril. A classe operária enriquece a sua experiência de luta sob a ditadura fascista com o movimento grevista de 1942-47, que chama às primeiras filas da luta de classe milhares de trabalhadores.

O Partido Comunista, reconstituído, torna-se o organizador e o dirigente reconhecido do proletariado, e uma importante força política, sob a direção de A. Cunhal, J. Gregório etc. Contudo, o movimento democrático da pequena burguesia repercute-se sobre o movimento operário e no interior do Partido, gerando nele uma forte corrente oportunista de direita, representada por A. Cunhal, além da corrente ultra-oportunista e liquidadora da “transição”, surgida na Tarrafal. O oportunismo dentro do Partido compromete o seu vigor revolucionário, contém o movimento de massas no plano pacífico, reduzindo-o ao papel de força de pressão e acabando por torná-lo (1948) um apêndice do movimento democrático burguês. Assim, o movimento popular antifascista esgota as suas energias em 1948-49 sem chegar a uma confrontação direta com a ditadura.

O refluxo do movimento de massas, os severos golpes policiais sobre o Partido e o rompimento da Unidade antifascista provocam uma séria crise no movimento operário. O Partido, sob a direção de J. Gregório e outros, consegue sobreviver aos assaltos do inimigo e inicia a retificação do desvio oportunista de direita, embora com vários erros dogmáticos e sectários.

V - A Nova Estrutura do Proletariado e a Estruturação Reformista do Partido (1955-56)

1 — Depois de 1950, a modernização e concentração capitalista, acelera-se, impulsionada pela penetração do imperialismo. O capitalismo português começa a passar decididamente da indústria manufatureira para a indústria moderna, assente na maquinaria e no trabalho qualificado (metalurgia, química, material elétrico, construção naval, automatização da têxtil etc.). A classe operária dá novo salto em frente e torna-se a maior classe do país, com um milhão em 1960, dos quais meio milhão (?)[sic] trabalham em fábricas médias e grandes.

Este crescimento revoluciona os quadros tradicionais em que evoluía o movimento operário:

  1. as zonas industriais são invadidas por grandes massas camponesas, que fazem lentamente a aprendizagem da vida diária na fábrica;
  2. a “produtividade”, o trabalho a prémio e a multiplicação das categorias lançam a concorrência e a divisão sobre os operários;
  3. elevam-se os contingentes operários especializados e relativamente bem pagos (“aristocracia operária”), que se tornam focos de reformismo no meio do proletariado;
  4. uma massa muito grande de empregados comerciais e de escritório rodeia o proletariado e pressiona-o com o seu nível de vida mais desafogado e com a sua ideologia industrialista pequeno-burguesa. Isto provoca nos centros tradicionais do proletariado avançado (Marinha Grande, Almada, Barreiro, Lisboa, Covilhã) uma crise de adaptação e uma certa dispersão da vanguarda operária, que ainda se agrava mais por efeito da viragem direitista no Partido e no movimento comunista internacional.

2 — Cerca de 1954, o movimento de massas do proletariado começa a animar-se em torno da luta contra a “campanha da produtividade”; depois de 1957, estende-se a várias regiões a ação operária por aumento de salários, conseguindo cerca de 1959-60 uma atualização de todos os salários. As comissões de fábrica semilegais, as exposições, as concentrações, as paralisações, são as formas em que se apoia o movimento económico e servem de escola a largas massas operárias inexperientes. A utilização dos “sindicatos” continua a declinar, exceto no Norte que, nesta e outras formas de ação, começa a despertar para o movimento organizado.

A greve surge geralmente nos setores proletários que ainda a não experimentaram (teceleiras da Emp. Fabril do Norte, 1854(?)[sic] ; salineiros de Alcochete, 1957; pescadores, 1959, 1961; mineiros de Aljustrel, 1961).

Quanto ao proletariado rural do Sul, depois do auge de 1952-54, que o pusera à cabeça do movimento de massas, entra numa fase de menor combatividade, devido ao começo da mecanização nos campos e à emigração para a zona industrial Almada-Barreiro.

3 — O Partido reconstituía pouco a pouco a sua direção central e o seu aparelho clandestino. São presos entre 1953 e 1955, Joaquim Gomes dos Santos, José Vitoriano, Rogério de Carvalho, Pedro Soares, Américo Sousa, Jaime Serra, mas evadem-se sucessivamente Dino Lourenço, P. Soares, J. Gomes dos Santos, Am. Sousa; J. Serra; Guilherme de Carvalho, libertado, reintegra-se na atividade; formam-se alguns novos militantes, entre eles os operários José Carlos e Joaquim Carreira.

Os excessos sectários e dogmáticos eram corrigidos. Apesar da burocratização que invade o aparelho do Partido, separado das grandes massas, este consegue pela condução da luta económica, restabelecer algumas pequenas novas organizações operárias em Lisboa, Almada, Marinha Grande, no Porto (pela primeira vez). A tiragem do “Avante” volta a aumentar.

O partido tinha ainda condições para restabelecer os laços com as massas trabalhadoras e retomar a direção política do movimento operário.

4 — Em 1955, José Gregório, membro do Secretariado, é afastado por doença (vem a morrer em 1961 na Checoslováquia sem ter voltado a intervir no trabalho de direção do Partido). A corrente direitista no C. C., que nunca fora desarticulada, começa a manifestar-se com mais energia. O novo despertar do movimento liberal burguês, em divisões que surgem no campo fascista, a atenuação do clima de “guerra fria”, os sintomas de mudança na URSS depois de morte de Stáline (visita de Krutchov e Bulgánine à Jugoslávia em 1955) —, tudo reforça a corrente direitista.

A 6ª Reunião ampliada do C. C., 1955 (informe político de Vilarigues, inf. De organização de Pires Jorge) é realizada sob o tema da luta contra o sectarismo, pela necessidade de uma larga ação de massas e de aproveitamento das associações legais. Mas, atacando em bloco a linha política seguida desde 1950, fazendo silêncio sobre o projeto do Programa, descurando a vigilância sobre os liberais, levantando de novo o objetivo da “unidade de todos os anti-salazaristas sem distinção”, a 6ª Reunião ampliada é um primeiro passo a direita.

5 — Em Fev. 1956 realiza-se o 20º Congresso do PCUS. A corrente direitista no C. C. acolhe com entusiasmo as novas teses que não só a reabilitam completamente como lhe vêm dar grande autoridade (linha geral da coexistência pacífica, possibilidade de passagem pacífica e parlamentar ao socialismo, unidade com os socialdemocratas, condenação do “culto da personalidade” de Stáline).

A viragem direitista que se desenhava, precipita-se. Em Abril de 1956, o CC do Partido lança um manifesto proclamando a “possibilidade de solução pacífica do problema político português”. A tese da “solução pacífica” era lançada para estimular o movimento liberal burguês e explorar as divisões no campo fascista, com vistas às “eleições” que se aproximavam. Com a “solução pacífica”, o Partido priva o proletariado e as massas populares da perspectiva da insurreição armada, esperando em troca facilitar a desagregação da ditadura e a liberalização do Estado burguês. Isto equivale em por em prática a “política de transição”, proposta em 1944.

6 — Fogaça e Pedro Soares, na carta ao C. C., de Maio de 1956, consideram a viragem insuficiente e propõem:

  1. que o Partido trabalhe por organizar a classe operária dentro dos “sindicatos” (tornar-se-ia assim uma força de pressão eficaz, sem ameaçar subverter a ordem);
  2. que o Partido cesse os ataques em bloco à Assembleia Nacional, Legião e outros órgãos fascistas, de modo a facilitar a decomposição destes;
  3. que o Partido declare a sua disposição de disputar as “eleições” em quaisquer condições, para assim estimular os descontentes a lançarem-se na luta “eleitoral”.

O C. C. não aprova estas medidas extremas, que acabariam de liquidar a sua influência entre os trabalhadores, mas o movimento para a direita continua a acentuar-se.

No decurso de 1956, alegando a fraquissima influência do MND e MUD, o C. C. decide a sua dissolução.

7. .........................(1) ao Projeto anterior) e omite todas as questões fundamentais: a via de insurreição antifascista, a preparação do proletariado para a conquista do poder, a questão camponesa, o caráter da revolução. O PROGRAMA é um compromisso do Partido em não tentar fazer a revolução e em facilitar a liberalização. Para conservar a influência sobre as massas, o programa defende a nacionalização dos monopólios, a Reforma agrária, a expulsão do imperialismo, e a libertação das colónias, medidas que são impossíveis sem o estabelecimento da ditadura popular.

O informe de organização, de Dias Lourenço, e os Estatutos aprovados pelo Congresso animam o liberalismo e as tendências aventureiras em questões de organização, de acordo com a perspectiva da desagregação da ditadura a curto prazo. Seguindo na esteira do 20º Congresso, o C. C., concluíra que tinha havido o “culto” de Bento Gonçalves, o “culto” de Álvaro Cunhal e o “culto” do Secretariado, e fazia pressão para a liberdade de tendências no C. C. Esta corrente liberal e aventureira reflete-se na composição do congresso, a que são chamados muitos elementos sem experiência nem capacidade política, que vem a causar graves prejuízos no Partido.

8 — A necessidade de multiplicar as ações de massas ao serviço da desagregação do regime leva o Partido a degradar a orientação do movimento de massas. O “Avante”, o “Militante”, o “Camponês” e os novos jornais de classe “Corticeiro” e “Têxtil” fecham a ação operária numa perspectiva económica de tipo sindicalista. Para estimular os trabalhadores exagera-se o alcance real das ações diárias nas fábricas, veem-se vitórias em toda a parte, ocultam-se as derrotas, abandona-se o estudo objetivo do movimento de massas. Acenando com as vantagens económicas da luta reivindicativa, afastando o proletariado da ideia de que a luta económica vale só como escola primária de união e organização de grandes massas proletárias, de modo a prepará-las para a luta pelo poder, o Partido fomenta as ilusões reformistas entre a classe operária.

A campanha pelo salário mínimo diário de 100$00 lançada pelo C. C. em 1957 (e depois abandonada pelo seu absurdo) é uma expressão deste esforço para canalizar a ação operária para o campo económico.

Ao mesmo tempo o Partido desenvolve ativa campanha para arrastar os trabalhadores aos SN, convencendo-os que aí se podem obter grandes vitórias; tentando vencer a relutância geral, o “Militante” afirma que “os dirigentes sindicais, sendo de origem operária não podem manter-se indiferentes às reclamações dos Trabalhadores” (artigo de Jaime Serra).

9 — Os núcleos de operários avançados, que já tinham recebido com hostilidade a linha do 20º Congresso (sobretudo os ataques à Stáline, que para eles personificava a ditadura do proletariado), afrouxam mais ainda os seus laços com o Partido. Sem confiança no Partido, sem uma linha revolucionária, atravessando uma fase de reestruturação do proletariado, a vanguarda operária desorganiza-se e fraciona-se em pequenos grupos sem uma orientação definida. Na zona de Almada tendem a renascer as tendências anarquistas, como reação aos oportunistas e ao pacifismo.

O Partido continua, através da sua propaganda antifascista e da condução da luta económica a manter ligação com certos setores operários, mas a sua base desloca-se da vanguarda para as camadas intermédias mais influenciáveis pela linha reformista. Os ativistas na maioria das organizações locais do Partido são agora elementos de origem burguesa ou elementos operários reformistas. Os novos quadros operários rareiam, as células de fábrica não têm vida política e decompõem-se os poucos militantes operários promovidos neste período revelam-se como carreiristas e aventureiros que, ao ser presos, se vendem à polícia (J. Marinho, membro do C. C., Amador e José Miguel, suplentes do C. C., Malaquias, Candeias etc.)

10 — A prosperidade dos novos grupos financeiros apoiados na indústria e associados ao imperialismo (Champalimaud, B. Português do Atlântico, CUF, Banco Borges) a decadência do latifundismo, a recomposição geral da classe burguesa, provocam a partir de 1955 uma crise de readaptação e instabilidade na burguesia, que se manifesta no movimento democrático dos estudantes e dos intelectuais (1956-57), na reestruturação da corrente liberal, que forma a ação Democrato-Social, no aparecimento duma oposição católica (manifestada no Congresso da JCC), nos debates azedos que se travam no congresso da União Nacional (1956) e na Assembleia Nacional, e por fim, na cisão de individualidades do Regime, como o general Humberto Delgado.

À medida que este movimento de oposição burguesa toma corpo, ele desperta, como em 1945-47, uma grande onda de ilusões entre as massas trabalhadoras, que se lançam à ação política, em apoio do movimento de liberalização; e duma maneira ainda mais acentuada do que em 1945-47, a corrente direitista que controla o Partido alinha atrás do movimento democrático-burguês, em vez de ajudar o proletariado a emancipar-se, através da ação, da influência burguesa e a orientar-se no sentido da revolução.

11 — A direção do Partido foi lograda pelos liberais nas “eleições de deputados”, de Outubro de 1957; a A. D. S., desinteressada de concorrer, aproveitou a expectativa do Partido para desistir à última hora, impedindo a organização de candidaturas e de quaisquer movimentos de massas. Isto levou o Partido a criticar os liberais e a tentar recuperar um pouco a iniciativa, apresentando a candidatura progressista de Arlindo Vicente às “eleições” presidenciais de 1958.

Entretanto, surgia a candidatura do General Delgado, que, apesar das suas posições conservadoras, desencadeou uma corrente de entusiasmo popular, centenas de milhares de trabalhadores urbanos e elementos da pequena burguesia eram arrastados pela perspectiva do golpe militar iminente e viam no general o seu salvador. A campanha de propaganda é uma sucessão de grandes manifestações de rua (mesmo nas regiões tradicionalmente afastadas da luta política), que tendem a endurecer perante a repressão.

Ao mesmo tempo, as candidaturas de Arlindo Vicente, apesar das suas reivindicações sociais, que lhe deram o apoio dos trabalhadores no Alentejo e Margem Sul, toma uma direção moderada, hesitante e pacifista, impedindo a coesão da corrente revolucionária do proletariado. O Partido começa de novo a ficar na retaguarda do movimento.

12 — Quando os trabalhadores começam a apedrejar a polícia nas ruas (Lisboa, Almada, Aljustrel, Olhão), o Partido não esboça qualquer ação no caminho da violência.

Dentro da sua linha de fazer do proletariado a força de pressão do movimento, organiza sessões, agitação escrita, comissões, mas não vai além disso. A assembleia operária, que reúne legalmente em Lisboa, comissões cerca de 300 delegados operários e formula diversas reivindicações, está muito em atraso sobre as exigências da situação. O Partido não aproveita a ocasião para formular as reivindicações revolucionárias do proletariado e campesinato, a fim de não prejudicar a Unidade.

A unificação das candidaturas, feita mediante algumas declarações vagamente democráticas de Delgado, reforça a expectativa geral no golpe militar. E quando após a burla eleitoral, o movimento liberal revela a incapacidade revolucionária que lhe é própria e não consegue sequer desencadear o golpe, o Partido fica desarmado e, como única forma de protesto, propõe um dia de luto.

Em Julho, quando se torna evidente que o movimento burguês se malogrou e que o Partido não tem uma linha própria, alguns setores proletários mais avançados na zona de Almada lançam-se na greve de protesto contra a burla eleitoral; é a primeira greve política sob a ditadura fascista. Mas o apoio tardio e inseguro do Partido, o ambiente geral de derrota entre as massas, levam a greve a extinguir-se sem consequências, depois de se ter propagado a algumas fábricas de Alhandra.

13 — Na reunião da Comissão Política do C. C. (Agosto de 1958), Jaime Serra apresenta um informe em que procura justificar a linha da “solução pacífica” e os graves erros cometidos pela direção do Partido nos meses anteriores. Pretende desculpar a expectativa do Partido com o argumento de que, se se tivesse dito antecipadamente às massas que as eleições iam ter uma burla, ter-se-ia cortado o seu entusiasmo; isto confirma que o objetivo do Partido era usar a classe operária como força de pressão e não levá-la a tomar direção consciente do movimento antifascista.

Após esta reunião, o Partido fez esforços frenéticos para conjugar de novo o movimento de massas com o movimento liberal burguês, seguindo umas vezes a tática da pressão, outras a do seguidismo; explora o movimento económico, tentando conduzi-lo a greve, mas sem êxito, a não ser no Couço, onde os trabalhadores rurais acompanham a greve com ações espontâneas de sabotagem; fomenta a criação dum novo organismo unitário, a Junta Nacional de Libertação (JNL), cuja atividade é reduzida, devido ao afastamento da Ação Democrato-Social (liberais), de momento desinteressada da colaboração com o Partido; lança uma vasta campanha de assinaturas pela demissão de Salazar; apoia o projetado golpe militar de Maio de 1959, para o qual se propõe fornecer combatentes embora não intervenha na sua direção; agita a ideia duma “jornada nacional pacífica” pela demissão de Salazar, que cai no meio da indiferença popular.

À medida que o movimento de massas decresce, a direção do Partido acentua a sua dependência para com a oposição burguesa; ora apela para a “união dos portugueses xxxxx” (2) a fim de “poupar mais sofrimentos ao nosso povo”; ora tenta assustar os grupos burgueses com o espantalho da revolução, caso não atuem rapidamente (manifesto de Julho de 1959); ora, pede aos operários que para facilitar a “solução pacífica”, dirijam a luta económica principalmente contra o governo e não contra os capitalistas (artigo de Dias Lourenço, “Acerca da solução pacífica”, “Militante”, 1959).

14 — O Partido decompõe-se também no campo orgânico. As organizações operárias locais esboçadas no decurso da agitação política desagregam-se logo que os operários se apercebam da política de colaboração de classe e de pacifismo seguida pelo Partido. Os setores operários que permanecem ligados ao Partido são os que estão mais amarrados às tendências reformistas.

Aventureiros e carreiristas sem consciência de classe são chamados a cargos responsáveis apenas porque são de origem operária, para darem crédito ao Partido entre os trabalhadores (Marinho, Amador, José Miguel etc.) ............. o Secretariado, a confusão ideológica, a tolerância nas correntes e grupos, o liberalismo, a anarquia e as rivalidades pessoais criam o perigo de cisão eminente no C. C. O partido clandestino torna-se mais vulnerável à medida que o rigor conspiratório se dilui. A traição J. Martinho provoca a prisão de Jaime Serra, Joaquim Pedro Soares, a perda duma tipografia etc. (Dez. 1958). São também presos Guilherme Carvalho, Alda Nogueira, Sofia, Ferreira, Rogério ......., Inglês etc. (Blanqui Teixeira, preso em 1957 evade-se no ano seguinte). O Partido corre o risco de se desagregar novamente.

15 — A evasão de Peniche (Jan. 1960) restabelece temporariamente a situação do Partido, reintegrando um grupo de dirigentes, entre os quais sobressai A. Cunhal, e que inclui J. Serra, Joaquim Gomes, P. Soares, Guilherme Carvalho. O prestígio de Cunhal, após de 11 anos de prisão, a autoridade que resulta de não ter estado envolvido na linha ultradireitista, permitem-lhe conduzir um trabalho de consolidação do aparelho dirigente em risco de desagregação: põe termo às tendências fracionistas e liberais no C. C., restabelece a autoridade do Secretariado, impulsiona o retorno às normas do centralismo democrático (Relatório “A tendência anarco-liberal no trabalho de direção”, aprovado na reunião do C. C., de Dez. 1960). No trabalho “Ensinamentos duma série de traições”, critica a invasão do carreirismo e o liberalismo na promoção dos quadros, e defende um revigoramento de firmeza na PIDE.

Apesar de sofrer em 1960 três baixas no quadro dirigente (Francisco Miguel, J. Fogaça e Cândida Ventura) e uma outra no princípio de 1961 (Guilherme Carvalho), o Partido recupera a unidade da direção e alarga a capacidade política. Para isso contribui primeiramente a retificação da linha política, conduzida por Cunhal.

16 — A reunião do C. C., de Março de 1961, aprova o relatório de Cunhal sobre “o desvio de direita nos anos 1956-59” e uma declaração política restabelecendo a linha do levantamento nacional. Elege também Álvaro Cunhal secretário-geral do Partido.

O relatório sobre o “desvio de direita” critica a sucessão de cedências e desvios ultradireitistas de 1956-59 expressos na linha “solução pacífica”, e nomeadamente, a crença na desagregação do regime, a expectativa no putenismo[sic - putschismo??], a consigna da “jornada nacional pacífica” e ultra-oportunismo sindical; mostra que a linha da “solução pacífica” era uma rendição da “política de transição” condenada pelo 2º Congresso ilegal e acusa-a de por o movimento operário ao serviço da burguesia oposicionista; critica além disso publicamente Fogaça e P. Soares (de forma bastante moderada e conservando-os no C. C.) Fogaça é expulso pouco depois por questões morais.

A declaração política condena o pacifismo e as “tendências terroristas” como igualmente prejudiciais ao movimento democrático “e define o levantamento nacional como a conjugação da ação ...... patriotas” com o movimento de massas ”em que uma greve geral política poderá ter importante papel”.

17 — A reunião de Março de 1961 põe termo ao aventureirismo ultra-oportunista de 1956-59, que ameaçava liquidar a influência do Partido. Contudo ela está muito longe de ser uma viragem no sentido do marxismo-leninismo e da defesa dos interesses revolucionários da classe operária. Nenhum dos problemas vitais do Partido é abordado; restabelecimento da ligação com o proletariado, questão camponesa, deturpação do caráter da revolução, preparação das causas populares para a insurreição antifascista, aliança de combate com os povos das colónias.

A reunião tem mesmo um caráter direitista acentuado que condena as tendências para a violência que começou a esboçar-se nas massas. Em realidade a retificação política de 1960-61 visa restabelecer ........ capacidade da mobilização da massa do Partido, para poder exercer uma pressão mais eficaz sobre a burguesia liberal, mas nada contém que permita ao Partido retocar o seu lugar de direção revolucionária do proletariado. A retificação de 60-61 é um reajustamento de tática ao serviço da política reformista.

18 — O fato da direção do Partido condenar o pacifismo, ......oportunismo e de afirmar a perspectiva geral do levantamento armado, põe em marcha forças não existentes no Partido e obriga a retrair temporariamente os elementos direitistas. Em certos setores operários estabelece-se a ideia de que o Partido vai enveredar por um caminho revolucionário: há um movimento de aproximação do Partido: elementos de ....... tomam a iniciativa de executar um traidor (J. Miguel, 1961).

No aparelho dirigente forma-se um movimento entre os elementos mais jovens de aproximação do marxismo: estudo da luta de classes e do caráter da revolução, estudo da questão camponesa, crítica à política de aliança operário-burguesa, combate ao pacifismo; é editado o “Manifesto Comunista” e outros textos; prepara-se a reconstituição da Juventude Comunista, sob a direção de Carlos Costa. No esforço para encontrar as raízes do desvio-ultra-oportunista de 1955-59, certos elementos como Francisco Rodrigues, começaram a por em causa a linha tradicional da “Unidade”.

Mas esta corrente que começava a esboçar-se, não tem continuidade. Álvaro Cunhal e o grupo dirigente que o cerca (em que se destaca Pires Jorge, Octávio Pato, Sérgio Vilarigues, Dias Lourenço, Blanqui Teixeira, Joaquim Gomes, Alexandre Castanheira) após ter pago o tributo à esquerda e recuperado o crédito, renegam a política de direita.

19 — A linha política é dominada por um novo esforço da Unidade, com vistas às “eleições de deputados”. A linha de 1956-59, dirigida para a atração dos fascistas descontentes, tinha levado o Partido a descurar a aliança com a ADS; Cunhal procura reconstituir um organismo unitário com os liberais, restando a tradição do MUD e para isso toma diversas iniciativas: publicação de documentos apelando para a Unidade, entre eles, “Unidade, tarefa central da hora atual”; orientação do Partido para conversações em todos os escalões com os políticos liberais (Maio de 1961), reconciliação com elementos titistas e socialdemocratas, como Piteira Santos, que servem de intermediários na aproximação com os liberais; e por fim, criação da Junta Patriótica (1961).

20 — Entretanto a corrente revisionista internacional chefiada pelos dirigentes da URSS, abria fogo contra a oposição marxista-leninista do P. C. da China e do P. do Trabalho da Albânia (reunião de Bucareste, Junho de 1960); iniciava-se uma ofensiva direitista em grande escala no movimento comunista internacional.

Correspondendo às pressões revisionistas, Cunhal faz publicar o documento “Três problemas da atualidade” (Agosto de 1960), no qual critica o “bonapartismo daqueles que querem fazer triunfar a revolução por meio da guerra”, numa alusão ao P. C. da China que não é compreendida, porque então se desconhecia ainda em Portugal a situação no movimento comunista. Também desde 1960, Cunhal começa a multiplicar os alertas contra o “esquerdismo” (artigo no “Militante”) e contra o “Terrorismo” (após um quarto de século de ação puramente pacífica contra a ditadura e sucessivos desvios direitistas).

Em 1961 a pressão revisionista internacional intensifica-se. O acolhimento na URSS e nos partidos europeus ao relatório sobre “O desvio da direita nos anos 1956-59” é mais do que reservado: a revista internacional “Problemas” recusa-se a publicá-lo: os dirigentes revisionistas espanhóis, sentindo-se atingidos pela crítica à “jornada nacional pacífica”, exigem explicações. A degeneração revisionista de Cunhal (que nesse ano se instala na Europa revisionista) amadurece rapidamente em Set. 1961 apoia as novas teses do 22º Congresso do PCUS (“Estado de todo o povo”, “Partido de todo o povo”) e ataca publicamente a Albânia socialista.

21 — Em Fevereiro 1961 inicia-se a insurreição nacional de Angola; em Agosto de 1960 começara a insurreição na Guiné. As insurreições nacionais nas colónias (que em 1963 se estendem a Moçambique) abrem a crise geral do regime capitalista português, que foi construído e está cimentado sobre a exploração do trabalho escravo. A ditadura atravessa a maior crise política da sua história.

Dá-se um movimento de pânico nos meios da burguesia colonialista. Rebentam divergências nos círculos financeiros quanto à condução da política colonial e um grupo tenta opor-se ao começo da guerra (Botelho Monis, Abril). Forças da oposição burguesa no exílio desencadeiam o golpe do “Santa Maria”. O Diretório democrato-social (ADS) realiza uma importante reunião nacional, lança o “Programa para a democratização da República” e alarga a sua influência política. A agitação alastra nos meios da burguesia oposicionista, entre os estudantes, e, de forma subterrânea, entre as massas trabalhadoras.

22 — O começo das insurreições coloniais abriu novas perspectivas revolucionárias ao movimento operário e trouxe novas obrigações ao Partido do proletariado.

A direção revisionista de Cunhal, ao mesmo tempo que afirma a sua adesão às insurreições nas colónias e lhes reconhece o direito à independência, procura utilizar o movimento de libertação colonial como mais uma força de pressão sobre a burguesia liberal: em Março de 1961, o C. C. define a sua linha na questão colonial com um manifesto “unitário” e moderado, em que apaga a importância das insurreições armadas; a direção do Partido hesita em trabalhar pela subversão do exército fascista e toma posições ambíguas numa série de questões (organização militar, agitação contra a guerra, deserções, sabotagem); o esforço para em comunidade da Junta Patriótica condenando o terrorismo de brancos e negros (Tribuna livre”, Set. 1961).

O desejo de prestar solidariedade aos povos das colónias sem assustar a burguesia liberal nem por em causa a Unidade, leva a direção do Partido a declarações humanitárias e à expectativa em face dos massacres. Isto acentua a degeneração geral do Partido.

23 — A agitação causada pela guerra, a atividade dos grupos de oposição, a confusão e a crise no campo fascista, abrem caminho a poderoso movimento de massas, que estende de Out. 1961 a Maio de 1963, e tem uma grande importância na evolução do movimento operário.

Durante a campanha das “eleições de deputados”, muitos elementos, entre eles trabalhadores, aproximam-se do Partido, procurando o apoio do seu aparelho clandestino para atuar organizadamente. As manifestações políticas, iniciadas pelos estudantes de Lisboa, começam a estender-se na população e alastram a várias cidades, culminando na grande manifestação operária de Almada (11 Nov.), em que é morto o operário Camilo. Estas manifestações, pouco numerosas e pouco combativas ainda (à exceção da de Almada), têm características novas: ao contrário de 1945-49 e mesmo 1958, elas não seguem a voz de chefes burgueses liberais que se eclipsaram da cena; nalgumas, sobretudo em Almada, as massas começam a reclamar armas para enfrentar a repressão. O movimento dá um grande passo em frente, deixando à sua retaguarda os (...) liberais.

24 — Após as manifestações de Outubro-Novembro, os trabalhadores da região de Lisboa, Margem Sul e Alentejo (e mesmo isoladamente no Norte) pressionam o Partido para que organize ações armadas contra a ditadura, procuram armar-se, esboçam sabotagens; este movimento, ainda indeciso, por efeito de um quarto de século de pacifismo é perfeitamente sensível. Como a direção do Partido não corresponde a esta tendência e se opõe terminantemente a ela, certos grupos operários voltam-se para os meios da nova oposição radical burguesa que se definiu durante as “eleições” e um punhado de operários de Almada-Barreiro (na maioria membros do Partido) acaba por seguir os oficiais no assalto ao quartel de Beja (1 de Janeiro de 1962) prontamente sufocado.

O fato dos operários na prática passarem por cima da direção do Partido marca uma nova etapa na dissociação entre o Partido e o movimento operário. A participação operária na ação de Beja mostra também que o movimento operário, sem direção revolucionária própria, corre o risco de, virando costas ao oportunismo de direita, cair sob o controle de aventureirismo pequeno-burguês.

25 — A ação de Beja, apesar do seu fracasso, desperta novas energias nas massas trabalhadoras e na pequena burguesia, pelo fato de ser a primeira tentativa armada contra a ditadura, após um intervalo de 25 anos.

Uma grande manifestação política de massas é desencadeada no Porto, no apelo dos manifestos do Partido e apesar da boicotagem dos chefes republicanos (31 Jan. 62) a manifestação de 8 de Março confirma o declínio da influência dos caciques liberais no Porto, cidade que era um seu feudo tradicional.

Em Lisboa após uma campanha de agitação massiva organizada pelo Partido, realiza-se a grande manifestação de 1º de Maio. Uns 50 mil manifestantes ocupam o centro da cidade, gritando “temos fome” e “Abaixo a guerra”, e apedrejando a polícia. A participação operária não é tão acentuada como na manifestação de Almada; grande massa de jovens (operários, empregados, estudantes) formam o núcleo da manifestação. Há também manifestações noutras cidades.

Quase ao mesmo tempo o proletariado rural alentejano, sob a orientação dos agitadores do Partido, transforma as greves locais das ceifas numa grande greve envolvendo mais de 100 mil trabalhadores, que conquista as 8 horas de trabalho em várias regiões.

Estes dois movimentos são simultâneos com a greve e manifestações de estudantes contra o controle fascista da universidade, que é duramente reprimida, causando grande descontentamento e agitação em certos setores da burguesia.

Depois disto, o Partido convoca ainda manifestações políticas pelo 8 e 28 de Maio, numa tentativa de prolongar o movimento, mas, à exceção do 28 de Maio em Setúbal a população corresponde em menor escala e o movimento começa a refluir.

26 — O Partido organizou e conduziu as manifestações nas cidades e a greve dos camponeses. A manifestação de Novembro em Almada, e a ação de Beja haviam mostrado estar a direção do Partido a ficar ultrapassada pelas massas, como acontecera aos chefes liberais. Por isso, e apesar do grande golpe policial de Dez. 1961 (prisão de Pires Jorge, Octávio Pato, Carlos Costa, Américo de Sousa) a direção do Partido faz um grande esforço para estabelecer ligações com as massas e canalizar a combatividade popular para sucessivas manifestações, que exerçam uma ...... sobre a burguesia liberal e precipitam o “levantamento .......”

Esta forma de oportunismo ativo (neste período representado por Dias Lourenço e José Magro, como antes teria sido por Pires Jorge e Octávio Pato) consegue êxitos iniciais, dado que muitos trabalhadores se aproximam do Partido e, confiantes ainda, apesar das jornadas de Novembro-Dezembro, na correção do direitismo.

Mas cedo se manifesta que a linha do Partido é repetir as manifestações, sem as deixar sair do plano pacífico. Todas as tendências surgidas entre as massas e na base do Partido para organizar a autodefesa do 1º de Maio são rejeitadas com o argumento de que as massas recorrerão espontaneamente a ações violentas se o entenderem: assim, não se reúnem armas, não se preparam explosivos, não se treinam brigadas. Os ativistas reprimem as iniciativas de base, com receio de serem acusados de “terrorismo” pela direção. Mesmo à proposta para bloquear as ruas com autocarros para deter as cargas da política é rejeitada. No Alentejo, tentativas de assalto e sabotagens são reprimidas pelos responsáveis.

Assim a partir de 1º de Maio, as massas recusam-se a continuar as manifestações, em que já não veem objetivos, e o movimento declina mais uma vez sem ter chegado a desenvolver as suas potencialidades. A atividade da direção do Partido neste período pode definir-se como o esforço para não deixar escapar a direção do movimento de massas, conservando-o nos limites pacíficos necessários à política da Unidade.

27 — O aparelho clandestino do Partido termina 1961 com um êxito espetacular, a evasão de Caxias de Francisco Miguel, José Magro, Guilherme Carvalho, António Gervásio, Domingues Abrantes, Ilídio Esteves logo seguido dum grande golpe parcial sobre o Secretariado e o aparelho central: prisão de Pires Jorge, Octávio Pato, Carlos Costa, Américo Sousa etc., o assassinato de Dias Coelho. Entre as baixas sofridas nos meses seguintes, após as manifestações, avultam as de José Magro e António Dias Lourenço.

A continuidade da direção é assegurada pelo Secretariado, de A. Cunhal e S. Vilarigues (no exterior) e F. Blanqui Teixeira, mas o aparelho clandestino central, privado dos seus elementos mais experientes, entra num período de grandes dificuldades, agravadas pela perda de influência política após as manifestações. As últimas bases proletárias com alguma vitalidade, na Margem Sul do Tejo e no Alentejo, tendem a dispersar-se lentamente. O recrutamento operário é mínimo, o número de operários de fábrica e de células de fábrica é muito reduzido. Uma campanha de recrutamento conduzida em 1962-63, tem por efeito abrir mais as portas do Partido a elementos de fraquíssima consciência de classe, a muitos estudantes etc. A capacidade política orgânica e conspiratória do Partido desce regularmente.

28 — Depois de ter travado as formas superiores de luta no período de ascenso, a direção do Partido faz um grande esforço por incentivar a luta económica no período seguinte para se assegurar uma base política de massas que lhe dê voz ativa, para pressionar a burguesia liberal e convencê-la à Unidade, para impedir o reagrupamento dos operários que escapam à sua influência. O “Avante” e os jornais regionais “Corticeiro”, “Têxtil” e “Camponês” acentuam a propaganda reformista da luta económica, exagera os resultados das ações desencadeadas, insistem nas formas tradicionais (comissões de unidade, abaixo-assinados, idas aos “Sindicatos”) que em muitos casos não correspondem já às exigências dos trabalhadores; em Janeiro de 1963 é lançada larga campanha nacional pela concorrência às “eleições sindicais”, tentando fazer reviver o movimento em torno dos SN, mas sem qualquer êxito, dado o desinteresse da classe operária.

Apesar do agravamento da situação económica provocado pela guerra colonial, a ação das massas é reduzida e dispersa. O movimento grevista continua a não entrar nas fábricas (greves dos passadores de Algarve e das pedreiras de Pero Pinheiro, 1965). As causas principais desta dispersão são: a grande crise ideológica na vanguarda operária pela expansão do revisionismo à escala internacional, o quase desaparecimento das células e dos ativistas operários, que anteriormente organizavam a ação económica nas fábricas, a falta de sindicatos; o aprofundamento do foco entre a vanguarda operária (ela própria desorganizada) e as novas massas proletárias recrutadas no campo. O movimento operário atravessa profunda crise ideológica, política e orgânica, pelo fato de não dispor já do seu partido de Classes.

29. Após o movimento de 1961-62, consolida-se a política direitista e completa-se a transformação do Partido num destacamento do movimento revisionista internacional, sob a direção de A. Cunhal (fixado na Europa revisionista), secundado por S. Vilarigues, Blanqui Teixeira, Alexandre Castanheira, Joaquim Gomes, Jaime Serra, Pedro Soares, Francisco Miguel.

No plano nacional, o grupo revisionista, aproveitando o prestígio ganho junto da burguesia liberal com as manifestações, consegue desta o acordo para a criação da Frente Patriótica de Libertação Nacional (FPLN) em Dez. 1962, com a qual espera poder exercer uma pressão mais eficaz para o “levantamento nacional”; na nova onda de ilusões ultra-oportunistas geradas pela FPLN, o C. C., aprova, na sua reunião de Janeiro de 1963, o documento de Cunhal “Perspectivas da luta nacional”, onde a política da Unidade e a atração dos fascistas descontentes tem um lugar absorvente, ao mesmo tempo que se apaga o papel das ações de massas, se combate o “sectarismo” e se abandonam quaisquer reivindicações revolucionárias, o ultra-oportunismo deste documento provoca uma onda de críticas na organização.

No plano internacional, o grupo revisionista apoia a política aventureira e capitulacionista de Krutschov no caso de Cuba, esforça por fazer silêncio em torno da guerra do Vietnam, “para não prejudicar as perspectivas de coexistência pacífica”, e envolve-se em ataques cada vez mais abertos e violentos contra a China, a Albânia, e o movimento comunista internacional (intervenção de F. Miguel no Congresso do Partido revisionista alemão, Janeiro de 1963).

30 — O progresso da degeneração revisionista provoca uma corrente no interior do Partido, dirigida contra a “Unidade”, contra o pacifismo, pela solidariedade à China e ao movimento marxista-leninista internacional. Da luta de tendências que se trava no Partido em 1962-63 “esquerdistas”, “terroristas” e “dogmáticos”, entre eles Francisco Rodrigues, do C. C. A pequena envergadura da oposição marxista-leninista neste período pode explicar-se pelo fato de o Partido ter sido gradualmente depurado das tendências revolucionárias desde 1945 e mesmo na fase anterior à linha da Unidade.

O Partido sofre um novo e sério golpe em Maio de 1963 pela traição de R. Verdial, que origina a prisão de Blanqui Teixeira, Guilherme Carvalho, José Carlos, Jorge Araújo etc. Entretanto, a integração de algumas dezenas de militantes jovens, formados sob a direção de A. Cunhal, consagra a nova fase do Partido como organização socialdemocrata e pacifista e elimina os vestígios proletários revolucionários que ainda subsistiam.

31 — Entretanto uma crítica revolucionária nas fileiras do Partido e no movimento comunista internacional, o grupo revisionista dirigente faz um novo passo ao seu amadurecimento, e procura elaborar uma plataforma “marxista” que sirva de cobertura à sua linha. Essa plataforma é a linha da “revolução democrática nacional”, esboçada na reunião de Agosto de 1963 do C. C. e desenvolvida no relatório “Rumo à Vitória” é o mais importante documento teórico do revisionismo português, até à data. Encontram-se aí numerosos slogans revolucionários que a linha da Unidade havia omitido: conquista do poder, ditadura do proletariado, aliança com o campesinato, insurreição etc. Contudo, para além desses slogans, a “revolução democrática e nacional” define-se com uma linha de liberalização burguesa e um rompimento total do marxismo.

32 — “Rumo à Vitória” opõe-se a uma política proletária revolucionária em todas as questões fundamentais:

  1. caráter da revolução — nega o caráter dominantemente socialista e proletário da revolução desde a sua etapa atual; inventa a “revolução democrática e nacional”, em que atribui um papel revolucionário não só ao proletariado e campesinato trabalhador, mas também à pequena burguesia e a “certos setores da média burguesia;
  2. conquista do poder — falsifica a análise leninista sobre a conquista do poder político, não definindo que classes assumirão o poder nem o caráter de classe do novo aparelho estatal (conquista do poder pelas “forças democráticas”, criando um exército “democrático”, uma política “democrática” e uma justiça “democrática”);
  3. ditadura do proletariado — elimina a instauração da ditadura sobre as classes exploradas, inventando uma primeira etapa “democrática e nacional”, em que o poder será simultaneamente proletário e burguês (poder das “forças democráticas”), passando depois pacificamente ao socialismo, “sem necessidade de insurreição”;
  4. direção proletária da revolução — substitui a contradição de classe fundamental proletariado—burguesia pela contradição entre os monopólios e “todo o povo”, apagando a luta entre o proletariado e a burguesia liberal, reclama que “se concentre o foco contra o esquerdismo e sectarismo, perigos principais do momento”; a Unidade é a “tarefa central do Partido”; dá grande destaque à importância da luta económica: “a utilização dos SN pode vir ainda a tornar-se muito mais importante”;
  5. Aliança com o campesinato — entrega a direção do campesinato médio à burguesia liberal (“elementos geralmente tidos por representantes da intelectualidade, representam social e politicamente as camadas médias do campesinato”);
  6. insurreição popular antifascista — os trabalhadores não devem armar-se nem criar o seu próprio exército para uma luta prolongada pelo poder; o “levantamento nacional” será fruto dum “momento insurrecional” em que “os militares patriotas têm um importante papel a desempenhar”; combate o “terrorismo” e o “aventureirismo”; “em condições imprevisíveis”, é mesmo possível o afastamento da ditadura por meios pacíficos;
  7. aliança com os povos coloniais — apaga o papel das insurreições nacionais da colónias, que prejudicam a linha geral da Unidade e da coexistência pacífica; levante reivindicações ultrapassadas e reacionárias (libertação dos presos políticos das colónias, instauração das liberdades democráticas nas colónias).

Embora referindo-se secundariamente às questões internacionais, “Rumo à Vitória” confirma as posições tomadas anteriormente: linha geral de consistência política, ataques à China e ao movimento comunista, apoio a reformismo e à socialdemocracia.

33 — No período de 1964-66, lançada na luta contra as tendências revolucionárias, a direção revisionista acentuou a sua deslocação para a direita.

Em 1964 lança violenta campanha contra as novas organizações revolucionárias criadas nesse ano, o Comité Marxista-Leninista Português que prepara a reconstituição do Partido Comunista, e a Frente de Ação Popular (FAP), organização popular antifascista que se contrapõe À FPLN; na luta contra estas organizações, recorre mesmo à acusação de “provocação” e à denúncia no “Avante” de militantes na clandestinidade.

Por outro lado, em Junho de 1964, o “militante” condena publicamente as organizações regionais de Lisboa, Margem Sul e Alentejo por, na preparação do 1º de Maio, terem tomada iniciativas de autodefesa, realizado sabotagem e reunido armas. O C. C. acentua a sua campanha nas fileiras do Partido contra o “perigo terrorista” e afasta os elementos recalcitrantes.

Ao mesmo tempo a direção compromete-se mais ainda aos olhos dos trabalhadores, ao abandonar todas as reservas e lançar-se numa campanha anti-chinesa declarada, em seguimento dos dirigentes do PCUS.

A FPLN, de que muitos trabalhadores menos conscientes esperavam a intensificação da luta contra a ditadura, desprestigia-se devido à sua inação e às lutas de prestígio que culminam com o afastamento do general Delgado em Out. 1964.

34 — O Congresso do Partido (Set. 1966) — aprovou um novo Programa e Estatutos e elegeu um Secretariado composto de A. Cunhal, S. Vilarigues e Manuel Rodrigues da Silva (libertado em 1964). A linha do 6º Congresso é a confirmação da linha reformista de “Rumo à Vitória”. Expressões marxistas isoladas e promessas demagógicas (como a expropriação dos monopólios e do capital estrangeiro, a distribuição da terra aos camponeses, a elevação do nível de vida e de cultura das massas) encobrem a oposição a qualquer forma de ação proletária.

A linha real do Programa pode resumir-se nestes pontos:

  1. favorecer a liberalização burguesa e embelezá-la sob cores revolucionárias;
  2. cortar o caminho à insurreição popular e à ditadura democrática popular amarrar o proletariado à luta económica e ao pessoal de forças de choque na luta política;
  3. afastar o proletariado do marxismo-leninismo, impedir a reconstrução do Partido Comunista;
  4. manter o campesinato como força de pressão e parcialmente como reserva política da burguesia liberal;
  5. procurar manter as revoluções coloniais nos limites favoráveis a liberalização burguesa;
  6. opor-se ao movimento revolucionário mundial, favorecer a “coexistência pacífica” e as reformas.

Concluído o seu processo de degeneração, o Partido revisionista chefiado por Álvaro Cunhal rompe os últimos laços que o uniam aos interesses do movimento operário, e transforma-se definitivamente num partido burguês da classe operária, segundo a expressão de Lenine, ou seja, um partido especializado na tarefa de subjugar o proletariado à política burguesa.

36 — Características deste período — crescimento e concentração do proletariado a partir de 1950 (que contribuiu para a sua desorganização temporária, pela afluência de novos contingentes e pela mudança de estrutura) está a dar um novo peso ao movimento operário no conjunto da luta de classes.

Desde 1956, a corrente de direita que lutava para controlar o Partido Comunista (e que fora contida no período de 1950-54), conseguiu grandes progressos apoiada externamente pela irrupção do revisionismo moderno na URSS, e internamente no ascenso do movimento democrático burguês. Os importantes movimentos de massas de 1958 e de 1961-62 obrigam a amadurecer as tendências direitistas, que travam a passagem da luta popular a formas superiores, e se revelam como um instrumento para a utilização do movimento operário ao serviço da liberalização burguesa.

Entretanto, o início da grande luta internacional entre a corrente marxista-leninista chefiada pelo P. C. da China e a corrente revisionista moderna chefiada pela direção do PCUS, reflete-se sobre o movimento operário português e acelera a degeneração revisionista do grupo dirigente de A. Cunhal. Deixa de existir um Partido Comunista do proletariado português.

VI - O Ressurgimento da Corrente Comunista

1 — A experiência dos movimentos de 1961-62 e a luta de princípios no movimento comunista internacional ativam em diversos setores operários a reação contra o pacifismo, o oportunismo e o reformismo. Dentro e fora do Partido dão-se tentativas dispersas para encaminhar a luta antifascista num sentido revolucionário. Em Abril de 1964, ao mesmo tempo que .........., em “Rumo à Vitória”, negam que existam quaisquer tendências para a violência entre as massas, diversas organizações de base do Partido na Margem Sul, Alentejo e Lisboa tentam organizar atos de sabotagem e ações armadas pelo 1º de Maio. As ações, que têm pequena envergadura, por absoluta falta de experiência, puseram em relevo a necessidade de preparar os militantes para a luta armada; mas o “Militante” de Junho faz uma severa condenação das organizações regionais do Alentejo, Margem Sul e Lisboa, como penetradas de “graves desvios esquerdistas”.

Os incidentes do 1º de Maio de 1964 e os ataques públicos da direção revisionista ao PC da China apressam a dissociação entre a base trabalhadora do Partido e a direção. As greves de Pero Pinheiro e dos pescadores do Algarve, em 1965, confirma a tendência dos trabalhadores para passar aos choques com as forças repressivas, apesar da viva oposição da direção revisionista.

2 — A criação do Comité Marxista-Leninista Português (Abril de 1964) inicia o período de ressurgimento da corrente comunista e da luta pela reconstrução do Partido Comunista. No seu órgão “Revolução Popular” o CMLP definiu as bases gerais duma política comunista:

  1. a revolução portuguesa é uma revolução socialista, tomando na sua primeira etapa a forma duma revolução democrática popular, ou seja, uma revolução dirigida contra a grande burguesia e o imperialismo e realizada através da ditadura dos operários e camponeses;
  2. a tarefa essencial dos comunista é preparar o proletariado em bloco com os camponeses para a luta pelo poder;
  3. se o proletariado e as massas populares tomarem a cabeça da luta antifascista e recorrerem à violência organizada contra a ditadura, eles abrirão o caminho à democracia popular;
  4. todas as camadas da burguesia se opõem em maior ou menor grau à marcha da revolução democrática popular e devem ser neutralizadas;
  5. o movimento operário tem que se desembaraçar do direitismo e do revisionismo, da política de Unidade com a burguesia liberal e da linha de ‘revolução democrática e nacional”, ou seja, de esperança na democracia burguesa;
  6. os comunistas têm que se reagrupar fora do Partido revisionista, lutar contra a sua influência e reconstruir o Partido Comunista;
  7. rompimento aberto com o revisionismo moderno chefiado pela direção do PCUC, unidade com o PC da China e o movimento marxista-leninista internacional.

3 — Em Janeiro de 1964, por iniciativa de um núcleo de comunistas é constituída a Frente de Ação Popular, com o objetivo de reagrupar as tendências revolucionárias antifascistas, orientá-las no sentido da democracia popular, servir de elo de ligação entre o Partido Comunista a reconstruir e as largas massas populares. Contra a política dos compromissos pelo todo que caracteriza a FPLN, a FAP propõe desencadear a iniciativa popular pela conquista das suas reivindicações fundamentais: Liberdade, Paz, Pão, Terra, Independência. O jornal da FAP, “Ação Popular” inicia a agitação da linha revolucionária entre as massas populares e faz a propaganda da luta armada contra a ditadura.

Em Novembro de 1965, os GAPs (Grupos de Ação Popular) da FAP atuam pela primeira vez contra as instalações da polícia, por ocasião das “eleições de Deputados”, e um informador da PIDE é julgado e executado. A FAP populariza-se rapidamente entre as massas.

4 — Até agora, os progressos da corrente marxista-leninista portuguesa e das forças revolucionárias que ela ocasiona tem sido lentos e cortados de graves dificuldades. O fato de ter vigorado durante 20 anos quase sem interrupção uma linha reformista na direção do Partido, que acabou por levar à degeneração deste, aliado ao trabalho de repressão burguesa, levou as forças revolucionárias do proletariado a uma profunda desorganização.

A corrente comunista que forma o CMLP e que serve de eixo à FAP é reduzida e ainda não formou quadros a altura das exigências. Diversos erros de organização e na escolha de quadros levaram a sérios golpes policiais sobre o CMLP e a FAP, atrasando o crescimento das tendências revolucionárias.

Após a definição das linhas gerais duma política comunista (realizada em 1964-65), a principal tarefa dos comunistas portugueses é a ligação ao proletariado, como base da reconstrução do Partido Comunista.

VII - Algumas Experiências do Nosso Movimento Operário

1 — Sem a direção do Partido Comunista guiado pela teoria marxista-leninista o proletariado não pode libertar-se da exploração capitalista. Os interesses de classe do proletariado exigem a instauração do socialismo e do comunismo, mas esse objetivo só pode ser atingido por uma ação centralizada e consciente, baseada num conhecimento científico da luta de classes, ou seja, por meio dum partido marxista-leninista.

Entregue ao movimento espontâneo, o proletariado tende a encerrar-se no sindicalismo e a oscilar entre o oportunismo de direita e de “esquerda” mesmo em períodos de grande atividade, como o mostra a experiência de 1910-22. Na última década, à medida que tem crescido a dispersão ideológica do proletariado por falta duma direção revolucionária, essa oscilação manifesta-se de novo com vigor crescente.

Só o Partido Comunista, organizado numa disciplina de ferro, pode coesionar toda a classe em torno do objetivo da ditadura sobre a burguesia e conduzir a luta nesse sentido através duma longa etapa histórica. Sem Partido Comunista não há democracia popular, nem socialismo, nem comunismo. Por isso a reconstrução do Partido destruído pelos revisionistas é a tarefa mais urgente do proletariado português.

2 — Toda a atividade do Partido tem de girar em torno da luta proletária pela conquista do poder; esta é a razão da existência do Partido. Não basta aceitar “em princípio” a ditadura do proletariado, o socialismo e o comunismo; os revisionistas juram-lhes fidelidade mas, alegando que essas metas são longínquas, encerram o Partido na perspectiva acanhada do dia-a-dia, põem de lado a investigação da luta de classes e a formação teórica, transformam o marxismo-leninismo numa coleção de frases correntes e vazias, arrastam o Partido para o praticismo e o oportunismo e acabam por trocar os objetivos revolucionários por uma linha de reformas. Foi assim que Cunhal e o seu grupo conduziram o Partido à degeneração.

Para garantir que o Partido não se desviará do caminho da revolução é preciso:

  1. traçar um plano concreto para a conquista do poder, baseado numa análise marxista-leninista da luta de classes;
  2. integrar todas as ações táticas nesse plano estratégico exigir que todas as tarefas parciais concorram para a meta única da tomada do poder, rejeitar as que não sirvam esse fim, não se deixar desviar pelos episódios da política burguesa, mas aproveitá-los todos para aproximar a conquista do poder pelo proletariado, falar sempre ao proletariado numa linguagem de classes e revelar em todas as etapas os interesses de classes em jogo.
  3. .......... internacional, de que a revolução só triunfará definitivamente no plano mundial.

Os dirigentees oportunistas resumiram o internacionalismo proletário à divulgação dos êxitos da construção nos países socialistas, omitiram as ricas experiências do movimento operário internacional (tanto nos países capitalistas como nos países de ditadura do proletariado), na luta contra as manifestações burguesas no seu seio; o oportunismo, o pacifismo, o reformismo; eles fecharam a luta do proletariado em perspectivas nacionais acanhadas, que tornaram mais fácil a propagação da ideologia democrática burguesa; nos últimos anos, passaram-se definitivamente para a propaganda do revisionismo e para a luta contra o movimento revolucionário mundial, fechando completamente as perspectivas da revolução ao proletariado português.

O proletariado português não pode traçar uma estratégia e uma tática acertadas se não atuar na perspectiva da época atual, a época do imperialismo, das revoluções proletárias e das guerras de libertação nacional; ela não pode marchar à conquista do poder se não se integrar no campo revolucionário conduzido pelo Partido Comunista da China; ele não pode compreender a natureza da classe do revisionismo de Cunhal nem combatê-lo eficazmente se não o vir à luz do movimento revisionista internacional. O proletariado português e o seu partido têm que se considerar destacamentos do vasto movimento mundial do proletariado revolucionário.

4. O Partido não pode ser o estado-maior do proletariado para a conquista do poder se não tiver mergulhado dentro da classe operária. O Partido tem que viver diariamente entranhado na vida da classe operária; no mar da luta de Classes, se uma organização não se integra ao proletariado, então tende fatalmente a integrar-se noutra classe qualquer, uma vez que não há posições fora das classes. Se os chefes revisionistas puderam fazer degenerar o Partido Comunista Português nos últimos anos sem encontrar uma séria oposição, isso foi devido à separação entre as células do Partido e as massas do proletariado.

Ao reconstruir o Partido, os comunistas devem implantá-lo firmemente nos centros vitais do proletariado, nas grandes concentrações operárias; eles devem também tomar em conta que os novos contingentes operários de formação recente (atualmente muito numerosos) os trabalhadores artesanais e os operários agrícolas oscilam de maneira muito acentuada entre o anarquismo e o reformismo, por lhes faltar uma experiência completa da máquina de exploração capitalista; devem ainda exercer vigilância sobre as camadas da aristocracia operária e impedir que propaguem na classe o reformismo e o individualismo pequeno-burguês.

O afrouxamento dos laços entre o Partido e o proletariado é às vezes inevitável por efeito da repressão ou por outra circunstância; mas os comunistas são obrigados a trabalhar constantemente para se unirem ao proletariado e para verificarem junto dele a sua linha política.

5 - O Partido não pode ser estado-maior do proletariado para a conquista do poder se não for uma organização proletária.

A composição social do Partido reconstituído deve ser continuamente verificada, de modo a assegurar nas fileiras e na direção uma forte maioria de operários, e sobretudo, de operários de fábrica. Os elementos originários de outras classes devem ser chamados a todos os escalões do Partido, mas só se mostram estar identificados com os interesses do proletariado, só se completarem a sua reeducação, liberando-se de pontos de vista e privilégios das classes exploradoras.

Devem tornar-se medidas para que os militantes clandestinos e todos os revolucionários profissionais não se desliguem da vida da classe operária, caso contrário, a clandestinidade e a profissionalização podem favorecer a degeneração pequeno-burguesa de bons militantes operários, como mostra a experiência dos últimos 20 anos: desligando-se da luta diária do proletariado e do povo, esses militantes perderam a consciência de classe, tornaram-se burocratas e acabaram por cair no reformismo pequeno-burguês e no revisionismo.

6 — O Partido tem que usar a ação diária como meio de educação prática do proletariado para a luta pelo poder. A ação de defesa económica, as reivindicações diárias e locais das massas, os objetivos políticos parciais, são importantes como meio de educar e de unir largas massas operárias em torno da vanguarda, e o Partido tem que conduzi-las para se acreditar e se treinar como dirigente do proletariado; nos períodos de derrota ou de estagnação do movimento de massas, as reivindicações parciais podem tornar-se mesmo o centro da atividade política do Partido.

Mas o Partido reconstituído não deverá nunca abandonar a perspectiva de que elas são um meio inferior de educação e união do proletariado e não um fim em mesmas. Os comunistas devem contrariar a tendência de vastos setores operários para transformarem o Partido num instrumento de defesa económica (tendência que torna especialmente acentuada sob a ditadura fascista). Eles devem mostrar como a tática dos oportunistas nos últimos 20 anos, de exagerar o alcance das reivindicações parciais, de inventar uma sucessão infinita de “grandes vitórias” reivindicativas, tem servido para amarrar a classe operária às ilusões reformistas e ao pacifismo, apesar de subjugada por uma rígida ditadura fascista da burguesia.

O Partido reconstituído deverá mostrar em todas as ocasiões que as melhores conquistas pelas reivindicações diárias são limitadas e contingentes e que só a tomada do poder libertará o proletariado e todos os trabalhadores.

7 — O proletariado só completa a sua educação revolucionária na luta direta pelo poder. Cada vez que o ascenso do movimento de massas leva estas a porem em causa o Estado burguês, o Partido reconstituído deverá orientá-los para a disputa do poder político, rompendo os limites legais e pacíficos; isso é essencial para completar a educação do proletariado mesmo que de momento a luta não conduza à vitória e venha a ser necessário recuar mais tarde para um nível inferior.

Nos últimos 20 anos os direitistas atuaram sempre contra esta orientação a pretexto da luta contra o “terrorismo” e contra as “ações desligadas das massas” eles transformaram a crítica marxista ao aventureirismo anarquista numa caricatura e entravaram o desenvolvimento superior do movimento operário em 1944-45, em 1958 e em 1961-62, tentando convencer os operários a separar-se indefinidamente por um “levantamento combinado com burguesia e à escala nacional”. Se o movimento de massas não é orientado para a luta pelo poder, ele tende a degenerar numa força de pressão manobrada pela burguesia liberal.

8 — O exército revolucionário é, depois do partido, a existência mais vital do proletariado. As experiências revolucionárias de muitos países e a experiência da ditadura fascista em Portugal mostram que, na época do imperialismo, a luta pelo poder é prolongada e tende a tomar a forma de guerra civil entre as forças revolucionárias e reacionárias. O proletariado e as massas populares não podem esperar pela conquista do poder para criar depois o seu exército revolucionário; ele tem que ser constituído antes, gradualmente, no decurso da luta, para tornar possível a conquista do poder. Quanto mais rígido for o aparelho estatal burguês, tanto menos o Partido pode contar sobre a espontaneidade das massas na criação do exército revolucionário; o Partido deve tomar a iniciativa de criar grupos de combate e de guerrilha no decurso dos choques das massas com o poder reacionário, ajudá-los a sobreviver e a transformá-los em células do exército revolucionário.

Se a energia revolucionária dos operários e camponeses não for orientada para a construção da sua força militar própria, os trabalhadores, sem dislumbrar possibilidades duma luta independente, tendem a esperar a decisão final da sua luta das mãos dos democratas burgueses e cair alternadamente no oportunismo de “esquerda” ou de direita; é o que tem acontecido no movimento operário português.

9 — No último meio século, o movimento operário não pode tomar envergadura revolucionária por lhe faltar o apoio do campesinato. Se nos períodos de ascenso do movimento operário, este tivesse encontrado ao seu lado os camponeses pobres em luta pelas suas reivindicações próprias, o apoio mútuo dos operários e dos camponeses teria impelido o movimento de massas no caminho revolucionário e liquidado as tendências reformistas. O adormecimento do movimento camponês e a sua sujeição à burguesia liberal tem sido um dos maiores travões à marcha da revolução em Portugal.

Os oportunistas abandonam o trabalho camponês por o campesinato ser muito menos politizado do que a pequena burguesia urbana; eles esquecem que as reivindicações do campesinato pobre são muito mais profundas do que as da pequena burguesia porque são as únicas, além das do proletariado, que tendem a destruir a estrutura burguesa existente (direito à terra, eliminação do capitalismo intermediário, destruição das autoridades burguesas. Sem o apoio ativo do campesinato pobre, o movimento agrário não tem forças para triunfar na luta armada revolucionária, tende a procurar a aliança da burguesia liberal, e no esforço para conquistar essa aliança, acaba por se encerrar no quadro das reformas da estrutura burguesa. Isso é também uma experiência do movimento operário em Portugal.

A base da política de alianças do proletariado revolucionário está em arrancar o campesinato à direção da burguesia liberal, desenvolver plenamente as suas reivindicações, conduzi-lo no caminho da ditadura popular e do desmantelamento do capitalismo.

10 — O movimento operário português não pode manter a sua integridade revolucionária se não der um apoio direto e ativo à luta de libertação dos povos oprimidos das colónias. Uma vez que o sistema capitalista português repousa sobre a exploração, não só dos operários e camponeses mas também dos povos oprimidos das colónias, o proletariado tem que ser educado diariamente pelo Partido para reconhecer nos povos das colónias o seu aliado decisivo no plano internacional.

Os dirigentes revisionistas, enleados na sua política de Unidade com a burguesia liberal, subestimaram e abandonaram o movimento de libertação das colónias, substituíram a crítica ao regime de exploração colonial pela crítica aos excessos da administração colonial fascista e embotaram o espírito internacionalista do proletariado desarmando-o contra a infiltração do chauvinismo imperialista. Nos últimos anos, quando os povos das colónias desencadearam as suas guerras nacionais de libertação, os revisionistas procuraram manter a solidariedade aos povos colónias no âmbito da aliança com a burguesia liberal e usá-los como mais uma força de choque ao serviço da “Unidade”.

O movimento operário não pode ser encaminhado numa revolucionária[sic], se os interesses da aliança com as colónias não forem postos abertamente por cima de quaisquer acordos com a burguesia liberal; no momento em que estão em curso as guerras de libertação das colónias, o proletariado português é obrigado a dar uma ajuda concreta, permanente e declarada aos povos da colónias, respeitando ao mesmo tempo a sua luta independente.

11 — O proletariado deve exercer uma vigilância permanente sobre a pequena burguesia. Em Portugal, como em geral em todos os países dependentes do imperialismo, o movimento democrático da pequena burguesia é muito ativo e em certos períodos toma mesmo uma orientação muito radical. Buscando uma base de massas, o movimento pequeno burguês procura controlar o movimento camponês e sobretudo o movimento operário e o seu partido. Esta é uma lei da luta de classes que se manifesta com muito vigor em 1944-49, em 1956-58 e em 1961-64, períodos do ascenso do movimento democrático burguês. Atualmente, a corrente comunista que prepara a reconstrução do Partido, sofre também a pressão duma corrente radical burguesa que procura pô-lo ao seu serviço na luta pelo derrubamento da ditadura. Os dirigentes direitistas não só abandonaram a vigilância perante o movimento democrático, como favoreceram mesmo a expansão da sua influência entre o proletariado, com a política da Unidade anti-salazarista. O Partido Comunista reconstituído deverá estudar a evolução do movimento democrático burguês e criticá-lo publicamente, de modo a armar o proletariado para não se deixar dominar pela ideologia radical burguesa; ele deverá lutar para que, no movimento geral antifascista, a orientação proletária revolucionária prevaleça sempre sobre a orientação democrática burguesa. A corrente democrática burguesa pode ter um papel positivo na atual etapa da revolução, mas só se o proletariado combater e neutralizar os seus aspectos reacionários.

12 — O revisionismo é o principal agente da burguesia no seio do movimento operário. O movimento operário português desenvolve-se sob uma pressão permanente (militar, política, económica, ideológica) da burguesia nacional e do imperialismo estrangeiro, que esforçam por enfraquecê-lo e desviá-lo da sua meta revolucionária; essa pressão gera continuamente dentro do Partido e do movimento operário as tendências de direita (o oportunismo, o seguidismo, o pacifismo, o reformismo, o legalismo) que, procurando evitar as dificuldades do processo revolucionário, tentam ganhar a aliança de uma outra camada burguesa e, com essa mira, acabam por abandonar o objetivo da luta pelo poder e as alianças revolucionárias do proletariado.

Dominando a direção do Partido quase sem interrupção, a corrente direitista portuguesa amadurece gradualmente as suas concepções, e acabou por degenerar no revisionismo, ou seja, a utilização consciente e sistemática do movimento operário ao serviço da burguesia. Atualmente, o grupo revisionista de Cunhal transformou-se num destacamento avançado da burguesia no seio do proletariado, que tenta conservar a confiança do movimento operário para o poder conter e manobrar; ele traiu inteiramente os interesses fundamentais do movimento operário português e do proletariado internacional.

13 — Transigir com o direitismo é preparar a liquidação do Partido. A experiência do Partido Comunista Português confirma inteiramente a experiência do movimento comunista internacional de que pretender salvar a unidade orgânica do Partido à custa de concessões às tendências direitistas só serve para preparar uma crise grave e pode levar a destruição do Partido.

Uma das maiores preocupações dos dirigentes dos direitistas, enquanto não se sentem bastantes fortes, é desarmarem a vigilância de classe contra elas semeando o ecletismo ideológico, a pretexto de condições novas e amolecendo a disciplina do Partido (1956-59); e quando alcançam uma posição preponderante no Partido passam pelo contrário a exigir “Unidade” e “disciplina” e exploram o espírito de disciplina do proletariado em seu proveito, expulsando os que se lhe opõem (1961-66).

A transigência com o direitismo no P. C. P. a subordinação das questões políticas à organização, o amortecimento da luta de ideias em todos os escalões do Partido, o dogmatismo e o praticismo, favoreceram o triunfo do oportunismo e a sua degeneração em revisionismo.

A vigilância de classe no interior do Partido contra a direita tem que estar acima de tudo e ser inflexível; há que combater os conciliadores que procuram “manter a unidade do Partido” à custa de compromissos com a direita. O Partido torna-se mais forte e não mais fraco de cada vez que se depura os direitistas.

A partir desse ponto transcrevemos o conteúdo da página de O Comuneiro que não consta da versão existente em pdf

14 — O Partido não deve também desarmar a vigilância contra o oportunismo de esquerda que é uma outra forma de abandonar a direcção do processo revolucionário. O anarquismo, principal variante do oportunismo de esquerda em Portugal, que dominou o movimento operário em 1910-30, tende a ressurgir como reacção contra o revisionismo e poderia vir a tornar-se um sério perigo se não fosse combatido. Esta tendência é esquerdista e revolucionaria só na aparência pois que não age dentro duma estratégia global proletária para a conquista do poder; com o endurecimento da acção operária e as acções violentas ela tem em vista estimular e pressionar a burguesia liberal para que esta tome a iniciativa, não tendo como meta a ditadura do proletariado e os seus três pilares - Partido Comunista, Exército Revolucionário, Frente Popular - os anarquistas (assim como os trotskistas e outros falsos esquerdistas) não hesitam em comprometer as forças do proletariado em aventuras e acções sem um objectivo preciso. Só se o Partido Comunista reconstruído tomar a direcção do movimento revolucionário e elaborar uma estratégia e uma táctica revolucionárias, ele poderá corrigir as manifestações de falso esquerdismo que se propagam entre a classe operária.

15 — A luta contra o oportunismo não é uma necessidade só de um certo período mas uma luta permanente, que tem de se prolongar até muito depois da instauração da ditadura do proletariado, enquanto persistir a pressão interna e externa da burguesia e do imperialismo. Actualmente o revisionismo de Cunhal (como toda a corrente revisionista internacional) faliu já em teoria mas está ainda longe de ter falido na prática e manobra para manter uma base de massas; quando amanhã a sua influência sobre o proletariado e as massas populares for liquidada (como já aconteceu no passado com os social-democratas), é fora de dúvida que novas correntes direitistas se formarão, em resultado da pressão da burguesia e do imperialismo. As novas correntes direitistas surgem sempre com formas novas, desconhecidas no passado, a pretexto de "condições novas"; muitas vezes elas apresentam-se inicialmente como um pequeno desvio quase inofensivo; os direitistas cobrem-se com as suas "boas intenções" e com o desejo de "melhorar o movimento operário" (desejo que a princípio é sincero, pois ainda não tem consciência do seu direitismo). O Partido e o movimento operário podem defender-se eficazmente do direitismo se mantiverem sempre bem claro o objectivo da ditadura do proletariado e relacionarem todas  questões com esse objectivo.

Na luta contra o oportunismo que se infiltrou nas suas fileiras e que degenerou em revisionismo, o movimento operário português e o movimento operário internacional estão ganhando nova maturidade e um impulso revolucionário decisivo. Questões vitais, como a via da insurreição e da tomada do poder, a defesa do carácter proletário do Partido, a linha das alianças, a vigilância sobre a burguesia democrática, o internacionalismo proletário, a luta anti-imperialista, deixaram de ser simples indicações teóricas e abstractas e tornam-se problemas vivos no decurso da luta contra a traição revisionista.

As seis questões fundamentais que condensam a experiência de um século do nosso movimento operário e que devem guiar a acção dos comunistas são em resumo:

  1. E preciso que exista um partido marxista-leninista.
  2. Unir o proletariado para a luta pelo poder.
  3. Os aliados do proletariado são os camponeses, as massas mais pobres e oprimidas da população, e devem ser agrupados na Frente Popular.
  4. O objectivo da luta de massas é criar um Exército Revolucionário para tomar o poder.
  5. A revolução portuguesa é uma parcela da revolução mundial e os inimigos da revolução são uma parcela do imperialismo.
  6. Vigilância permanente contra a penetração do inimigo através do oportunismo.

Se soubermos utilizar toda esta rica experiência, o Partido Comunista reconstruído terá uma vitalidade política muito maior do que em qualquer época do passado, um alto nível ideológico, estará solidamente armado contra o revisionismo moderno e todas as manifestações oportunistas. O proletariado português poderá então conduzir a revolução à vitória e pôr fim à exploração do homem pelo homem.


Notas da transcrição:

(1) Sempre que aparecer no texto ............. signifca que no original há espaço em branco (retornar ao texto)

(2) Ilegível no original (retornar ao texto)

Inclusão 28/05/2018
Última alteração 29/05/2018