Novas Lições da Revolução Russa
(Elementos para uma plataforma comunista)
(II)

Francisco Martins Rodrigues

Julho de 1989


Primeira Edição: Segunda parte do texto publicado no Tribuna Comunista, boletim interno da Organização Comunista Política Operária, nº 15 de Julho de 1989 (inédito)

Fonte: Francisco Martins Rodrigues — Escritos de uma vida

Transcrição: Ana Barradas

HTML: Fernando A. S. Araújo.

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A burocracia

17. Quando a corrente ML acabou por reconhecer que o poder soviético já no tempo de Staline estava corroído e desfigurado pela burocracia foi chocar, embora não o quisesse admitir, com as teses de Trotski sobre o ‘Estado operário burocraticamente degenerado’, sobre o ‘Termidor’ em que se afundara a revolução e sobre Staline como um Bonaparte reinando acima das classes.

A tese trotskista do stalinismo como um tumor burocrático parasitário sobre o corpo do ‘Estado operário’ está hoje muito difundida, mesmo entre sectores da corrente ML. Generalizou-se a ideia de que um Trotski revolucionário teria sido batido por um Bukarine direitista e por um Staline centrista. Trotski, diz-se, poderia ter-se deixado arrastar pela sua veia polémica para teorias abstrusas (como a da burocracia omnipotente e contudo incapaz de alterar a natureza social do Estado operário) mas teria captado a essência do fenómeno.

Será mais exacto dizer que Trotski, apesar da audácia teórica que o levou a analisar primeiro que ninguém o fenómeno social que ocorria na União Soviética dos anos 20/30, viu tudo de pernas para o ar.

18. Na Rússia dos anos 20, a burocracia não era fruto duma má tendência de Staline. Era a única solução de governo para uma sociedade que chegara a um equilíbrio de forças temporariamente insolúvel. O proletariado não podia governar mas também não permitia o acesso ao poder da pequena burguesia. O regime não podia avançar para o socialismo mas o impulso dado pela revolução impedia-lhe o retorno ao capitahsmo. Chegara-se a uma espécie de terra de ninguém, um impasse. E como o poder dos sovietes já não fazia sentido mas não podia ser abolido, porque isso seria o reconhecimento da derrota da revolução, manteve-se a ficção dum poder soviético amparado numa máquina burocrática gigantesca.

19. Não foram as “tendências autocráticas de Staline” que liquidaram o poder soviético. Pelo contrário, a concentração drástica de poderes foi a resposta ao definhamento dos sovietes. E a necessidade dessa concentração do poder era muito mais aguda que nos anos da guerra civil.

Com efeito, a verdadeira correlação de forças entre proletariado e pequena burguesia já não fazia dúvida: ou tentava-se impor a ditadura revolucionária dos operários e camponeses pobres — e nesse caso o preço era a guerra civil, o caos económico e no fim a contra-revolução; ou faziam-se concessões à pequena burguesia para restabelecer a paz civil e a actividade económica. e nesse caso não se podia fazer confiança nos sovietes, nem nos sindicatos, nem no próprio partido, vulneráveis e vacilantes perante o oceano da pequena produção e do mercado.

20. Era esta realidade que alimentava as correntes extremas na direcção do Partido: Bukarine apostando tudo nas cedências à pequena burguesia, na esperança de que ela seria aplacada e com o tempo seencontraria uma via harmoniosa, ‘democrático-popular’, gradual, para o socialismo. Trotski e a ‘oposição de esquerda’ apelando à urgência da industrialização e da colectivização através dum poder forte, capaz de entrar em choque com o campesinato.

Staline levou a melhor sobre ambas as correntes, não por ser “mais astuto” como pretende a historiografia de cordel, mas por ter sabido construir com as perspectivas fraccionadas das duas correntes uma política unificada e coerente: primeiro com o campesinato, para reconstituir a economia, organizar o aparelho de poder, ganhar tempo; depois, contra a pequena burguesia, pela industrialização e a colectivização.

21. Mas não foi só a percepção das fases a atravessar que lhe deu a superioridade; foi ter compreendido que, nas condições da União Soviética, o eixo do poder era um Partido de tipo novo, que fosse um instrumento monolítico, apto para a ditadura, capaz de esmagar a pequena burguesia e de meter a classe operária a passo de marcha no ‘socialismo’ que lhe era destinado. As lutas de Staline contra Trotski, Zinoviev, Bukarine, que a corrente ML celebra como o sinal de maturidade do bolchevismo, foram na realidade o parto desta nova corrente política, que já nada tinha de comum com o velho bolchevismo.

22. Os protestos trotskistas de que Staline usurpou o poder no partido com manobras diabólicas levam-nos da política para o terreno romanesco, confundem em vez de clarificar a situação.

O impasse a que se chegara exigia medidas extraordinárias. Ou o núcleo dirigente do partido segurava o poder, fazia reinar uma lei de ferro e criava uma grande indústria moderna e uma forte classe operária, liquidando do mesmo passo a pequena burguesia, ou a URSS tornava-se um país burguês. Fazer com que o Partido fabricasse as condições sociais para a reyolução socialista, numa espécie de salto mortal sobre o vazio, era uma tarefa que desafiava o próprio marxismo. Staline era o homem indicado para e!a. Por isso ganhou o apoio maioritário do partido.

23. A discussão entre Staline e Trotski sobre a possibilidade de construir o socialismo num só país foi um reflexo deformado deste dilema. Tomar partido ainda hoje por um ou por outro é esquecer que neste como nos demais debates ideológicos que se sucederam na direcção bolchevique entre 1923 e 1929, as fórmulas não correspondem às reais opções e os actores perdem consciência do papel que desempenham.

Com a habilidade de se escorar em citações de Lenine, Staline tentou provar que este afirmara expressamente a possibilidade do avanço da Rússia para o socialismo. Na realidade, Lenine admitira em alturas diferentes ambas as hipóteses, conforme punha a questão a curto ou a longo prazo. Nunca lhe passara decerto pela cabeça torná-la uma fonte de ortodoxia. Mas o assunto ganhou uma tremenda, carga política directa quando os destinos da República soviética começaram a ficar mais problemáticos. Contestar em 1924 que o socialismo pudesse ser construído na União Soviética cercada pelo imperialismo, como fazia Trotski, aparecia como um estímulo suplementar à ofensiva da pequena burguesia. O regime, a que já faltava a vitalidade duma autêntica ditadura do proletariado, precisava duma tese que provasse a sua viabilidade futura, e Staline deu-lha.

24. Depois de ter visto na derrota da sua ‘oposição de esquerda’ um novo Termidor, Trotski comparou o poder absoluto de Staline ao de Só [sic] que a imagem de Staline como um novo Bonaparte, erguendo-se acima da luta de classes para forçar a realização das tarefas revolucionárias, tinha o inconveniente de ser totalmente inaplicável à ditadura do proletariado. O gosto de Trotski pelas analogias históricas forçadas pregou-lhe uma partida. Como já foi observado, se Staline foi um Bonaparte, foi-o para a burguesia.

25. Só por grande milagre poderia Trotski captar o sentido profundo dos acontecimentos. Todo o seu passado, a sua busca permanente duma posição equidistante entre bolcheviques e mencheviques, a vocação de ‘unificador’ (isto é, para sobreviver à custa de manobras entre os dois partidos operários), exprimia a sua vacilação entre proletariado e pequena burguesia. O seu reflexo, que Lenine lhe apontara em mais duma ocasião, era para procurar uma posição intermédia e encobri-la com slogans extremistas.

Os anos da revolução paralisaram temporariamente nele essa oscilação mas não a superaram, porque era a base social da sua ideologia. Em 1924, ao encontrar-se perante a situação inesperada duma república soviética cercada e agonizante, Trotski mais uma vez escolheu a falsa superação e abandonou o barco. A partir daí, com a sua “IV Internacional”, era já um fantasma político.

Segunda revolução

26. À medida que estudos como o de Bettelheim fundamentaram a conclusão de que o poder ‘soviético’ dos anos 30 procedeu a uma acumulação primitiva de capital e à exploração impiedosa do trabalho assalariado com base num aparelho de Estado tirânico, o stalinismo começou a ser associado, mesmo na extrema esquerda, à ideia da contra-revolução. E isto conduz inevitavelmente à fusão dos ML com todas as correntes burguesas no que respeita a comparar o ‘totalitarismo staliniano’ com o fascismo.

Muitos dos que se sentem hoje culpados por terem acreditado no ‘socialismo’ da URSS julgam redimir-se dando a mão à palmatória da crítica burguesa e retomam as teses anti-stalinistas dando-lhes umas tintas de crítica de esquerda. Mas, se não nos deixarmos cegar pelo complexo de renegação, teremos que reconhecer que a URSS dos anos 30, se não tem nada de socialista, também não se encaixa no modelo dos regimes de reacção social, de regressão e de bloqueamento das forças produtivas; tem muito mais o carácter dum regime burguês de tipo novo, jovem e em plena expansão. E é isto que é preciso explicar.

27. Pode falar-se de ‘revolução’ a propósito das transformações ocorridas na URSS entre 1929 e 1934? Parece-nos que também neste ponto os comunistas se devem libertar do medo a chamar as coisas pelos nomes.

A derrota da linha pró-NEP dentro do partido e a expropriação da pequena burguesia que se lhe seguiu cortaram o nó do dilema em que se debatia a URSS — ou definhar ou dar livre curso à reconstituição do capitalismo privado. Foram desencadeadas forças produtivas e sociais tremendas que estavam contidas. A febre da industrialização, da colectivização, da educação, apossou-se das grandes massas.

A URSS mudou de estrutura económica e social em meia dúzia de anos: não é a vontade de ditador nenhum que pode fazer milagres destes. Tratou-se de facto de uma das grandes revoluções deste século. Não temos que a negar mas perceber as suas forças motrizes.

28. Compreende-se melhor o carácter desta revolução se se recordar o que representou para a burguesia internacional no seu [faltando no original]

Com eleito, esse gigantesco terramoto social que projectou a União Soviética como uma nova grande potência mundial baseada numa economia colectivizada, sem patrões, produziu no Ocidente onda de pânico semelhante à de 1917. Acabavam-se as últimas esperanças de pôr a Rússia soviética de joelhos. Para o imperialismo, a convicção de  que “a Rússia vermelha funciona” e “está lançada para o socialismo” era uma ameaça intolerável.

Foi a partir de 1930 que se acelerou a conspiração internacional para animar o nazismo a marchar para Leste “antes que fosse tarde demais”, ao mesmo tempo que se ajudavam a reagrupar todos os opositores a Staline. Desenterrar a história da grande conspiração imperialista contra a União Soviética nos anos 30, desacreditada como produto da ‘paranóia’ de Staline, é mais uma tarefa que só os comunistas podem cumprir.

29. O pânico do Ocidente resultava também do carácter radical que tomava a política externa da URSS. Depois de largos anos de flutuações oportunistas, a IC decidiu-se a desmascarar a social-democracia internacional, a disputar-lhe a direcção do movimento operário, a apontar os partidos comunistas para a preparação revolucionária do proletariado, a apoiar a guerra de guerrilha na China, etc.

As acusações de que com esta política Staline teria dividido o movimento operário internacional e aberto caminho à ascensão do nazismo ao poder (ainda aqui foi Trotski que forneceu a argumentação principal à burguesia) tentam ilibar a social-democracia da sua traição histórica.

Em 1928/1934, pela primeira vez depois dos anos revolucionários de 1917/1920, desenhou-se a viabilidade duma Internacional Comunista e duma ofensiva operária à escala internacional. Esta busca da aliança do proletariado internacional é mais uma comprovação do carácter revolucionário dos acontecimentos na URSS.

30. “Revolução como, se o poder proletário já fora estabelecido em Outubro 1917?”, perguntam candidamente os grupos ML. “Revolução como, se o novo regime recorreu a métodos bárbaros de expropriação dos camponeses e de arregimentação dos operários e iria assinalar a sua vitória com uma onda de terror como nunca se vira?”, pergunta em coro a burguesia. E não são poucos os que preferem falar em ‘contra-revolução’.

Os revisionistas, entalados neste mosaico de contradições, tentam como de costume harmonizar tudo e todos afirmando que foi um passo em frente para o socialismo lamentavelmente deformado pelo mau carácter de Staline… Fazem o papel de bonzos, que é o que lhes fica melhor.

Estas objecções resultam de:

  1. não se querer admitir que a revolução proletária de 1917 já abortara ao longo dos anos 20 e que as instituições herdadas da revolução já se tinham esvaziado do seu conteúdo inicial;
  2. não se reconhecer, sob as vestes ‘socialistas’, o carácter nitidamente burguês da revolução chefiada por Staline;
  3. tentar esconder que, apesar do recurso a procedimentos bárbaros, que é uma lei de todas as revoluções burguesas, a viragem de 1929/34 na União Soviética representou um poderoso estímulo ao movimento de libertação nacional e, em parte, ao movimento operário, e um golpe para os impérios capitalistas ultra-reaccionários que partilhavam o mundo.

31. A virtuosa crítica das democracias ocidentais ao ‘genocídio totalitário’ desencadeado pela viragem de 1929/34 tem ganho uma audiência cada vez maior, mesmo nas fileiras da esquerda. Faz-se esquecer assim que o espírito de ‘consenso’ e de ‘respeito pelos direitos humanos’ de que o imperialismo faz gala se fundamenta na submissão incondicional das massas à lei burguesa.

E faz-se esquecer também que o indiscutível barbarismo da repressão sobre os kulaks só é estigmatizado por ter suprimido a propriedade privada. Por isso o fim da NEP é visto como um inferno pelo pensamento burguês. Os direitos humanos da pequena burguesia sacrificada no I plano quinquenal tocam-no cem vezes mais do que os dos milhões de trabalhadores exterminados às ordens do imperialismo na guerra de intervenção e na II guerra mundial.

32. A ‘segunda revolução’ conduzida por Staline foi a solução para o impasse a que chegara a sociedade russa perante o esgotamento da ditadura do proletariado e a inviabilidade duma restauração do capitalismo privado. Sob a bandeira colectivista e em nome do ‘poder dos sovietes’, foi uma primeira etapa para levar finalmente a cabo a revolução burguesa que abortara na Rússia em 1905 e em Fevereiro de 1917.

Esta revolução burguesa que, por força das circunstâncias, aparecia tingida com o vermelho proletário, era um monstro de duas cabeças, um híbrido, que só agora ao fim de meio século começa a atingir forma acabada. Durante este meio século, a sua singularidade, indecifrável para adeptos e inimigos, lançou a confusão na burguesia e no proletariado.

33. Tentando explicar os aspectos contraditórios da viragem soviética dos anos 30, o maoísmo deu dela a sua visão atrasada camponesa, ainda hoje retomada sem espírito crítico por alguns grupos ML. Staline teria errado por estar sob a influência da ‘teoria das forças produtivas’, isto é, sob a convicção de que o avanço para o socialismo dependia dum desenvolvimento massivo da economia, quando o segredo do êxito estaria, segundo pretendem, numa aliança operário-camponesa a longo prazo (mais ou menos o que propunha Bukarine).

Esta concepção mística de socialismo, como já foi classificada a crença maoísta nos milagres que seriam produzidos pela doutrinação ideológica das massas, esquece que o socialismo é um modo de produção correspondente a um certo estádio de desenvolvimento das forças produtivas e não um estado de alma resultante do aperfeiçoamento moral.

Não foi por  ter considerado o avanço para o socialismo inseparável dum  grande salto em frente das forças produtivas e dum confronto com os kulaks que Staline  se afastou do marxismo; foi por ter julgado que isso pudesse ser feito pelo Estado em lugar do proletariado.

Lenine tinha dito que o socialismo era o poder dos sovietes mais a electrificação; Staline achou que podia corrigir a fórmula; poder do partido mais a electrificação.

34. O progressismo das revoluções burguesas esgota-se depressa. O desabrochar de novas relações sociais e duma nova burguesia burocrática sobre os espantosos êxitos do I plano quinquenal está documentado por um leque tão completo de manifestações burguesas que é difícil continuar a pô-lo em dúvida; o triunfal ‘congresso dos vencedores’ em 1934, a recomposição violenta do aparelho de poder através dos processos de Moscovo; a nova Constituição substituindo as bases do regime soviético por uma imitação de parlamentarismo; o stakhanovismo para os operários e a consolidação dos privilégios para a classe dirigente; a reforma dosistema judicial e das leis da família; o renascimento do nacionalismo sob cores ‘soviéticas’; a liquidação da IC como organização revolucionária mundial no 7.º Congresso; a nova abertura à religião; o ‘humanismo soviético’ lançado na literatura e nas artes; etc.

35. O rumo terrorista tomado pelos conflitos na cúpula do partido e do Estado a partir do assassinato de Kirov costuma ser apresentado como contraprova do carácter ultra-reaccionário do poder. Os ‘velhos bolcheviques’ a confessar crimes inconcebíveis nos processos de Moscovo, a loucura dos fuzilamentos, Trotski assassinado… Seria preciso mais para ter o quadro duma monstruosa contra-revoluçâo?

Mas também aqui não nos devemos deixar levar pelas evidências democrático-burguesas. O terror dos anos 35/38 não se encaixa no esquema que lhe destinam.

Naturalmente, só por escárnio pode haver quem, dizendo-se comunista e marxista, pretenda ainda hoje justificá-lo como terror revolucionário. Essas repressões não tiveram nada da eliminação dos reaccionários  que acompanha os grandes movimentos sociais. Foram obra duma tenebrosa polícia política que forjava processos e condenava inocentes perante a apatia temerosa das massas.

Mas essa luta de vida ou de morte na cúpula do aparelho do poder, essa típica luta burguesa, que só se resolvia pela eliminação dos adversários derrotados, não foi fruto da ‘desconfiança doentia’ de Staline. Fez parte da preparação febril do regime burguês ‘soviético’ para enfrentar a agressão externa iminente, que sabia devastadora, eliminando todos os focos de lealdade duvidosa.

A acusação de espiões fascistas com que as execuções foram justificadas era falsa e chega por si para classificar um regime. Mas também a lenda da ‘velha guarda bolchevique’ sacrificada porque mantinha de pé a bandeira da revolução foi uma invenção romântica de Trotski. A verdade é que a oposição tornara-se a reserva das forças burguesas e conspirava (incluindo Trotski) para derrubar o regime.

Os processos de Moscovo foram um crime mas as suas vítimas não foram heróis. Se os revisionistas aderem hoje à campanha da sua reabilitação incondicional é porque precisam de legitimar os seus antepassados.

36. A nova sociedade que emergia do I Plano quinquenal e das depurações requeria uma nova política externa. A classe dirigente envergonhava-se de ter sido ingénua ao ponto de acreditar na iminência de revoluções proletárias que viessem em seu socorro. Por isso adaptou o velho slogan do internacionalismo proletário a uma nova estratégia pragmática para ganhar tempo; forjar uma aliança internacional do proletariado, da pequena burguesia democrática e das burguesias nacionalistas dos países dependentes, para servir de travão às forças mais agressivas do imperialismo, aos regimes fascistas.

A nova carta de principios ditada pelo 7.° Congresso da IC ao movimento comunista veio ao encontro da tendência profunda dos principais partidos, ansiosos por se encostar à burguesia democrática. Política reformista, ela foi mesmo assim a única política de oposição ao imperialismo e animou a luta pela derrota do nazismo- As denúncias sobre o pacto germano-soviético, a “facada pelas costas” que Staline teria dado às democracias ocidentais, não passam de hipócritas manobras para apagar as pistas.

E ainda aqui não é Trotski que nos pode servir de guia. Com o seu velho vício de jogar em duas cartas, proclamava o dever de apoiar o ‘Estado operáriò’ sobre todas as coisas, ao mesmo tempo que servia de ponta de lança à social-democracia e comparava Staline a Hitler. O sumo político das suas posições nesse período explosivo era sem dúvida reaccionário.

37. Este ‘leninismo’ antifascista, democrático e patriótico, proclamado pelo 7.° Congresso, que conduzia em linha recta à dissolução da Internacional (1943) e que contém já em germe todo o arsenal revisionista dos anos recentes, correspondia aos interesses internacionais da nova burguesia russa: ao ‘socialismo’ burguês no campo interno correspondia, no campo externo, uma aliança com a ala esquerda da pequena burguesia imperialista e com as burguesias nacionais, apoiadas nos seus próprios proletariados e massas populares, para neutralizar as ameaças agressivas do imperialismo.

Leia a primeira parte

Leia a terceira parte


Inclusão 22/07/2018