Companheiro Judas

Francisco Martins Rodrigues

27 de Janeiro de 1982


Primeira Edição: Em Marcha, 27 de Janeiro de 1982

Fonte: Francisco Martins Rodrigues — Escritos de uma vida

Transcrição: Ana Barradas

HTML: Fernando Araújo.

Direitos de Reprodução: Licença Creative Commons licenciado sob uma Licença Creative Commons.


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O companheiro José Luís Judas oferece-nos, no “Jornal” da semana passada, um balanço da actividade da CGTP, de que é um dos mais brilhantes dirigentes:

“Não tenho dúvidas de que se cometeram muitos erros, por sectarismo, como no caso da contratação colectiva, em que se verificou um obreirismo excessivo, que provocou o afastamento de sectores importantes de trabalhadores. Só assim se explica que tenhamos perdido sectores como o dos bancários”.

Com que então, obreirismo e sectarismo?

Gosteil Eu também me parecia que era esse o mal da CGTP, mas não me atrevia a dizê-lo, não fossem os fanáticos das bases chamar-me lacaio do patronato. Agora, a coragem do companheiro Judas veio repor as coisas no seu pé. Vamos todos dizer bem alto que o sindicalismo português tem que se libertar do obreirismo, se quiser ganhar a confiança dos bancários. E dos engenheiros. E dos economistas. E dos empresários patriotas, porque não ?

Força nessa rectificação, companheiro Judas! Não se deixe pressionar pelo terrorismo ideológico dos esquerdistas infiltrados na central! Chegue-lhes!

Se lhe vierem dizer que a AD está no poder porque o seu Secretariado há três anos que anda a partir a cabeça aos sindicalistas que aparecem nas manifestações com faixas a favor da greve geral — não ligue. É provocação esquerdista para o desmoralizar.

Se lhe disserem que as suas tabelas salariais põem os chefes e quadros cada vez mais acima da arraia miúda — não se deixe influenciar. É miserabilismo anarco-populista.

Se lhe disserem que os do “Jornal” elogiam a sua inteligência porque a burguesia eanista conta consigo para embarrilar os operários e pô-los a dar o litro pela reconstrução do capitalismo — não dê ouvidos. É a voz da reacção.

A sério. Como é que vamos fazer entender ao companheiro Judas que os bancários e outros foram para a UGT amarela justamente porque a CGTP nunca foi “obreirista”, nunca fez sentir a força, o peso da classe operária? Como é que vamos convencê-lo a pedir desculpa daquela cavalidade de Agosto de 1978 — “não façam ondas porque a barca da democracia pode ir ao fundo”? Como é que vamos explicar-lhe que fazia bem em demitir-se?

O companheiro Judas tem fé em que a greve geral de dia 12 vai ser um êxito. Esperamos bem que sim. Mas vai ser um êxito arrancado a ferros. Contra o seu social-democratismo bem comportado, companheiro Judas.


Observação: Tiro ao Alvo - Coluna de FMR no jornal Em Marcha e no jornal Política Operária.

Inclusão 06/02/2019