Unificação das Lutas

Francisco Martins Rodrigues

14 de Maio de 1981


Primeira Edição: Bandeira Vermelha, 14 Maio 1981

Fonte: Francisco Martins Rodrigues Escritos de uma vida

Transcrição: Ana Barradas

HTML: Fernando Araújo.

Direitos de Reprodução: licenciado sob uma Licença Creative Commons.


As jornadas de 8 e 9 de Maio de 1944
Unificação das lutas defendia o PCP há 37 anos

Decorre neste mês o 37º aniversário das Jornadas de 8 e 9 de Maio de 1944. Dezenas de milhares de operários e camponeses lançaram-se então decididamente na luta contra a miséria e a carestia de vida que o regime salazarista impunha ao povo trabalhador. Foi uma das mais importantes iniciativas independentes do povo pobre do nosso pais, na sua luta por uma vida melhor, debaixo do jugo ditatorial fascista. É uma data que tem sido insuficientemente evocada. Todavia, ela representa para as forças populares um marco de resistência contra o governo fascista português. Os comunistas portugueses, continuadores das tradições de luta do velho PCP, sentem orgulho em recordar tais acções vigorosas e persistentes. Na realidade, foi o velho e revolucionário PCP, o Impulsionador e organizador de muitas das manifestações reivindicativas que tiveram lugar no decorrer desse ano de 1944. Uma actividade que devemos comparar com a actuação da direcção do actual PCP revisionista.

Em Maio de 1944. estava-se em plena II Guerra Mundial e o regime de salazarista apoiava económica e politicamente o governo nazista alemão de Hitler Internamente, o regime português estava afundado numa crise económica de grandes proporções que se abatia ferozmente sobre os operários e camponeses Para manter esse regime, as classes dominantes recorriam a métodos cada vez mais refinados Paralelamente, à miséria e à fome que impunha ao povo, Salazar apoiava ainda o reforço da guerra nazi, enviando toneladas e toneladas de géneros alimentícios que o povo trabalhador português necessitava

"A LUTA É O ÚNICO CAMINHO"

É nesta situação que milhares e milhares de operários e camponeses se revoltam por todo o país. Os operários nas fábricas põem de pé exigências colectivas por melhores salários. Os assalariados rurais lutam por jornas que façam face ao custo de vida. Os camponeses do Norte e Centro lutam pelos géneros. É um movimento reivindicativo de grande extensão que atinge praticamente todo o pais, com especialincidência nas concentrações industriais de Lisboa e Setúbal.

Era uma nova ofensiva das classes trabalhadoras, depois das poderosas greves de Julho-Agosto de 1943 Apesar da repressão fascista que nesta data se tinha abatido contra os operários e apesar da tentativa desesperada empreendida pelo regime salazarista para desarticular a direcção do velho PCP, o facto é que no final desse ano de 1943, início de 1944, despontava nova ofensiva em que os trabalhadores se unificavam em torno da luta pelo pão.

O velho PCP compreendeu, com clareza, este sentimento de revolta popular. Como verdadeiro partido marxista-leninista tomou uma posição de vanguarda assumiu um papel de direcção do movimento de massas e impulsionou durante meses a luta de massas para um caminho justo. Em Setembro de 1943 o “Avante” dizia na primeira página um editorial apelando de novo à ofensiva. Em Outubro desse ano o mesmo “Avante” dizia aos trabalhadores “Lutemos pelos géneros e pelo aumento dos salários, dando a directiva de assaltar os depósitos onde estejam açambarcados e os comboios e camiões onde sigam para o estrangeiro”. Na luta pelos salários apontava sem peias “ir para a greve”.

Na 2ª quinzena de Outubro era ainda o “Avante” que colocava na primeira página a palavra de ordem “a luta é o único caminho”. Em Janeiro de 1944, o órgão central do PCP reafirmava “Não demos tréguas ao patronato”. Em Março de 1944, a palavra de ordem era “unificar os movimentos reivindicativos”.

Nesta altura o velho PCP preparava activamente a jornada de 8 e 9 de Maio. Assim em Abril, o editorial era encimado pelo título “Mais acção”. A actuação do velho PCP e do actual são totalmente diferenciadas, tal como o vinho e a água. O PCP de 1944 era revolucionário, baseava a sua prática no marxismo-leninismo, na luta sem tréguas entre o trabalho e o capital. O PCP actual é oportunista, renegou o marxismo-leninismo, adaptou-se à política da burguesia.

O velho PCP tinha perfeita noção que o único caminho para impor derrotas ao patronato e de fazer recuar o domínio do fascismo e do imperialismo era apoiar sem hesitações o avanço popular e ao mesmo tempo mobilizar as grandes massas em torno de palavras de ordem revolucionárias Foi com esta política que o PCP se impôs no seio do movimento operário. Apesar da intensa campanha anti-comunista do governo salazarista, apoiada na Igreja e nos grandes meios de comunicação social o PCP ganhava simpatia e crescente apoio porque não vacilava perante as dificuldades, a repressão fascista e a demagogia da direita e do patronato. Ele actuava como partido revolucionário, que mobilizava as massas populares para obter a melhoria das suas condições de vida e para afastar o fascismo e a submissão à política do imperialismo no nosso país.

"Sempre na ofensiva"

Conforme referimos, no mês de Maio, a classe operária e camponeses pobres lutavam de Norte a Sul. Foi apoiado neste sentimento que o PCP preparou as jornadas de 8 e 9 de Maio. Nesta altura, seguindo as palavras de ordem do PCP, muitas dezenas de milhares de operários e camponeses fizeram greves. Refere o “Avante” da primeira quinzena de Maio de 1944 “Em Sacavém, Alhandra, Santa Iria e Póvoa, a greve foi geral, participando nela mais de 6.000 operários. Em Pero Pinheiro fizeram greve mais de 1.000 trabalhadores. Na Amadora, houve greve na construção civil. Em Lisboa paralisaram vários milhares de operários da construção civil, estaleiros, estivadores e pequenas oficinas. Em Vila Franca, paralisaram quase todas as oficinas. No Barreiro houve uma paralisação temporária numa fábrica. Os camponeses participaram activamente na luta pelo pão. Nas regiões de Vila Franca, A-dos-Loucos, S. João dos Montes, Rondulha, A-dos-Bispos, Cotovios, Cardosas, Apelação, Loures, Lousa, Queluz, muitos milhares de camponeses largaram o trabalho nos dias 8 e 9". No número seguinte o “Avante” dava nota das greves e manifestações havidas por "todo o Baixo Ribatejo e na região saloia".

Mas paralelamente, o “Avante” desse mês refere factos de extrema importância que são as movimentações camponesas do Norte e Centro. Quase todas elas de carácter espontâneo, onde na realidade a orientação directa do PCP não se fez sentir. Todavia, os actos atingiram o carácter de verdadeira revolta, tendo nalgumas regiões o povo tomado as próprias vilas.

Assim aconteceu por exemplo em Monção, onde durante horas o povo foi o dono da vila, vindo, no entanto, a recuar por falta de orientação política. Aconteceu igualmente em Pevidém, a 6 quilómetros de Guimarães, onde os operários e operárias de todas as fábricas fizeram uma marcha até Guimarães, apesar da repressão da GNR, que não conseguiu fazer nem uma prisão. Aconteceu também em Nogueira da Mala onde o povo das freguesias de Barreiros assaltou o Grémio, tendo de enfrentar corajosamente a GNR. Em Chaves, o povo opôs-se na rua ao racionamento de pão. Houve manifestações e as senhas de racionamento foram recolhidas. Em Vila Nova de Foz Côa, manifestações de mulheres obrigaram o Presidente da Câmara a dar mais pão.

Ainda nesse mês, o governo de Salazar forneceu mais pão e o patronato aumentava os salários. Dizia o “Avante” “O fascismo tremeu. O governo de Salazar será obrigado em virtude das greves e manifestações a tomar medidas para fornecer mais pão e mais géneros”. Em Julho de 1944, dois meses depois da jornada de 8 e 9 de Maio, o “Avante” indicava à classe operária “Sempre na ofensiva”.


Inclusão 21/08/2019