Autocrítica

Francisco Martins Rodrigues

16 de Outubro de 1980


Primeira Edição: Em Marcha, 16 de Outubro de 1980

Fonte: Francisco Martins Rodrigues — Escritos de uma vida

Transcrição: Ana Barradas

HTML: Fernando Araújo.

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Não têm faltado, da parte de figuras gradas da oposição, os convites à maditação e à autocrítica pelo dasaire eleitoral.

Que se radicalizou demais a movimentação de rua contra o governo, dizem uns. Que não caiu bem a campanha pessoalizada contra Sá Carneiro, adiantam outros. Que faltou à oposição “uma alternativa de estabilidade e apaziguamento”, explica o dr. José Manuel Tengarrinha, presidente do MDP/CDE. Que não se teve em conta o atraso e despolitização de grande parte do povo, lamentam ainda outros. (Como se este povo não fosse exactamente o mesmo que há cinco anos se lançava com alegria a transformar o país!).

O que está por detrás destas “autocríticas”, embora não se diga, é a ideia de que o movimento operário e popular deveria ter alinhado pela vacilação. pela estreiteza, pelo desânimo da pequena burguesia, para ver se a oposiçio conseguia assim roubar a maioria parlamentar à direita.

Talvez conseguisse. Só que seria uma oposiçio castrada.

É uma "autocrítica" que se assemelha muito a uma punhalada. Aqueles mesmos que, com o seu medo da agitação por baixo e o seu gosto das combinações por cima, travaram e desorganizaram a vanguarda popular e com isso aceleraram a deslocaçio eleitoral para a direita. O oportunismo apoia-se nas suas próprias cedências para “provar” que não cedem o bastante, que se deveria ter cedido mais. É dos livros.

Felizmente que a nossa lógica não é a dos Tengarrinhas. Mesmo passando por “visionários incorrigíveis”, continuamos a recusar a “normalidade” novembrista do capital, da CEE e da NATO, continuamos a levantar a bandeira de Abril.

É que nós sabemos que a viragem de parte do povo para a direita, só durará enquanto permitirmos que o desnorteamento da pequena burguesia desmoralizada prevaleça sobre a inesgotável combatividade operária e popular, que arde sob as cinzas.

Autocrítica pelos resultados eleitorais? Sim.,mas não a vossa. Devíamos ter penetrado mais na massa que está em baixo, materializado melhor a sua indignação, revolvido a terra mais fundo. Com os espoliados e espancados da Reforma Agrária, com os jovens operários a prazo, com os camponeses fartos de enganos, com as mulheres proletárias, com os soldados oprimidos — poderíamos ter criado uma corrente impetuosa que teria ganho centenas de milhar de indecisos e virado de pernas para o ar o quadro eleitoral.

É o que vamos fazer. E não só para os votos.


Observação: Tiro ao Alvo - Coluna de FMR no jornal Em Marcha e no jornal Política Operária.

Inclusão 06/02/2019