O Democratismo, Arma do Revisionismo
História do PCP e do Movimento Operário (12)

Francisco Martins Rodrigues

11 de Abril de 1979


Primeira Edição: Bandeira Vermelha n.º 169 de 11 de Abril de 1979
Fonte: Francisco Martins Rodrigues - Escritos de uma vida
Transcrição: Ana Barradas
HTML: Fernando A. S. Araújo.
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O V Congresso do PCP, realizado em meados de 1957, confirmou a vitória do revisionismo no Partido. Os relatórios político e de organização, apresentados por Fogaça e Dias Lourenço, introduziram todo um sistema de noções revisionistas que serviram de fundamento “teórico” para a degeneração completa do PCP nos anos seguintes. A muitos anos de distância, é instrutivo observar como o revisionista Dias Lourenço utilizou o democratismo para destruir os princípios do centralismo democrático.

O V Congresso teve lugar quando o Partido já sofria o abalo das “inovações” revisionistas lançadas por Kruchov no ano anterior. Sentiam-se já os efeitos desagregadores da campanha contra o “culto da personalidade” o “dogmatismo”. Surgiam opiniões de que as directrizes dos organismos superiores não deviam ser levadas à prática sem a discussão prévia e a concordância dos organismos inferiores, membros do CC defendiam o direito de os elementos em minoria lutarem pelos seus pontos de vista, inclusive pela formação de fracções.

À sombra do clima “humanista” posto em moda por Kruchov, alastrava o individualismo pequeno-burguês mais mesquinho, a tolerância para com o relaxamento moral e para com a delação na política. Oportunistas afastados do Partido apresentavam-se como vítimas de “injustiças”. Até reconhecidos provocadores aproveitavam para reclamar a revisão dos seus casos perante o Partido. Os militantes simples do Partido debatiam-se na confusão, vendo ser atacado pelos dirigentes tudo aquilo que até aí tinham defendido.

O relatório de Dias Lourenço dá novos passos na via do desarmamento total do Partido. Concentra o fogo sobre a orientação seguida pelo Partido em 1949-54, sob a direcção do camarada José Gregório, atribuindo-lhe toda a espécie de faltas: “métodos autoritários de direcção”; “graves violações dos princípios do centralismo democrático e da direcção colectiva”, “estreiteza ideológica e organizativa”. Alguns erros tinham sido efectivamente cometidos devido a uma centralização excepcional de poderes nas mãos do Secretariado, mas fora ela que permitira ao Partido enfrentar o assalto policial de 1949-52. Dias Lourenço, contudo, aproveita os erros para exigir “uma profunda revisão ao velho estilo”, a descentralização, a “democracia interna”. As medidas que propõe falam por si:

Em primeiro lugar, alargar a autonomia das direcções regionais. Esta é a reivindicação central dos revisionistas, que querem plena liberdade de adaptação às “condições concretas”. O projecto de Estatutos de 1954 é substituído por outro onde se consagra a descentralização de poderes.

Em segundo lugar, ampliar o Comité Central. Já exageradamente alargado na reunião de Dezembro de 1956, o CC é mais uma vez aberto à entrada de elementos de confiança da direcção revisionista, a pretexto de “reforçar o seu papel dirigente”.

Em terceiro lugar, realizar assembleias e eleições: Medida autenticamente liquidadora, nas condições de clandestinidade do Partido, é defendida com o argumento demagógico do controlo de baixo para cima. As “experiências interessantes” já realizadas neste capítulo, segundo Dias Lourenço, tiveram o resultado de abrir o Partido à ofensiva policial de 1958-59.

Em quarto lugar, condenar a vigilância e o espírito militante. Dias Lourenço critica as “exigências demasiadas” que o Partido fazia aos militantes e a “severidade desproporcionada” das sanções aplicadas a certos militantes. Inicia assim o processo de reabilitação dos elementos oportunistas antes sancionados ou afastados do Partido (João Rodrigues, Gilberto Oliveira, Cândida Ventura, etc.).

Estas medidas convergem todas para o mesmo objectivo: desarticular todas as resistências marxistas-leninistas à invasão do revisionismo, mesmo que para isso seja necessário levar o Partido à beira do desmantelamento. Foi nessa tarefa sinistra que se empenharam os dirigentes revisionistas em 1956-59. Em 1960, o renegado Álvaro Cunhal pôde iniciar a nova etapa: a construção, sobre os escombros do velho PCP, ido partido revisionista português. O democratismo cumprira o seu papel.


Inclusão 30/09/2016
Última alteração 07/12/2017