O Regime Constitucional de Democracia Nova(1)

Mao Tsetung

20 de Fevereiro de 1940


Tradução: A presente tradução está conforme à nova edição das Obras Escolhidas de Mao Tsetung, Tomo II (Edições do Povo, Pequim, Agosto de 1952). Nas notas introduziram-se alterações, para atender as necessidades de edição em línguas estrangeiras.
Fonte: Obras Escolhidas de Mao Tsetung, Pequim, 1975, Tomo II, pág: 667-682.
Transcrição e HTML: Fernando A. S. Araújo

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É muito significativo que representantes de todos os setores da população de Ien-an assistam hoje a assembleia constituinte da Associação para Promoção dum Regime Constitucional, e que toda a gente se interesse pela questão constitucional. Para quê fundar tal associação? Para facilitar a expressão da vontade popular, a vitória sobre o Japão e a edificação duma China nova.

A resistência anti-japonesa, que goza de aprovação geral, constitui já uma realidade, não havendo mais que prossegui-la com determinação. Mas há algo que ainda não se conseguiu — democracia. E tanto uma como outra são hoje de importância primordial para a China. É verdade que muitas coisas faltam ao nosso país mas, o que mais lhe falta, é independência e democracia. Na ausência duma ou doutra, não será possível levar a bom termo os assuntos da China. Mas se duas coisas nos faltam, duas há que estão de mais. Quais? A opressão imperialista e a opressão feudal. Foi em razão destas últimas que a China se converteu em país colonial, semi-colonial e semi-feudal. Atualmente, o que mais exige o nosso povo é, sobretudo, independência e democracia. Temos pois que destruir o imperialismo e o feudalismo. Há que destruí-los resoluta e radicalmente; de modo nenhum devemos perdoá-los. Alguns afirmam que se deve apenas construir, não destruir. Pois bem, permita-se-nos então uma pergunta: é ou não necessário destruir Uam Tsim-vei? E o imperialismo japonês? E o sistema feudal? Enquanto tudo isso não for destruído é vão sonhar com construir. Só essa destruição pode salvar a China e permitir-lhe o empreendimento da construção. Doutro modo tudo não será mais que sonambulismo. Só com a destruição do que é velho e podre se pode construir algo novo e são. Associando-se a independência e a democracia obtém-se uma resistência baseada na democracia ou uma democracia em benefício da resistência. Sem democracia a resistência fracassa. Sem democracia a resistência não pode sustentar-se. Com democracia venceremos seguramente, ainda que necessitemos de resistir por oito ou dez anos.

O que é um regime constitucional? É um regime democrático. Estou de acordo com o que acabou de dizer aqui o nosso velho camarada Vu(2). E que espécie de regime democrático necessitamos atualmente? Necessitamos dum regime de democracia nova, dum regime constitucional de democracia nova. Nós não necessitamos dessa pretensa democracia, velha e caduca, de tipo europeu e americano, submetida a ditadura burguesa, nem, pelo momento, duma democracia de tipo soviético, submetida a ditadura do proletariado.

A democracia de tipo antigo, praticada noutros países, está já em decadência, tornou-se reacionária. Em circunstância nenhuma poderemos adotá-la. O regime constitucional de que falam os chineses obstinados é a democracia burguesa de tipo antigo existente no estrangeiro. Eles apregoam que desejam um regime constitucional desse tipo mas, na verdade, nem é sequer isso que querem, pois não fazem mais do que enganar o povo. O que pretendem de fato é a ditadura fascista de um só partido. Na realidade, o que a burguesia nacional chinesa deseja é instaurar um regime constitucional de tipo antigo e impor a ditadura burguesa, algo que jamais poderá, contudo, realizar. O povo chinês não quer isso, o povo chinês não aceita a ditadura exclusiva da classe burguesa. É a esmagadora maioria da população da China quem tem de decidir dos assuntos chineses; é absolutamente inaceitável que a burguesia monopolize, em exclusivo, a administração do país. E quanto a democracia socialista? Como é evidente, trata-se de algo excelente, que no futuro será praticado pelo mundo inteiro. Mas para já é irrealizável na China, razão por que devemos renunciar a isso temporariamente. A democracia socialista não poderá realizar-se senão no futuro, quando as necessárias condições estiverem reunidas. A democracia de que necessitamos hoje na China, nem é a de tipo antigo nem a socialista, mas sim uma democracia nova, correspondente as condições atuais do país. O regime constitucional que nos preparamos para instaurar deve ser um regime constitucional de democracia nova.

O que é pois um regime constitucional de democracia nova? É a ditadura exercida conjuntamente por distintas classes revolucionárias sobre os traidores e sobre os reacionários. Antigamente, dizia-se: “há comida, que todos comam”. Eu penso que existe uma certa analogia entre isso e a democracia nova. Uma vez que todos compartem da comida, quando há, não se permite que um só partido, um só grupo ou uma só classe exerça a ditadura. Essa ideia foi expressa com muito cabimento pelo Dr. Sun Yat-sen, no Manifesto do I Congresso Nacional do Kuomintang:

“Nos Estados modernos, o chamado sistema democrático está geralmente monopolizado pela burguesia e converteu-se num puro instrumento para oprimir a gente comum. Em contrapartida, o princípio de democracia do Kuomintang significa um sistema democrático da gente comum, não dominado a título privado por uns quantos.”

Camaradas! Para o estudo dum regime constitucional, precisamos de consultar todas as espécies de obras, mas antes de tudo esse manifesto, e gravar no nosso espírito a passagem citada. “...da gente comum, não dominado a título privado por uns quantos” — esse o conteúdo concreto do regime constitucional de democracia nova de que falamos, quer dizer, a ditadura democrática que várias classes revolucionárias exercem, conjuntamente, sobre os traidores e sobre os reacionários; tal o regime constitucional que necessitamos hoje em dia. Tal deve ser o regime constitucional de frente única anti-japonesa.

A assembleia que realizamos hoje tem por fim apressar o estabelecimento dum regime constitucional. Por que razão “apressar” essa instauração? Se toda a gente avançasse, nenhuma necessidade haveria de “apressar”. Por que razão nos demos ao incómodo de fazer esta reunião? Porque há gente que não avança, fica para aí sem mexer-se, sem querer progredir. E não é que apenas se recusem a avançar, pois até pretendem fazer marcha a trás. Pede-se-lhes que marchem para diante, mas preferem morrer a dar um passo em frente; são os chamados elementos obstinados. E são tão aferradamente obstinados que nos vemos obrigados a realizar esta assembleia para “apressar” o seu progresso. Donde vem essa expressão “apressar”? Quem foi que a inventou? Não fomos nós. Foi esse grande homem que todos respeitamos, aquele que disse: “durante quarenta anos, devotei-me a causa da revolução nacional”, foi o Dr. Sun Yat-sen. Mas é ou não um fato que, no seu testamento, está escrito:

“recentemente, preconizei a convocação da assembleia nacional... e torna-se particularmente necessário ‘apressá-la’, realizá-la no mais curto prazo possível. Essa a minha mais ardente recomendação”!

Camaradas, não se trata duma "recomendação" banal, trata-se da “mais ardente recomendação”. A “mais ardente recomendação” significa recomendação importantíssima, que não pode ser tratada com leviandade nem posta de lado! Além disso, foi dito “no mais curto prazo possível” e não no prazo mais longo, num prazo relativamente longo nem em prazo apenas breve, mas sim “no mais curto prazo possível”. E para que a assembleia nacional se reúna no mais curto prazo possível, há que “apressar” a respetiva convocação. Ora, quinze anos passaram já após a morte do Dr. Sun Yat-sen, e a assembleia nacional por ele recomendada ainda não se convocou. Faz-se agitação diária a respeito da tutela política e perdeu-se estupidamente tempo nisso; o mais curto prazo possível converteu-se no prazo mais longo e, para cúmulo, diz-se a cada momento que se é partidário do Dr. Sun Yat-sen. Como não deve a alma do Dr. Sun Yat-sen condenar do alto dos céus esses seus indignos herdeiros! Está perfeitamente claro hoje em dia que, se não se apressa essa gente, nenhum progresso se consegue. Há que “apressá-los”, pois muitos estão a fazer marcha a trás e muitos outros ainda não ganharam consciência.

Uma vez que há quem não avance, torna-se necessário apressar. E o mesmo vale quanto aos que avançam lentamente. Foi por isso que organizámos tantas associações para promover a instauração do regime constitucional. As associações para a promoção dum regime constitucional, entre os jovens, mulheres, operários, escolas, administrações e unidades do exército, distinguem-se todas pelo seu dinamismo e têm obtido êxito. Hoje, formamos uma associação «reral para apressar em esforço comum a instauração' do regime constitucional e a execução dos preceitos do Dr. Sun Yat-sen.

Há os que dizem: mas se eles estão em distintos pontos do país e vocês em Ien-an e se vocês pretendem apressá-los e eles não atendem, que resultará daí? Sim, resultará algo. Com o desenvolvimento das coisas, eles não poderão deixar de ouvir-nos. Organizemos um grande número de mítins, escrevamos muitos artigos, façamos numerosas conferências, enviemos telegrama após telegrama, que eles não poderão fazer outra coisa senão levar em conta tudo isso. Penso que as nossas muitas associações em Ien-an têm duplo objetivo: primeiro, estudar a questão e, segundo, fazer com que as pessoas marchem em frente. Estudar para quê? Como essa gente não avança, temos de apressá-los e, se nos perguntam por que razão os apressamos, temos de dar-lhes resposta. Ora, para responder, torna-se necessário estudar seriamente o fundamento do problema do regime constitucional. Há pouco, o nosso velho camarada Vu falou longamente sobre isso e fez valer numerosos argumentos. Todos os estabelecimentos de ensino, administrações, unidades do exército e setores da população devem estudar a questão do regime constitucional que se nos apresenta.

Quando a tivermos estudado bem, poderemos empurrá-los. Empurrá-los é o mesmo que “apressá-los” e se os empurramos de todos os lados, as coisas hão-de pôr-se gradualmente em movimento. Depois, da multiplicidade de pequenos cursos de água resultará um rio possante, capaz de arrastar tudo o que se revelar corrompido e tenebroso, formando-se então o regime constitucional de democracia nova. O efeito desse empurrão será enorme. O que se fizer em Ien-an não poderá deixar de influir sobre a China inteira.

Mas, camaradas, fazer reuniões e expedir telegramas será bastante para que os obstinados fiquem com medo, comecem a avançar e se conformem com as nossas ordens? Não, eles não hão-de ouvir-nos assim tão facilmente. Muitos deles saem duma escola especial de formação de obstinados. Tal como são hoje, serão amanhã e depois de amanhã. O que é um obstinado? É um teimoso, um endurecido fechado a todo o progresso, seja hoje, amanhã ou depois de amanhã. É a isso que se chama obstinado. Fazer-nos ouvir por essa gente não é pois coisa fácil.

Pelo que respeita aos regimes constitucionais instaurados até hoje no mundo, seja na Inglaterra, na França, nos Estados Unidos ou na URSS, foi após o triunfo da revolução e a existência de fato da democracia que se proclamou a lei fundamental reconhecendo-a, a Constituição. Na China, acontece diferentemente: a revolução não está concluída, em parte nenhuma do país, excetuados os territórios como a nossa região fronteiriça, o regime democrático constitui uma realidade. A realidade é que a China vive um regime semi-colonial e semi-feudal, e mesmo no caso de ser promulgada uma boa constituição, esta será forçosamente paralisada pela obstrução das forças feudais, esbarrará inevitavelmente com os obstáculos levantados pelos obstinados. Não se lhe pode prever uma aplicação fácil. Por consequência, o movimento atual para um regime constitucional é luta por democracia ainda não realizada, e não pelo reconhecimento duma democracia já existente. Trata-se duma grande luta, de modo nenhum se trata de empresa simples e fácil.

Há velhos adversários do regime constitucional(3) que começaram agora a dizer bem desse regime. Por quê? Porque, sob a pressão do povo que quer resistir ao Japão, viram-se obrigados a vergar um pouco, acomodando-se as circunstâncias. E chegam mesmo a bradar a plenos pulmões: “nós sempre preconizámos um regime constitucional!”, fazendo um alarido ensurdecedor. Há muitos anos que estamos ouvindo a expressão “regime constitucional” mas, até agora, não vimos sequer a sombra desse regime. Eles dizem uma coisa e fazem o contrário; é o que se chama duplicidade em matéria de regime constitucional. Essa duplicidade constitui o fundo real do seu “sempre preconizámos”. Os obstinados atuais são exatamente desses indivíduos com dupla cara. O regime constitucional de que falam é puro engano. Num próximo futuro, talvez se assista a instituição duma constituição e mesmo dum presidente da república. Mas a democracia e a liberdade? Quem saberá quando serão outorgadas? A China já teve Constituição. Acaso não a promulgou Tsao Cun(4)? Mas onde ficou a democracia e a liberdade? Quanto a presidentes da república, já houve vários. O primeiro, Sun Yat-sen, foi um bom presidente, mas foi deposto por Iuan Chi-cai. Este converteu-se no segundo presidente, sendo o terceiro, Li Iuan-hom(5), o quarto, Fom Cuo-tcham(6) e o quinto, Siu Chi-tcham(7). Isso perfaz já um número respeitável. Mas em que terão eles diferido dos imperadores autocráticos? Constituição e presidentes não eram pois mais que impostura. Nos países como a Inglaterra, França e Estados Unidos, aquilo a que se chama regime constitucional, regime democrático, não é na verdade senão um regime de canibais. Situação idêntica existe na América Central e na América do Sul: numerosos Estados arvoram a insígnia republicana, não havendo realmente detrás dela o menor vestígio de democracia. Acontece o mesmo com os obstinados atuais da China. O seu tagarelar sobre o regime constitucional é pura e simplesmente “manter como insígnia uma cabeça de carneiro para vender carne de cão”. Exibem a cabeça de carneiro do regime constitucional mas vendem a carne de cão da ditadura de um só partido. E não me estou entregando a acusações gratuitas. As minhas palavras têm fundamento, fundamento que consiste no fato de, por um lado, palrarem sobre o regime constitucional e, por outro, negarem ao povo a mais pequena parcela de liberdade.

Camaradas, um regime constitucional autêntico não pode alcançar-se facilmente, mas sim através de dura luta. Não creiam que bastará fazer reuniões, expedir telegramas, escrever artigos, para que se instaure o regime constitucional. E tão-pouco creiam que bastará ao Conselho Político Nacional(8) adotar uma resolução, ao Governo Nacional publicar um decreto, a Assembleia Nacional(9), que se convocará a 12 de Novembro, promulgar a Constituição ou mesmo eleger um presidente da república, para que tudo corra pelo melhor, no melhor dos mundos possíveis, e reine a paz sob o sol. Não, isso é impossível, não devemos deixar-nos confundir. Há que explicar claramente a situação as pessoas comuns, a fim de que não se desorientem. As coisas estão longe de ser assim simples.

Mas será que “tudo está perdido”? Com as coisas assim difíceis já não haverá mais esperanças de regime constitucional. Não, também não é isso. Ainda há esperanças de instauração de regime constitucional, grandes esperanças até; a China vai seguramente transformar-se num Estado de democracia nova. Por quê? As dificuldades presentes devem-se a maquinações dos obstinados, e estes não podem permanecer eternamente como são, daí resultando que existam sérias razões para esperança. Os obstinados do mundo podem bem obstinar-se hoje, amanhã e depois de amanhã, mas não poderão obstinar-se eternamente; por fim terão de mudar. Uam Tsim-vei, por exemplo, manteve-se obstinado durante muito tempo, mas quando lhe foi impossível manter-se tal qual era no campo da resistência, viu-se forçado a atirar-se em cheio para os braços do Japão. Outro exemplo é o de Tcham Cuo-tao, que igualmente se manteve por muito tempo obstinado mas, como organizámos várias reuniões para combatê-lo, acabou por fugir. No fundo, os obstinados são teimosos mas não imutáveis, acabam por mudar, tornando-se tão repugnantes como excremento de cão. Alguns mudam para melhor, o que é também resultado de lutas, repetidas lutas realizadas contra eles; então reconhecem as faltas e emendam-se. Resumindo, os obstinados são suscetíveis de mudança. Eles têm sempre a mão uma multiplicidade de combinações, para prejudicar os outros em benefício próprio, para pôr em jogo a sua duplicidade. Mas chegam sempre ao contrário do resultado esperado. Começam tentando prejudicar os outros e acabam por prejudicar-se a si próprios. No passado nós afirmámos que Chamberlain estava a “levantar uma pedra para deixá-la cair depois sobre os seus próprios pés”; e foi precisamente o que aconteceu. Chamberlain contava levantar essa pedra que é Hitler para atirá-la contra as pernas do povo soviético mas, desde aquele dia de Setembro do ano passado, em que estalou a guerra entre a Alemanha, por um lado, e a Inglaterra e a França por outro, a pedra caiu-lhe das mãos sobre os próprios pés, e continua a fazê-lo sofrer. Exemplos desses abundam na China. Iuan Chi-cai quis esmagar os pés do povo e acabou por golpear-se a si próprio: morreu uns quantos meses depois de ter-se proclamado imperador(10). Tuan Tchi-juei, Siu Chi-tcham, Tsao Cun, Vu Pei-fu e outros, quiseram reprimir o povo e acabaram por ser derrubados por este. Todos os que querem prejudicar os demais em benefício próprio estão condenados a um triste fim.

Penso que os anti-comunistas obstinados de hoje não farão exceção a regra, a menos que se empenhem na via do progresso. Abrigando-se atrás da bela palavra “unificação”, eles pretendem liquidar a região fronteiriça Xensi-Cansu-Ninsia, o VIII Exército, o Novo IV Exército, o Partido Comunista e as organizações populares, que são progressistas, e dispõem até dum plano quanto a isso. Mas, em última análise, não creio que serão os obstinados quem liquidará o progresso, mas sim o progresso quem liquidará os obstinados. Eles só escaparão a esse destino se se lançarem, pessoalmente, na via do progresso. Temos aconselhado repetidas vezes os obstinados a não atacar o VIII Exército, o Partido Comunista e a região fronteiriça. Se quiserem aferrar-se a isso a. todo o custo, será bom que elaborem uma resolução que comece por estas palavras: “determinados a liquidar-nos a nós próprios e a fornecer ao Partido Comunista uma oportunidade de considerável desenvolvimento, nós, os obstinados, fixamo-nos como tarefa atacar o Partido Comunista e a região fronteiriça.” Os obstinados possuem já uma experiência muito rica quanto a “exterminação dos comunistas”; se desejam lançar-se outra vez nisso, têm inteira liberdade para fazê-lo. De barriga cheia, após um bom sono, estão com vontade de passar a uma certa “exterminação”. Estejam a vontade, mas preparem-se para ver realizada a resolução acima enunciada, que é algo inelutável. A “exterminação dos comunistas”, prosseguida ao longo de dez anos, desenrolou-se conformemente a essa resolução. O mesmo acontecerá com qualquer outra tentativa. Por isso os aconselhamos a renunciar a tanto. O que a totalidade do povo reclama é resistência, unidade e progresso, e não “exterminação dos comunistas”. Assim, todo aquele que tentar uma “exterminação dos comunistas” ver-se-á condenado ao fracasso.

Resumindo, toda a ação retrógrada arrasta finalmente um resultado contrário ao esperado pelos respetivos instigadores. Não há exceção quanto a isso, nem no passado nem no presente, nem na China nem no estrangeiro.

O mesmo ocorre agora com o regime constitucional. Se os obstinados continuam a opor-se a respetiva instauração, daí há-de resultar exatamente o contrário daquilo que esperam. Em caso nenhum O movimento por um regime constitucional seguirá a via traçada pelos obstinados; ele há-de ir sim contra os desejos destes, seguindo inevitavelmente a via traçada pelo povo. E será seguramente assim porque o povo inteiro assim o quer, tanto como o determina o desenvolvimento histórico da China e o curso geral dos acontecimentos mundiais. Haverá quem possa resistir a isso? Não é possível fazer andar ao invés a roda da história. Mas o trabalho que empreendemos exige tempo, não pode fazer-se do dia para a noite; exige esforços, não pode realizar-se de qualquer modo; requer a mobilização das grandes massas populares, não pode ser cumprido por um só braço. É muito bom que nos tenhamos reunido hoje aqui. Depois desta reunião haverá ainda que escrever artigos, expedir telegramas, organizar assembleias análogas nas montanhas Vutai e Taiham, no Norte da China, no Centro da China, por todo o país. Se trabalharmos nesse sentido, em poucos anos deixaremos de estar longe do objetivo. É absolutamente necessário realizar corretamente essa tarefa, conquistar a democracia e a liberdade e instaurar um regime constitucional de democracia nova. Se isso não for feito, se se agir de acordo com os obstinados, a China ver-se-á subjugada. Para evitar a subjugação torna-se indispensável atuar como se expôs. Para isso necessita-se que todos despendam esforços. Então haverá fortes possibilidades de triunfo da nossa causa. Por outro lado, há que compreender que os obstinados são no fim de contas uma minoria, a maioria das pessoas não é obstinada e está capaz de seguir a via do progresso. Com a maioria opondo-se a minoria, e com os esforços do nosso lado, as esperanças serão ainda maiores, essa a razão por que digo que, mau grado as dificuldades, existem grandes esperanças.


Notas de rodapé:

(1) Discurso pronunciado em Ien-an pelo camarada Mao Tsetung, na Associação para Promoção dum Regime Constitucional. Confundidos pela propaganda mentirosa de Tchiang Kai-chek sobre o “estabelecimento dum regime constitucional”, muitos camaradas no Partido pensavam que talvez o Kuomintang quisesse de fato estabelecer tal regime. No seu discurso, o camarada Mao Tsetung desmascarou a trapaça de Tchiang Kai-chek, arrancou-lhe das mãos a propaganda sobre o estabelecimento dum regime constitucional e converteu-a numa arma para despertar o povo e levá-lo a exigir de Tchiang Kai-chek a democracia e a liberdade. O resultado foi que Tchiang Kai-chek renunciou pouco depois a sua trapaça e, durante todo o curso da Guerra de Resistência contra o Japão, não ousou mais retomar a propaganda por um “regime constitucional’’. (retornar ao texto)

(2) O camarada Vu Iu-tcham era, na altura, presidente da Associação dos Setores Populacionais de Ien-an para a Promoção do Regime Constitucional. (retornar ao texto)

(3) Alusão a camarilha reacionária kuomintanista encabeçada por Tchiang Kai-chek. (retornar ao texto)

(4) Em 1923, Tsao Cun, caudilho militar do Norte, fez-se eleger "presidente” da república, subornando quinhentos e noventa deputados, a razão de cinco mil yuan-prata o voto. Posteriormente, promulgou uma constituição votada por esses deputados, que passou logo a ser designada por “Constituição Tsao Cun” ou “Constituição do suborno”. (retornar ao texto)

(5) Comandante da XXI Brigada Mista do Novo Exército dos Tsins; constrangido a alinhar pela revolução, por ocasião da Insurreição de Vutcham, em 1911, arvorou-se chefe do exército revolucionário no Hupei. No reinado dos caudilhos militares do Norte, chegou a vice-presidente e, depois, a presidente da república. (retornar ao texto)

(6) Fom Cuo-tcham, subordinado de Iuan Chi-cai que, após a morte deste, passou a chefiar a camarilha de Tchili (Hopei) dos caudilhos militares do Norte. Em 1917 derrubou Li Iuan-hom e converteu-se em presidente do governo de Pequim. (retornar ao texto)

(7) Siu Chi-tcham era um político da camarilha dos caudilhos militares do Norte. Foi eleito presidente da república em 1918, pelo parlamento controlado por Tuan Tchi-juei. (retornar ao texto)

(8) Órgão puramente consultivo que o governo kuomintanista se viu forçado a criar após O começo da Guerra de Resistência. Os seus membros eram todos “convidados” pelo governo kuomintanista. O Conselho compunha-se, nominalmente, de representantes de todos os partidos e grupos políticos anti-japoneses mas, na realidade, os membros kuomintanistas constituíam a maioria. Não dispunha de qualquer poder para influir na política e medidas adotadas pelo governo kuomintanista. Como o Kuomintang de Tchiang Kai-chek se foi tornando cada vez mais reacionário, o número de representantes da camarilha reacionária do Kuomintang, bem como o dos demais elementos reacionários, cresceu no seio do Conselho, reduzindo ainda mais a percentagem de democratas, que ficaram com a liberdade de palavra cada vez mais limitada. O Conselho transformou-se assim num puro instrumento entre as mãos da camarilha reacionária do Kuomintang. Após o Incidente do Sul de Anghuei, em 1941, os membros comunistas do Conselho recusaram-se várias vezes a participar nas sessões, em protesto contra as medidas reacionárias do Kuomintang. (retornar ao texto)

(9) Em Setembro de 1939, sob proposta do Partido Comunista e de democratas doutros partidos e grupos políticos, a IV Sessão do Conselho Político Nacional adotou uma resolução exigindo que o governo kuomintanista convocasse uma assembleia nacional para instauração dum regime constitucional, em data pré-fixada. Em Novembro do mesmo ano, a VI Sessão Plenária do Comité Executivo Central do Kuomintang anunciou a sua decisão de convocar uma assembleia nacional para 12 de Novembro de 1940. O Kuomintang aproveitou-se então disso para desenvolver uma propaganda mentirosa. Mas a decisão nunca chegou a ser executada. (retornar ao texto)

(10) Iuan Chi-cai proclamou-se imperador a 12 de Dezembro de 1915, e foi constrangido a renunciar ao título em 22 de Março de 1916. (retornar ao texto)

Inclusão 16/12/2013