A questão da terra na Duma

Vladimir Ilitch Lênin

12 de maio de 1906


Primeira edição: Volná, nº 15, 12 de maio de 1906. V. I. Lênin, Obras, 4ª ed. em russo, t. 10, págs. 382/384

Fonte: A aliança operário-camponesa, Editorial Vitória, Rio de Janeiro, Edição anterior a 1966 - págs. 266-268

Tradução: Renato Guimarães, Fausto Cupertino Regina Maria Mello e Helga Hoffman de "La Alianza de la Clase Obrera y el Campesinado", publicado por Ediciones en Lenguas Extranjeiras, Moscou, 1957, que por sua vez foi traduzido da edição soviética em russo, preparada pelo Instituto de Marxismo-Leninismo adjunto ao CC do PCUS, Editorial Política do Estado, 1954. Capa e apresentação gráfica de Mauro Vinhas de Queiroz

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A primeira obra dos democratas constitucionalistas na Duma consistiu em redigir uma mensagem em resposta ao discurso da Coroa. Elaboraram uma tímida solicitação e não uma reivindicação. A segunda «obra»: silenciaram sobre os assuntos ordinários. Sua timidez foi ainda maior. Agora, a terceira obra: o exame do problema da terra, colocado na ordem-do-dia na Duma.

Todos os operários devem acompanhar com particular atenção este problema. O problema da terra preocupa, antes de tudo, a massa camponesa. E os camponeses passaram a ser agora o aliado principal e quase único dos operários na revolução. No problema da terra ver-se-á com particular clareza se o partido democrata constitucionalista, que denomina a si mesmo partido da liberdade popular, serve verdadeiramente à liberdade popular.

Que quer o povo, isto é, em primeiro lugar o campesinato? O campesinato quer a terra. Isto todo o mundo sabe. Os camponeses exigem que toda a terra do país lhes pertença. Os camponeses querem sacudir o jugo dos latifundiários e dos funcionários. Arrancar a terra das mãos dos latifundiários para que estes não imponham ao mujique o pagamento em trabalho, isto é, em essência, a velha corveia; arrancar o poder das mãos dos funcionários, para que estes não disponham a seu arbítrio da gente simples: isto é o que querem os camponeses. E os operários devem ajudá-los tanto na luta pela terra como na colocação direta, clara e bem definida do problema da terra.

É particularmente fácil confundir e obscurecer este problema. É fácil dizer que os camponeses naturalmente devem receber a terra em lotes, mas procuram ornar esta repartição dependente de condições tais que anulem qualquer proveito para os camponeses. Se são novamente os funcionários que distribuirão as terras, se os latifundiários liberais voltam a ser os «mediadores de paz» e se o velho poder autocrático é quem vai determinar as «módicas proporções» do resgate, em lugar de um proveito para os camponeses, resultará novamente, da mesma forma que em 1861, um esfolamento dos camponeses, uma nova corda em seu pescoço. Por isso, os operários conscientes têm que explicar com extraordinária energia aos camponeses que no problema da terra devem ser particularmente precavidos e desconfiados. No atual estado de coisas, adquirem enorme importância as questões da indenização a pagar pela terra e de que poder irá efetuar sua «distribuição». Na questão do resgate, pode-se determinar imediatamente é sem erro quem está ao lado dos camponeses e quem está ao lado dos latifundiários, assim como quem procura desertar de um lado para outro. O camponês russo sabe — e como o sabe! — o que representa o resgate. Nesta questão se delimitam magnificamente os interesses dos camponeses e os dos latifundiários. E por isso procedeu com absoluta justeza o Congresso de Unificação do POSDR ao substituir a palavra «alienação» no projeto inicial de programa agrário pela palavra «confisco» (isto é, alienação sem indenização).

Na questão de que poder irá efetuar a distribuição da terra, os interesses dos camponeses e dos funcionários divergem da mesma forma que os interesses dos camponeses e dos latifundiários na questão do resgate. Por isso, os operários socialistas devem explicar com particular insistência aos camponeses a importância que tem o fato de que não seja o velho poder que se encarregue de solucionar o problema da terra. Que saibam os camponeses que nenhuma reforma agrária lhes será proveitosa se o assunto fica nas mãos do velho poder. Felizmente, também sobre esta questão se conseguiu, no fundo, unanimidade no Congresso de Unificação do POSDR, pois sua resolução reconheceu incondicionalmente o apoio às ações revolucionárias do campesinato. É certo que o congresso, a nosso ver, cometeu um erro ao não assinalar com clareza que a reforma agrária só pode ser confiada a um poder estatal plenamente democrático, a dignitários eleitos pelo povo, que dêem conta a ele de sua gestão e sejam por ele revogáveis. Mas disto falaremos mais detalhadamente em outra ocasião.

Na Duma apresentar-se-ão dois programas agrários fundamentais. Os democratas constitucionalistas, que a dominam, querem que os latifundiários fiquem na fartura e os camponeses intactos. Concordam com a alienação compulsória da maior parte da terra dos latifundiários, mas, em primeiro lugar, pressupõem a indenização e, em segundo lugar, são partidários de uma solução liberal-burocrática e não camponês-revolucionária no problema dos meios e caminhos para efetuar a reforma agrária. Em seu programa agrário, os democratas constitucionalistas, como de costume, se retorcem como cobras entre os latifundiários e os camponeses, entre o velho poder e a liberdade popular.

O grupo trudovique ou camponês não definiu ainda plenamente seu programa agrário. Toda a terra deve pertencer ao povo trabalhador; por ora guarda-se silêncio sobre a questão da indenização e sobre a do velho poder. Falaremos mais de uma vez sobre este programa quando estiver claro.

O governo burocrático, como é natural, nada quer ouvir nem sequer da reforma agrária democrata constitucionalista. O governo burocrático, a cuja frente se encontram os mais ricos latifundiários-funcionários, cada um dos quais possui com frequência dezenas de milhares de deciatinas de terra, e «preferirão adotar a religião maometana» (como se expressou um escritor de talento) a permitir a alienação compulsória das terras dos latifundiários. Assim, pois, a «solução» do problema agrário pela Duma não será uma solução autêntica, e sim apenas uma proclamação, uma declaração de reivindicações. Os democratas constitucionalistas apresentarão novamente tímidas solicitações, em lugar das reivindicações dignas e audazes, honradas e abertas, próprias doe representantes populares. Desejamos ao grupo trudovique que atue, pelo menos esta vez, com plena independência e autonomia em relação dos democratas constitucionalistas.

No que se refere aos operários socialistas, sobre eles recai agora uma tarefa de particular magnitude. É preciso ampliar por todos os meios e com todas as forças a organização em geral e, em particular, a ligação com o campesinato. É preciso explicar aos camponeses com a maior amplitude, clareza, detalhe e profundidade possíveis, toda a importância que tem a questão da indenização e se é possível resignar-se a deixar nas mãos do velho poder a transformação agrária. É preciso pôr em tensão todas as forças a fim de que a aliança do proletariado socialista e do campesinato revolucionário se fortaleça e cresça para o momento em que se dê o desenlace inevitável da atual crise política. Nesta aliança, e somente nela, reside a garantia da solução com êxito do problema de «toda a terra» para os camponeses e da liberdade completa e o poder completo para o povo.


Inclusão: 03/02/2022