O desencantamento das estrelas do crescimento

Robert Kurz

20 de junho de 2008


Primeira Edição: Original ENTZAUBERUNG DER WACHSTUMS-STARS em www.exit-online.org. Publicado em “Neues Deutschland”, 20.06.2008

Fonte: http://www.obeco-online.org/robertkurz.htm

Transcrição e HTML: Fernando Araújo.


Nos últimos anos, a Ásia e a Europa de Leste, em parte com taxas de crescimento de dois dígitos, têm sido consideradas “as” regiões-boom da economia mundial. Ainda que as condições sejam diferentes em cada caso, é possível verificar alguns pontos comuns nos países do pretenso milagre. O crescimento turbo é uma ilusão óptica, porque a base de partida era muito baixa; na Ásia, por causa dum subdesenvolvimento estrutural, com uma participação relativamente elevada da economia da terra no produto social, e na Europa de Leste, por causa da brutal desindustrialização após o colapso do socialismo de Estado. Já no passado desabaram sucessivamente altas taxas de crescimento com base de partida muito pequena, por exemplo na América Latina.

Tanto no caso da Ásia como no da Europa de Leste, acontece que as taxas de crescimento rápido já não assentam num desenvolvimento económico nacional coerente, mas numa ligação problemática a cadeias globais de criação de valor dos conglomerados ocidentais. O resultado em ambos os casos foi a abertura de um fosso entre estruturas de exportação com base em baixos salários no espaço da globalização, por um lado, e o progressivo desmantelamento da antiga economia interna com grandes potenciais de pobreza, por outro lado. Agora a euforia de crescimento já ingenuamente projectada durante anos recebe o primeiro balde de água fria.

A conjuntura de deficit global foi aquecida por uma enchente de dólares desencadeada pelo banco central dos EUA. Com isso foi inflacionado o sistema monetário mundial, em parte através da ligação directa ao dólar, como na Ásia, em parte através dos efeitos indirectos sobre a importação de petróleo, ou de componentes de produção. A inflação, que na União Europeia se aproxima da marca dos 4% e já a passou nos EUA, atingiu as estrelas do crescimento na Ásia e na Europa de Leste com uma força ainda maior. Na China, na Índia, na Indonésia e na Tailândia a inflação já subiu a perto dos 10%, no Vietname chegou aos 25%. Os “tigres” do Báltico estão com uma inflação acima dos 10%, a Letónia já com cerca de 18% e a Roménia também já ultrapassou os 8%.

Por todo o lado o crescimento insuportável do custo de vida levou já a revoltas. No Vietname houve mais de 300 movimentos grevistas, na Roménia entraram de greve os empregados da fábrica de automóveis Dacia, tomada pela Renault, e os do fornecedor alemão Leoni; na Letónia os marítimos ameaçam com greve. Em parte foram impostos aumentos salariais de 30%. Com isso cai rapidamente a opção de baixos salários para os investidores ocidentais. No Báltico o crescimento quase estagnou no primeiro trimestre de 2008. Para o Vietname há sinais de um desenvolvimento semelhante. Estes países tornaram-se as procelárias da crise, ainda antes de a conjuntura do deficit global ter chegado ao fim, por força da iminente quebra do consumo nos EUA.

Enquanto o fogo de palha começa a apagar-se na Europa de Leste, também o excedente comercial da Ásia cai “como uma pedra”, segundo informação de banqueiros americanos. Sem contar com a China, no primeiro trimestre de 2008 já houve uma queda de 30 mil milhões de dólares. Nos círculos financeiros paira o fantasma de uma nova crise asiática, porque a inflação ameaça forçar valorizações monetárias e subidas de juros. Até agora os sinais de paralisação nos pequenos países da Ásia e da Europa de Leste fizeram-se notar apenas na periferia, porque o volante do circuito do deficit do Pacífico entre a China e os EUA ainda roda. Mas isso pode mudar dramaticamente já em breve.


Inclusão: 28/12/2019