Optimismo Cansado

Robert Kurz

5 de maio de 2006


Primeira Edição: Original MÜDER OPTIMISMUS in Neuen Deutschland 05.05.2006

Fonte: http://www.obeco-online.org/robertkurz.htm

Transcrição e HTML: Fernando Araújo.


Finalmente veio mais calor e os institutos de pesquisa económica começam a cantar como as aves da Primavera. A famosa "retoma", que há meio ano vem sendo pintada mediaticamente com base nos inquéritos às empresas, repercutiu-se agora no relatório da Primavera dos estudos de conjuntura. A previsão de crescimento para 2006 foi elevada de 1,2 % para 1,6 %. De imediato o ministro da economia, Michael Glos, louvou a força e a solidez da "retoma em curso", que reflecte a confiança geral na grande coligação. Na realidade, até agora trata-se apenas da habitual animação a seguir aos meses de Inverno. Mas, por outro lado, o optimismo profissional está a ficar bastante cansado. O estudo prevê já em 2007 uma nova descida para 1,2 %, o governo até para apenas 1 %.

Em comparação histórica, esta retoma não passa de estagnação. A terceira revolução industrial coloca limites internos à valorização do capital real. Uma retoma realmente auto-sustentada teria que levar consigo o mercado de trabalho regular em frente alargada. Para isso hoje na RFA seria preciso, no mínimo, 3 % de crescimento, ou mais, o que é ilusório. Na realidade, o desemprego estrutural não é sequer atingido pelas oscilações da conjuntura. O que é avivado ao mais alto grau é o alargamento das relações precárias e irregulares de salários baratos, forçado pelas medidas de coacção mais extensivas da administração estatal do trabalho e da crise. O forte aumento do IVA planeado para 2007 agudizará a pobreza em larga escala. Com isto falta um importante sinal para uma retoma real, nomeadamente a expansão da procura no consumo; de resto não apenas cá na terra, mas em todo o espaço da União Europeia. O comércio a retalho sofreu em Março uma amarga recaída, ou seja, o exacto oposto da retoma.

O optimismo fica deslumbrado e como que fixado apenas na exportação, que na realidade equivale à inultrapassável transnacionalização do capital na crise. O processo da globalização conduzirá a mais fechos de fábricas e mais despedimentos em massa, independentemente das taxas de crescimento nominal. Mas mesmo a sempre invocada conjuntura mundial, que por todo o mundo exclui cada vez mais seres humanos, tem pés de barro. A escalada do preço do petróleo anima de facto a procura das importações dos países produtores e financia com as respectivas aplicações em dólares o deficit da balança comercial e de serviços dos USA que, como é sabido, até agora vem sugando a corrente global de mercadorias e de capital. Mas a subida continuada dos custos da energia ameaça repercutir como bumerangue sobre a conjuntura global.

Independentemente disso, a economia-vudu movida pelo deficit dos USA, que implica com os investimentos de capital transnacional na China, na Índia e na Europa Oriental, também está no fio da navalha. No plano das relações monetárias, o desequilíbrio transbordante da balança externa dos US pode deixar cair o dólar a qualquer momento. Para evitar as tendências inflacionistas decorrentes do preço do petróleo o Banco Central Europeu vê-se empurrado para a elevação dos juros. O curso do Euro face ao dólar já sobe, porque a diferença nos juros é favorável aos USA. As contradições da conjuntura mundial alimentada pelo deficit exprimem-se forçosamente nas relações das moedas e dos juros. A pressão para a subida dos juros e a fraqueza latente do dólar por maioria de razão se transformam num banho de água fria para a retoma. Os optimistas profissionais que se agasalhem.


Inclusão: 28/12/2019