Respostas ao “Jornal de Lafões”

Vasco Gonçalves

24 de Junho de 1975


Fonte: Vasco Gonçalves - Discursos, Conferências de Imprensa, Entrevistas. Organização e Edição Augusto Paulo da Gama.
Transcrição: João Filipe Freitas
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Fernando A. S. Araújo.

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1 — Não me parecem as eleições o melhor teste para qualificar um Povo, e neste caso o Povo de Viseu, de politizado ou despolitizado. No jogo eleitoral há muitas pedras que se movimentam, há jogadas por vezes não muito claras, há muitos interesses particulares de permeio, enfim penso que não é pelo momento eleitoral que se pode avaliar a politização do Povo de Viseu.

A politização e a consciência nacional há que avaliá-la em momento de crise — e refiro-me particularmente ao 28 de Setembro e ao 11 de Março — e nesses momentos não há dúvida nenhuma que o comportamento do Povo de Viseu, em consonância com todo o Povo Português, foi um comportamento vigilante, lutador e revelador de amor à Pátria e alta consciência patriótica.

2 — Devo revelar discordância quanto à forma como a questão é posta. A crise de desemprego não foi criada pelo 25 de Abril; a crise de desemprego já existia antes do 25 de Abril e é mesmo uma das causas do levantamento dos capitães; a existência da censura não permitia, porém, a sua discussão nos jornais e o seu conhecimento público.

Isto não quer dizer que depois do 25 de Abril não tenha aumentado esse desemprego. Tem aumentado mas não tanto pelas razões que aponta, antes pela crise do sistema capitalista português e do sistema capitalista mundial. Já que fala dos regressados do Ultramar devo dizer que essa será uma pequena desvantagem em relação aos grandes benefícios que advieram ao Povo Português pelo fim da guerra — as mães sabem que os seus filhos não irão morrer a lutar por uma causa injusta, os jovens sabem que agora podem encarar o futuro sem apreensão.

Além disso Portugal ao contribuir para a criação de novas Pátrias de expressão portuguesa viu abertas as portas de todo o mundo e conquistou a amizade de todos os povos.

Ora estes são factos que não tendo um reflexo imediato nem material na resolução dos nossos problemas, nos devem dar uma profunda alegria moral.

Depois e tendo em conta que cerca de metade dos nossos orçamentos se destinavam à compra de material de guerra, dentro de cerca de dois anos estaremos na possibilidade de investir esse dinheiro internamente para benefício de todo o Povo Português. Tenham confiança e dêem-nos tempo.

O desenvolvimento industrial será uma das direcções em que no futuro se desenvolverá a nossa economia, assim como o será o desenvolvimento agrícola e outros. No entanto nada disto é automático e, por exemplo, qualquer investimento industrial necessita, na generalidade dos casos, de pelo menos 3 anos para se desenvolver. De imediato a política do Governo é aproveitar ao máximo os recursos que já existem e tentar fazer sair da crise os sectores que nela se encontram; depois virá, e já num esquema de planificação socialista a nível nacional, o desenvolvimento harmónico de todos os sectores da economia portuguesa; nessa altura o distrito de Viseu não será esquecido. Até lá há que trabalhar muito, há que fazer sacrifícios e há que ter muita confiança no futuro da nossa Pátria, que será um futuro de paz e progresso democrático e socialista.

3 — Como já foi anunciado pelo senhor general Carlos Fabião, Chefe do Estado Maior do Exército, está em curso a reestruturação do Exército, das suas unidades e estabelecimentos militares; neste contexto é natural que os estabelecimentos que refere venham a ser abrangidos pela reestruturação; não está, porém, ainda nada particularizado no que se refere a Viseu.

4 — Aquilo que afirma no preâmbulo da sua pergunta corresponde à realidade; no entanto nem o desenvolvimento económico da região, nem as necessidades da população do distrito justificam no momento actual uma utilização diferente do campo de aviação.

Esta é a opinião do Governo face às informações que possui.

5 — Até 15 de Julho a CP tentará uma experiência de via rápida na ligação Viseu-Aveiro. Durante este período a CP estudará a experiência, receberá sugestões e reclamações e sempre de colaboração com as populações, encarará a forma de resolução definitiva do problema.

Face a algumas perturbações que têm acontecido suscitadas mais por questões de bairrismo ou de carácter sentimental, do que por necessidade de transporte, quero pedir ao Povo do distrito de Viseu a lucidez e vigilância em relação aos que o querem dividir.

Chegou a altura de colocarmos acima dos interesses particulares sempre os interesses da maioria. E podem ter a certeza que é pelos interesses da maioria que o Governo pautará a sua actividade e não deixará de ser intransigente em relação à minoria que tente perturbar o andamento não só do comboio do Vale do Vouga como do comboio maior e mais rápido que é a Revolução Portuguesa.

6 — Nunca houve nenhuma revolução no mundo que que num ano tivesse cumprido todas as suas intenções e promessas.

No nosso caso, além das dificuldades normais do desenvolvimento de qualquer processo revolucionário, viemos encontrar um país degradado por 48 anos de fascismo o opressão.

O Sector do Ensino, que é em todas as sociedades dos mais sensíveis, foi por isso mesmo dos que mais sofreu e onde melhor se podem apreciar as consequências desastrosas do fascismo.

Assim sendo a realidade lamentável de que fala há-de ser ultrapassada no futuro e tendo em conta a política, de regionalização e descentralização a levar a cabo pelo MFA, Viseu também terá oportunidade de fazer sentir as suas necessidades ao poder central.

Quero aproveitar esta oportunidade para dirigir uma saudação ao povo de Viseu e incitá-lo ao trabalho, à vigilância revolucionária e ao estreitamento da sua aliança constante com o MFA, em prol da construção do socialismo e do progresso da nossa Pátria.

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Abriu o arquivo 05/05/2014