Discurso na Sorefame

Vasco Gonçalves

17 de Maio de 1975


Fonte: Vasco Gonçalves - Discursos, Conferências de Imprensa, Entrevistas. Organização e Edição Augusto Paulo da Gama.
Transcrição: João Filipe Freitas
HTML:
Fernando A. S. Araújo.

capa

Trabalhadores da Sorefame:

Depois do que aqui foi dito, pouco mais tenho a acrescentar. Os meus camaradas do Conselho da Revolução, do Movimento das Forças Armadas, do Governo Provisório e eu, estamos profundamente satisfeitos por nos termos deslocado aqui, porque tivemos ocasião de verificar que aquilo que vos disseram os vossos camaradas seria aquilo que nós vos iríamos dizer.

Os vossos camaradas deram uma clara amostra de consciência política, de consciência social, de consciência de trabalhadores ao serviço da nossa Revolução.

Que mais posso eu vir aqui dizer, do que aquilo que vos disseram os vossos camaradas?

Viemos aqui aprender convosco. Isto não são frases literárias o que eu estou aqui a dizer, mas isto é de facto a voz da nossa consciência e do nosso coração. Vós tendes na mão, vós e os outros trabalhadores e aqueles que estão de facto interessados em construir um Portugal democrático, um Portugal que aponte para o Socialismo; vós tendes na mão o futuro da nossa Pátria. O futuro da nossa Pátria sois vós, vós sois a nossa Pátria. A Pátria não é uma entidade abstracta, não é uma entidade mítica, mas é uma entidade concreta constituída por todo um povo de carne e osso, que vive dia a dia os seus problemas, que sofre e que tem alegrias; que constrói, dia a dia, na medida das suas possibilidades, o futuro. Essa é que é a Pátria. A Pátria são os portugueses de carne e osso; sois vós, são todos os portugueses bem ligados aos seus problemas nacionais, bem ligados às raízes históricas, bem ligados àquilo que de positivo a nossa tradição nos traz e apontados para o futuro. Esse é que é o verdadeiro conteúdo da Pátria que não é nada de abstracto que se aprende nos livros, mas é uma coisa que se aprende no dia a dia. Vós quando estais a construir os baloiços para os filhos dos trabalhadores, quando estais a construir as carruagens, quando estais a construir os equipamentos para as centrais eléctricas vós estais a construir a vossa própria Pátria.

Esse é que é o conteúdo da palavra Pátria!

E peço licença para dizer aqui umas modestas palavras, ao pé dessas palavras tão belas que aqui foram proferidas pelos vossos camaradas, e ao pé dos caminhos que foram apontados pelo Sr. Ministro da Indústria.

Os trabalhadores da Sorefame têm uma longa tradição de luta, mesmo no tempo do fascismo e apesar das tremendas dificuldades conseguiram provar que a luta é sempre possível se existir uma forte consciência política. O reconhecimento do 1.º de Maio, como feriado na Sorefame e a greve de Janeiro de 74, demonstram essa realidade.

O triunfo da revolução portuguesa depende decisivamente do triunfo no campo económico, do relançamento em moldes socialistas de uma economia empobrecida pelas distorções do fascismo, pela dependência do capitalismo internacional em crise aguda, pelos obstáculos a percorrer semeados constantemente no caminho em que estamos.

Há que reafirmar: o triunfo da revolução exige uma batalha travada a todos os níveis, sem descanso nem hesitações. São as massas trabalhadoras em união estreita com o MFA que determinarão o futuro da nossa Pátria, porque é da adesão dessas massas aos grandes objectivos nacionais que dependem os resultados da nossa batalha.

Os grandes objectivos nacionais são: a independência da nossa Pátria, a construção de uma sociedade em transição para o socialismo, que aponte para o socialismo. Mas nós temos que ter bem a consciência de que não construímos o socialismo de um dia para o outro nem por milagre; será com o trabalho de todos os portugueses que ele será construído e isso leva tempo. A construção do socialismo passa pela revolução das consciências, pela revolução do trabalho. Nós não dizemos que amanhã vamos ter o socialismo; mas o que dizemos é que estamos construindo uma sociedade que aponta para o socialismo.

Não temos um caminho fácil à nossa frente, a libertação do homem não é fácil, mas eu pergunto: quando os objectivos são a liberdade e a justiça, o que é que pode travar a vontade e a capacidade de luta das massas trabalhadoras? É essa vontade aliada à consciência política que permitirá superar dificuldades que se nos deparam, como sejam, entre outras, as que eu quereria salientar hoje aqui: factores divisionistas dos trabalhadores, o exagero das lutas partidárias e reivindicações salariais irrealistas.

Eu penso que vós deveis defender a vossa unidade como aquilo de mais precioso que hoje, neste momento, tem a nossa revolução. Vós tendes o direito e tendes o dever de terdes ideias políticas, diferentes uns dos outros. Mas acima das nossas divergências políticas temos os grandes objectivos nacionais a atingir. E os trabalhadores devem sobretudo ver o que é essencial na sua luta, ver o que é principal e não se deixarem enredar por questões e por lutas de pormenor e lutas de carácter secundário, A vossa unidade é aquilo que mais de precioso deveis defender. A vossa unidade forja-se no contacto quotidiano, nas discussões entre vós sobre os grandes problemas nacionais, sobre as tarefas que tendes de realizar. A vossa unidade resolve-se na crítica aberta, construtiva, desassombrada, no falar frente a frente com lealdade, com coragem, com franqueza; resolve-se no desmascaramento do oportunismo e do divisionismo e tendo sempre bem presente os grandes objectivos nacionais a atingir, porque hoje os governantes, o MFA, podem afirmar que os grandes objectivos nacionais a atingir são os objectivos das classes trabalhadoras e de todos os que estão interessados na revolução que aponta para o socialismo.

Ninguém de boa fé pode negar a necessidade, a urgência da unidade dos trabalhadores. Ninguém se pode opor a essa unidade, porque essa unidade é condição fundamental para vencermos a nossa revolução. É uma condição da construção da nova sociedade por que todos nós ambicionamos, e a construção dessa nova sociedade necessita, além dessa condição, da subordinação das lutas partidárias sempre, mas sempre, ao interesse nacional.

Necessitamos de realismo económico. Os trabalhadores da Sorefame têm compreendido estas necessidades, e o seu nível de consciência política permite-lhes superar as dificuldades apontadas.

É preciso que o seu exemplo, tal como outros exemplos existentes, alastrem a todo o País. Que este exemplo vosso frutifique, que seja um exemplo criador. É essa vontade que permitirá fortalecer uma verdadeira consciência de classe, impermeável às manobras do capital e às utopias do esquerdismo anarquizante. Deveis ter uma forte consciência de classe. Os interesses das classes trabalhadoras estão identificados com os interesses nacionais.

É ainda essa vontade que permitirá, em coordenação com os órgãos centrais de planeamento e decisão política, desenvolver todo o potencial criador das massas trabalhadoras, levando-as a estudar e a criar formas adequadas de participação no processo revolucionário e, particularmente, no controlo da produção, através das próprias organizações que vão criando conselhos de profissão ou outras formas conjugadas com os órgãos sindicais.

Deverão os trabalhadores participar no estabelecimento dos planos anuais das empresas, no estabelecimento dos preços dos produtos, na solução dos problemas salariais, na organização técnica da produção, na aplicação dos capitais, no estudo da distribuição e da colocação dos produtos.

Para a realização das tarefas apontadas pelo Ministro da Indústria é indispensável a vossa participação, porque esta revolução é uma revolução de nós todos.

Não há hoje, não deve haver uma divisão entre governantes e governados, esta revolução é a nossa revolução.

Nós estamos aqui mas estamos prontos a ir para aí, para o vosso lugar, e vós virdes para aqui. Isto é uma revolução de nós todos.

Devemos afastar também das nossas mentalidades os vícios da sociedade de consumo, criando ideias correctas sobre o que são e não são as verdadeiras necessidades humanas, deformadas ao longo do tempo por uma máquina de propaganda posta ao serviço dos interesses do capital. É um dever de honra das classes trabalhadoras e dos homens progressistas, dos nossos aliados das pequenas empresas e mesmo das médias empresas, a construção de uma nova ideia do que é o papel do homem na sociedade; nós temos, que ter atenção a todos esses falsos valores da sociedade de consumo com que nos bombardearam constantemente, ao serviço daqueles que dominavam o trabalho e que exploravam o trabalho. Nós temos de forjar, temos de criar uma nova moral revolucionária, uma dignidade própria dos trabalhadores, uma dignidade que deve traduzir a consciência do papel que vós desempenhais hoje na construção da nova sociedade; essa consciência deve ser uma consciência humilde, porque todos aqueles que valem e têm consciência daquilo que estão a fazer, devem ser humildes, humildes para com os seus camaradas, humildes para consigo mesmo, humildes para com a nossa Pátria, a nossa Pátria que somos todos nós.

A humildade revolucionária é um dever de honra e um sinal da vossa dignidade. É essa humildade que nos deve conduzir a todos nós aos sacrifícios que são necessários para construirmos um Portugal novo.

Já tem sido várias vezes afirmado que nós seremos a geração dos sacrifícios; seremos isso e com muita honra. Vós estais trabalhando para os vossos filhos. Alguns de vós, provavelmente, já não verão em toda a plenitude a sociedade que estais criando, mas serão os vossos filhos, os vossos netos, e os mais novos de vós que a verão; essa sociedade será criada com o vosso esforço e com o vosso trabalho.

Não há nenhuma revolução digna desse nome que não exija o sacrifício de gerações. Devemos estar preparados para esse sacrifício, e isso também é uma matéria de discussão quotidiana, quer ao nível dos locais de trabalho, quer ao nível familiar, em casa com as nossas mulheres, com os nossos filhos. É preciso ter paciência para fazer compreender aos outros que alguém tem de se sacrificar pelo futuro de Portugal. E, esse alguém, somos todos nós.

Isto não anda só com o sacrifício de meia dúzia, isto tem que andar com o sacrifício de todos. Mas é um sacrifício que deve ser alegremente consentido, porque sabemos que nos sacrificamos para o futuro da nossa Pátria, para o futuro dos nossos filhos. Nós próprios ainda beneficiaremos desse sacrifício, já estamos a beneficiar dele. Estas liberdades que nós temos, a liberdade que hoje gozais, essa liberdade também é um produto do vosso sacrifício, porque nós sabemos que esta revolução tem produzido tensões agudas no seio familiar, nas discussões entre amigos. As pessoas hoje são mais graves, nós hoje não podemos ir dormir sem pensar antes o que é que vamos fazer amanhã pela nossa Pátria, pelos nossos camaradas compatriotas, pelos nossos companheiros compatriotas. É um dever que todos nós temos, temos de nos consciencializar disso e para dias mais difíceis que virão, porque à maneira que nós formos dando passos num sentido inequívoco, irreversível, por um lado consolidamos a revolução, mas por outro lado temos de nos defender dos nossos inimigos. Temos de empenhar muito trabalho na consolidação da revolução, porque é o trabalho que é verdadeiramente criador seja de que ordem for o trabalho. É o trabalho que faz tudo na terra. Há alguma coisa que tenha sido feita na terra sem trabalho? É o trabalho que caracteriza o homem e diferencia o homem dos animais. É o trabalho, actividade que é vital para o homem, que nos caracteriza como pessoas. Pois bem, esse trabalho na situação revolucionária, é um trabalho que, se por um lado é mais alegre, e nos reconforta moralmente, é também mais penoso. Vós tendes também um grande papel a desenvolver no campo do trabalho, no desenvolvimento da produtividade.

Eu agora vou-me desviar um bocadinho do que tenho estado a dizer mas quero dizer-vos que vós deveis, sobretudo com a vossa inteligência, com o vosso raciocínio, porque vós sois tão inteligentes como os outros — como os senhores doutores e como aqueles que só eles dantes tiravam cursos — vós deveis ter confiança, ter humildade mas terdes confiança nos vossos recursos próprios. Vós tendes uma cabeça capaz de revolucionar uma Pátria; tendes uma cabeça à altura das outras cabeças e é sobretudo por um esforço cerebral, por um esforço de consciencialização sobre as actividades laborais, que vós podereis melhorar as condições de trabalho, a produtividade, a quantidade de trabalho.

Tende confiança em vós, tende confiança nas vossas possibilidades. Vós hoje tendes uma liberdade que vos permite expandir, atirar cá para fora todo o mundo que andava ai ressequido, todo o mundo que andava oprimido e que só vos deixava falar em futebol. Não tenhais medo de errar quando fazeis uma experiência, quando pensais uma nova ideia, não tenhais medo de errar. O que não podemos é cometer erros irreparáveis, nem a nossa economia pode estar sujeita a brincadeiras, a trambolhões.

Mas não tenhais medo de expandir as vossas ideias em relação aos vossos camaradas e aos vossos amigos, não tenhais medo mesmo que algum deles às vezes tenha até um sorriso com um ar superior e pense assim: «mas este palerma porque é que está aqui a dizer isto?» Não tenhais medo disso. Porque o caminho é o que vós apontais, é o caminho da expansão, é o caminho da comunicação e a pouco e pouco, esses outros que se julgaram superiores verão onde está a sua própria mediocridade, e descerão do pedestal em que se encontram e virão até vós. Não tenhais medo, não sejais acanhados.

Refiro-me sobretudo às mulheres. As mulheres são muito tímidas, têm medo de dar as suas ideias. Mas as mulheres têm uma força enorme dentro delas. Não vos julgueis inferiores aos homens, exprimi também as vossas ideias, discuti com os homens. As mulheres não devem pensar: — «isto aqui é trabalho de mulher, isto aqui é trabalho de homem». — Não devem pensar assim. Mas também não devem cair no polo oposto.

As mulheres, os filhos, as próprias crianças, também têm espírito criador, não corteis o espírito criador às crianças.

É certo que — «desde pequenino é que se torce o pepino» —, e a gente tem que orientar os nossos filhos e temos esse dever, que é um dever de honra.

Os pais não podem abdicar da educação em que devem formar os seus filhos. Mas não os devem amordaçar, não lhes devem estar permanentemente a dizer:

— «Cala-te menino, que não percebes disto.»

Porque as crianças também têm uma cabecinha que vai laborando.

A todos os níveis há ideias criadoras e é preciso que tenhamos consciência disso. Já viram afinal o que são estes milhares de pessoas com ideias criadoras a multiplicar e multiplicar as ideias de meia dúzia de sábios que estão em certos pedestais e que estão a deitar cá para fora palavras como pérolas? Já viram o que são as vossas ideias criadoras, já viram em que medida isto tudo depende de vós? Já viram a lição que tendes estado a dar-nos? Como nós vamos daqui mais enriquecidos com aquilo que ouvimos, por os estarmos a ver aí à nossa frente!

Isto é que faz a força da revolução!

Não tenhais portanto acanhamento nem timidez nas vossas relações. Não tenhais medo de fazer figura às vezes de mais estúpidos do que outros, não tenhais medo disso. Todas as colaborações são necessárias e são úteis, porque acima de tudo vós sois portugueses, sois homens e isso é muito superior à inteligência ou à parvoíce ou estupidez. A dignidade de ser homem e de ter a consciência de ser português e de ter a consciência de que temos o dever de trabalhar para a nossa Pátria é que contam. E então, temos o dever de falar uns com os outros, não ter medo uns dos outros, ser francos, de não falarmos atrás, de sermos corajosos e virmos ao encontro dos problemas. Quando temos uma coisa difícil a fazer devemos começar por ela, não devemos começar a adiar, «isto fica para amanhã, isto fica para depois de amanhã»; se assim fizermos estaremos a criar mais complexos, vamos criando mais receios, vamos tendo mais acanhamento de pôr as coisas com franqueza. Devemos encher o peito de ar e avançar para a cabeça do touro.

Gostaria de chamar a vossa atenção para o facto de não estar a fazer nenhum discurso; aproveito a oportunidade para trocar ideias convosco.

Agora queria focar mais um ponto que eu acho que é muito importante.

É preciso que as massas trabalhadoras compreendam sem margem para dúvidas quem são os seus aliados na batalha da produção e na superação das dificuldades. Isso é muito preciso e hoje põe-se esse problema. E não tenhamos dúvidas — só há duas alternativas: ou se está com a revolução ou se está com a reacção. Não há terceiras vias, nem há lugar para neutros. Não pode haver neutros.

Eu queria agora falar dos quadros. Eu penso que os trabalhadores tal como os quadros, devem estar conscientes da sua aliança natural no processo revolucionário.

É claro que os quadros, a certos níveis, se a gente raciocinar profundamente, os quadros também eram e também ainda são assalariados do capital, e nesse aspecto estão ao nível dos outros trabalhadores assalariados. Mas eles, quer pela sua origem social, quer pelos seus hábitos de vida, quer pelos vencimentos que auferem, quer até porque ficam com uma parte, ou ficariam com uma parte da mais-valia criada pelos trabalhadores, têm tendência natural para não estar directamente ligados aos trabalhadores. Mas, por outro lado, esta situação revolucionária, o que temos vivido depois do 25 de Abril, o próprio processo histórico e revolucionário devem levar os quadros à compreensão que o seu lugar é junto dos trabalhadores, e levar os trabalhadores à compreensão de que necessitam dos quadros. Deve haver uma identidade muito firme entre os quadros e os trabalhadores propriamente ditos, e eu verifiquei que isso aqui na Sorefame é uma realidade — o carinho, a amizade, e as palmas que vós destes ao vosso presidente do conselho de administração provam-no. Isso é típico do trabalho revolucionário. Não há dúvida que estamos todos metidos no mesmo barco. Uns trabalham de uma maneira, outros trabalham de outra maneira. Mas não podemos separar os quadros dos trabalhadores. Nós necessitamos dos quadros, e os quadros necessitam dos trabalhadores. Necessitamos dessa profunda unidade entre os quadros e os trabalhadores, e precisamos que os trabalhadores também compreendam isso, e precisamos que haja até uma certa, eu volto talvez a dizer uma palavra que seja um exagero mas, vós trabalhadores deveis olhar para os quadros, para aqueles que parecem que não estão convosco, com compreensão, porque eles no fundo também eram vítimas do fascismo. Eles julgavam que eram livres, ou mais livres que os trabalhadores, mas não eram, porque, uma pessoa é livre na medida em que conhece mais, em que é mais instruída, em que conhece melhor os processos, não é na medida em que tem mais automóveis, ou mais sofás, ou mais frigoríficos.

Mas, nós devemos pensar hoje que necessitamos dos quadros, e os quadros necessitam dos trabalhadores. Deve haver uma unidade. Então, se há questões não deve haver rejeição, mas vamos outra vez para a crítica, vamos outra vez discutir, vamos lá ver porque é que há este procedimento ou aquele, porque nós precisamos dos quadros. É claro que precisamos que os quadros tenham consciência política, e sabemos muito bem que os quadros não são tudo e estão muito longe de ser tudo. Mas nós também precisamos dos quadros, e precisamos que os quadros tenham consciência política. Mas se às vezes os quadros têm menos consciência política, lá estão os trabalhadores ao lado deles para os levar e os encarreirar no processo e lhes dar a consciência política que lhes falta e contribuir para a sua consciencialização política. E devemos também pensar que há quadros que têm consciência política, há muita gente que tem consciência política.

E aqui mais uma vez eu quereria salientar a diferença que há entre as pessoas que têm mau feitio, ou que têm tendências autoritárias, ou que às vezes, até porque são tímidos, e são complexados, não têm relações abertas com os homens que trabalham mais directamente na produção, no trabalho manual. E em relação a esses vós tendes um grande papel a desempenhar, que é descomplexar essa gente, e trazê-los até ao vosso seio, e não os rejeitardes, porque nós precisamos dos quadros, nós precisamos também de tipos que saibam matemática, física e química e outras coisas.

É claro que nós vamos encaminhar a sociedade para que vós e os vossos filhos estudeis tudo isso. Mas nós precisamos neste momento dos quadros, e desde que os quadros estejam prontos a colaborar connosco e a caminhar connosco metidos no mesmo barco, nós não os devemos rejeitar, devemos antes abraçá-los, porque precisamos deles. Nem todos têm o mesmo nível de consciência política, mas não vamos agora também dizer que os quadros, porque parte deles estavam comprometidos com o fascismo, que não têm consciência política, e vós sabeis bem que sim, que têm. Há muita gente que pertencia aos quadros e que é consciente politicamente. Eu portanto exorto-vos a não os rejeitardes, mas a procurardes a união, a ligação, a chamá-los se vedes que eles se estão a afastar, a chamá-los a trazê-los ao vosso seio, a metê-los no mesmo caminho que é o bom caminho, que é o caminho da nossa Pátria. E eles também, grande parte deles são susceptíveis de entrar nesse caminho.

Mas vamos depreender do que eu aqui estou a dizer que os quadros são uma coisa, e os trabalhadores são outra? Não, eu não quero dizer isso.

Eu estou a dar ênfase a este problema, propositadamente, porque nós nesta batalha da produção precisamos dos quadros, mas precisamos de quadros que sejam tão humildes como os trabalhadores, e se não são num determinado momento, é o nosso procedimento, é a nossa actuação quotidiana que lhes deve mostrar que estão errados. Mas não os devemos rejeitar. E não se convençam que eu penso que para um lado estão os quadros e para outro lado estão os trabalhadores. Eu estou a dar ênfase a isto porque me parece um problema muito importante. Até há quadros que se julgam rejeitados quando não o são. Isto porque é? Porque tudo tem um aspecto dominante e um aspecto secundário, e nesta revolução aqueles que se têm distinguido pelo seu élan, pelo seu trabalho, pelo seu amor aos outros e à Pátria e ao futuro, os que têm naturalmente tomado posições de destaque são os trabalhadores; mas, tenhamos bem presente que precisamos dos quadros e que os quadros no fundo também eram explorados como eram os trabalhadores sob o fascismo. É claro que tinham umas condições melhores de vida evidentemente mas, quem mandava, quem riscava, e em particular nas condições do nosso capital monopolista de Estado, era o dono, era o patrão, eram esses grandes homens dos monopólios que se comportavam como autênticos senhores feudais. Mas atenção, não me refiro aos pequenos patrões; nós também precisamos de aliados nesta revolução; precisamos de pequenos empresários, médios empresários, que compreendam esta revolução, que caminhem ao nosso lado; nós precisamos também de alianças porque isto é uma tarefa muito grande. Mas, repito, a revolução só comporta duas situações: ou se está com ela ou contra ela. Não há tipos que possam dizer «eu sou neutral, não me interessa nada a política». Não, hoje não se pode dizer isso; só há duas posições, ou estamos na revolução ou estamos contra a revolução. Os quadros portanto também têm que fazer a sua opção se não a fizeram já. Os quadros, ou estão com a revolução ou estão com a reacção. Não há meio caminho nesta tarefa em que nos metemos e que põe a nossa própria vida, o nosso futuro, em jogo. Não há meios caminhos nem meias tintas, há só um caminho, ou a rejeição desse caminho.

E nós estamos apostados todos em seguir nesse caminho, em seguir para a frente, para os destinos gloriosos, para os destinos radiosos de uma Pátria que seja de todos os portugueses.

Viva Portugal!

Início da página
Abriu o arquivo 05/05/2014