Sobre as Correntes Filosóficas dentro do Movimento Feminista

Anuradha Gandhi


6. Pós-modernismo e Feminismo


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A crítica dirigida às feministas por mulheres não brancas levou um setor de feministas a se aproximar do multiculturalismo e do pós-modernismo. Bebendo da escritora existencialista Simone de Beauvoir, acreditam que a mulher é o "outro" (oposto à cultura dominante prevalecente, exemplo, dalits, advadis, mulheres, etc.). Feministas pós-modernas glorificam a posição de "outro" porque supostamente permite ter percepções da cultura dominante da qual ela não faz parte. Mulheres, assim, podem se tornar críticas das normas, valores e práticas impostas a todas as pessoas pela cultura dominante. Acreditam que os estudos deveriam ser orientados pelos valores daqueles que estão sendo estudados, os subalternos, que têm sido submetidos à dominação. O pós-modernismo tem gozado de muita popularidade entre as acadêmicas. Elas defendem que não existe nenhuma categoria fixa, nesse caso, mulher. O "eu" é fragmentado por várias identidades – sexo, classe, casta, comunidade étnica, raça. Essas várias identidades possuem um valor em si mesmas. Assim, isso se torna uma forma de relativismo cultural. Portanto, por exemplo, na realidade nenhuma categoria de "mulher" apenas existe. Mulher pode ser uma das identidades do eu, assim como existem outras. Haverá uma mulher dalit, uma mulher dalit prostituta, uma mulher de classe alta, e coisas deste tipo.

Uma vez que cada identidade tem um valor em si mesma, nenhum significado é atribuído aos valores a partir dos quais todos podem se esforçar. Sob esse olhar, não há espaço para achar um terreno comum para a atividade política coletiva. O conceito de mulher ajudou a reunir as mulheres e permitiu- as agir coletivamente. Mas este tipo de política de identidade mais divide do que unifica. A unidade está na base mais estreita de todas. As pós-modernas celebram a diferença e a identidade e criticam o marxismo por focar em uma "totalidade" — a classe.

Além disto, o pós-modernismo não acredita que a linguagem (ocidentais, pelo menos) reflete a realidade. Acreditam que as identidades são "construídas" através do "discurso". Assim, em seu entendimento, a linguagem constrói a realidade. Desta forma, muitas têm focado na "desconstrução" da linguagem. Na prática, o efeito dessa concepção é deixar uma pessoa sem nada – não há nenhuma realidade material sobre a qual podemos ter certeza. Essa é uma forma de subjetivismo extremo. As feministas pós-modernas focam na psicologia e na linguagem. O pós-modernismo, em concordância com o famoso filósofo francês Michel Foucault, é contra o que elas chamam de "relações de poder". Mas esse conceito de poder é difuso e não é claramente definido. Quem empunha o poder? Segundo Foucault, o poder está apenas nas instâncias locais, então a resistência ao mesmo também só pode ser local. Não é esta a base de funcionamento das ONGs que unem as pessoas contra algum poder local corrupto e faz ajustes e acordos com os poderes acima, os governos central e estadual. Na prática, o pós-modernismo é extremamente dividido porque promove a fragmentação entre o povo e dá uma importância relativa às identidades sem qualquer base teórica para entender as razões históricas de formação das identidades ou as conexões entre as várias identidades. Então, nós podemos ter uma reunião de ONGs como é o FSM onde todos celebram sua identidade – mulheres, prostitutas, gays, lésbicas, tribais, dalits, etc., mas não há nenhuma teoria trazendo-lhes para um entendimento global, uma estratégia comum. Cada grupo resistirá aos seus próprios opressores, conforme os perceba. Com essa lógica argumentativa, não pode haver nenhuma organização, na melhor das hipóteses podem haver organizações espontâneas a nível local e coalizões temporárias. Defender organização, segundo o entendimento delas, significa reproduzir o poder – hierarquia, opressão. Essencialmente, deixam o indivíduo para resistir por si mesmo, e são contra a resistência organizada de forma consistente e a resistência armada.

Carole Stabile, feminista marxista, coloca o problema de forma correta quando diz: "A tendência anti-organizacional é parte e parcela do pacote pós-moderno. Para organizar qualquer coisa que não seja a mais provisória e espontânea coalizão é, para os teóricos pós-modernos e feministas com visão parecida, reproduzir a opressão, as hierarquias e as formas da dominação intratável. O fato de que o capitalismo é extremamente organizado faz pouca diferença, porque cada um resiste contra uma forma multivalente e difusa de poder. Nem, como Joreen apontou mais de duas décadas atrás, parece importar que a falta de estrutura produza suas próprias formas de tirania. Assim, no lugar da política organizada, a teoria social pós-moderna nos oferta variações de pluralismo, individualismo, agência individualizada e soluções individualizadas que, em última instância, nunca foram – e nunca serão – capazes de resolver os problemas estruturais" (1997). Não surpreende que, para as pós-modernas, capitalismo, imperialismo, etc., não significam nada mais do que uma forma (específica) de poder. Ainda que o pós-modernismo não seja encontrado em sua forma desenvolvida em uma sociedade semicolonial como a Índia, muitas feministas burguesas têm recebido forte influência deste. Suas críticas veementes das organizações revolucionárias e revisionistas em termos de burocracia e hierarquia também reflete a influência do pós-modernismo nos últimos tempos.


Inclusão 30/09/2019